Na esteira de mais uma troca de comando na Petrobras, surgiram novas incertezas e temores do mercado quanto à possibilidade de intervenção do governo federal na política de preços da empresa. O resultado: as ações da petrolífera brasileira chegaram a despencar na casa de 5%, ao longo do dia, e pressionaram o desempenho da bolsa de valores, a B3, na terça-feira (24).
No final do dia, os papéis preferenciais (PETR4, sem direito a voto) caíram 2,92% e os ordinários (PETR3, com direito a voto), 2,85%. Não é de hoje que o presidente Jair Bolsonaro defende que a companhia contrarie o próprio estatuto e utilize seus lucros (R$ 106 bilhões em 2021) para amenizar o ritmo das altas dos combustíveis, cada vez mais frequentes, no mercado interno.
Foi essa ameaça que fez com que, ao longo do dia, uma série de especulações fosse aventada. Uma delas seria a possibilidade de congelamento de preços até as eleições ou por pelo menos 90 dias.
Em Davos, na Suíça, onde participa do Fórum Econômico Mundial, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tentou amenizar os motivos da alteração na presidência da estatal, mas colocou mais pólvora na fogueira.
— O presidente Jair Bolsonaro escolhe o ministro Adolfo Sachsida (para o Ministério de Minas e Energia) e o ministro escolhe o presidente da Petrobras (Caio Mário Paes de Andrade). O Conselho da petroleira ratifica o nome do ministro escolhido e a diretoria da estatal. E eles definem a política de preço dos combustíveis — disse Guedes em conversa com jornalistas.
Em entrevista no Brasil, o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, também colocou na conta do xadrez político no Ministério de Minas e Energia (MME) a alteração do comando na Petrobras, mas defendeu que o novo presidente “precisa de autonomia para trocar as diretorias da empresa”. Foi o que bastou para que os analistas de mercado identificassem uma tentativa de busca por nomes alinhados à ideia, já defendida por Paulo Guedes, de “dilatar” a incidência de aumentos nos combustíveis.
Nesse caso, o temor do mercado é que o objetivo do novo Conselho de Administração seja modificar pontos específicos do estatuto da empresa, que vinculam diretamente as alterações na política de preços às compensações de impactos financeiros nos lucros, por parte da União. Deste modo, interferências de maior ou menor escala estariam autorizadas.
O que especialistas dizem sobre possível interferência
Economista da Warren, Fred Nobre explica que José Mauro Coelho (presidente demitido na segunda-feira) foi eleito pelo sistema de voto múltiplo em assembleia geral ordinária, realizada em 13 de abril. Pouco mais de um mês depois, com sua destituição aprovada em nova assembleia, os demais membros do Conselho eleito no mesmo processo também deixarão a empresa, abrindo o caminho para a gestão de Caio Paes de Andrade.
Ao todo, são 11 conselheiros. Mesmo tendo perdido uma cadeira na assembleia de abril, o governo mantém a maioria, com seis posições no colegiado.
— É muito cedo para falar em intervenção, mas já há um movimento especulativo nos preços das ações, com driver (direção) negativa. Vai depender dos novos conselheiros que ainda serão eleitos — sustenta Nobre.
De acordo com o sócio-diretor da Fundamenta Investimentos, Valter Bianchi Filho, ainda que motivada por ajustes políticos na pasta de Minas e Energia, notícia não é boa porque esse tipo de troca constante de comando pesa sobre a estatal. Segundo ele, qualquer mudança de política de preços que reduza os resultados da empresa será recebida como fato negativo, mas, por outro, é de conhecimento dos acionistas que a estatal está sujeita a interferências políticas:
— Dá sempre a sensação de que o governo está tentando interferir. É uma leitura que se faz, mas não podemos disfarçar que a principal motivação da troca é política. Se de fato a interferência for essa (congelamento com prazo definido), o que no meu entendimento seria uma medida equivocada, ainda assim seria menos danosa com relação ao que foi feito em 2014, quando quase quebrou a empresa.
Bianchi explica que, desde 2015, (durante o governo de Michel Temer), a gestão na petrolífera brasileira tem sido “impecável”, e o que se paga, hoje, em dividendos supera o que era devolvido em imposto de renda nos períodos anteriores, por exemplo. O motivo, argumenta ele, é a implantação da lei de governança das estatais, que impede a diretoria desse tipo de empresas de contrariar o que prega o estatuto:
— É precoce falar em interferência, pois há todo um arcabouço de governança dentro da Petrobras, que foi bastante fortalecido. É muito melhor uma Petrobras sanada e com política de preços regrada do que uma empresa que atua com políticas e preços artificiais, porque aí sim perdemos as receitas que ela gera.