A permanência dos altos índices de desemprego tem relação direta com a crise econômica. De um lado, são gerados pelo desaquecimento e, de outro, acentuam as dificuldades de retomada do crescimento. O resultado, aponta André Salata, sociólogo e professor da Escola de Humanidades da PUCRS, é o aprofundamento da desigualdade social.
Ele explica que essa curva é indissociável da renda do trabalho. E a taxa de desocupação em patamares elevados afeta em cheio as camadas mais pobres da população. No 7º boletim da desigualdade, assinado por Salata, é empregado metodologia do Banco Mundial, que estabelece parâmetros para ampliação da extrema pobreza (pessoas que sobrevivem com menos de US$ 1,90 diários, ou o equivalente a R$ 9,67), nas 26 regiões metropolitanas que concentram 40% da população brasileira (80 milhões de pessoas).
Entre as constatações do levantamento, em 2020, no conjunto das metrópoles, 4,2% das pessoas estavam abaixo da linha de miséria. Sem medidas como o auxílio emergencial, concedido pelo Governo Federal, já em agosto de 2020, a taxa chegaria a 10,3% desse universo de pessoas, diz o sociólogo.
Passado o pico das restrições de mobilidade com a pandemia, no entanto, o estudo também indica que, no 4º trimestre de 2021, 23,6% dos moradores dessas metrópoles viviam em domicílios cuja renda média per capita do trabalho era de até um quarto (R$ 303) do salário-mínimo (R$ 1.212). No auge da pandemia o percentual chegou a 29,7%. Significa que, hoje, nada menos do que 19,7 milhões de pessoas residem em casas com essas características.
Remuneração em queda é incompatível com a retomada da economia
O economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Cássio Calvete discorda que o panorama atual passe pela formação da mão de obra. Segundo ele, se por um lado carece-se de profissionais treinados, por outro, faltam postos qualificados.
Calvete atribui parte da resistência das taxas elevadas de desemprego e baixos rendimentos médios à reforma trabalhista de 2017. De acordo com o economista, ao instituir cinco novos vínculos de trabalho (teletrabalho, contrato intermitente, autônomo exclusivo, terceirização e tempo parcial), a legislação sinalizou “a trilha para a precarização” e pressionou para baixo a remuneração.
Na prática, a promessa não efetivada de criar 2 milhões de novas vagas com a reforma, afirma o professor, em nada se relaciona com os efeitos da pandemia. Pelo contrário, ele identifica uma contraposição de dois fatores de ordens macro e microeconômicas.
No micro, destaca Calvete, a redução de custos de mão obra associado à legislação deveria proporcionar ambiente para criação de empregos. Porém, no macro, a diminuição do poder de compra age como um novo freio para os postos de trabalho.
— Ou seja, foram instituídos dois vetores, o primeiro gera emprego e o segundo desemprego. O predomínio de um sobre o outro dependeria de uma série de fatores, como expectativas e produtividade da economia. A julgar pelos dados não prevaleceu aquele que geraria empregos e, de quebra, contrariando a lógica, ainda temos uma inflação que não para de subir. Em outras palavras, há um fator real dessa precarização que é a diminuição da remuneração dos trabalhadores. E isso nunca ajudará qualquer processo de retomada da economia — pontua.