Em nova pesquisa encomendada pela Assembleia Legislativa sobre a situação do Rio Grande do Sul após o auge da pandemia, sete em cada 10 entrevistados apontaram perdas na renda familiar. Divulgados em detalhes nesta quarta-feira (22), em Porto Alegre, os resultados mostram que o estrago foi maior entre os mais pobres: 77,1% dos lares com ganhos de até dois salários mínimos tiveram queda nos rendimentos. Entre trabalhadores informais e autônomos, esse percentual chegou a 83%.
Com foco no avanço da desigualdade social no Estado, o estudo é o terceiro promovido pelo parlamento gaúcho em parceria com o Instituto Pesquisas de Opinião (IPO). A intenção é buscar um diagnóstico da situação e, com base nisso, propor alternativas. Foram ouvidas 1,5 mil pessoas, em todas as regiões, entre o fim de agosto e o início de setembro.
A piora no quadro já era esperada, mas os números surpreenderam pela gravidade. Conforme a enquete, 45% das famílias passaram a sobreviver com 50% ou menos da renda que tinham antes do coronavírus. A maioria não usufrui de benefícios sociais, como auxílio emergencial ou Bolsa Família.
No período que antecedeu a disseminação do vírus, 53,5% dos ouvidos se consideravam pobres, de classe baixa ou média baixa. Hoje, 70,6% se definem dessa forma. O retrocesso deve-se aos efeitos da crise sanitária e também à queda no poder de compra, com a aceleração da inflação.
Apesar de tudo, o sentimento predominante é de esperança. Para 53,8%, a situação econômica do Estado vai melhorar nos próximos 12 meses e, para 59%, o mesmo se dará em relação aos rendimentos familiares. O otimismo é alicerçado, segundo a cientista social e política Elis Radmann, diretora do IPO, no avanço da imunização.
— O que percebemos, na maioria das entrevistas, é que as pessoas veem a vacinação como vitoriosa, como a luz no fim do túnel, e querem, também, “vacinas” para a retomada econômica e para a redução das desigualdades. O brasileiro não desiste nunca, e o mesmo vale para os gaúchos. As pessoas precisam acreditar em dias melhores. Só o que elas querem é poder arregaçar as mangas e trabalhar e uma das grandes preocupações é ter acesso a qualificação profissional — resume Elis, lembrando que isso passa por inclusão digital.
Questionados sobre o papel da Assembleia na nova etapa, 88,3% dos consultados disseram esperar que os deputados estaduais apresentem propostas que ajudem a superar as dificuldades. O tema a ser priorizado, na avaliação de 15,8% deles, é educação e capacitação para o mercado de trabalho. Na avaliação do presidente do Legislativo, Gabriel Souza, esse é o grande desafio a partir de agora.
— A gente já imaginava que a desigualdade havia aumentado, mas uma queda de renda tão grande, atingindo quase 50% dos gaúchos, em especial os mais pobres, é ainda mais preocupante. O primeiro passo é entender o que está acontecendo e, a partir daí, com base nesse diagnóstico, buscar soluções embasadas nas evidências — diz Souza.
O parlamentar apresentou duas propostas iniciais para discussão e convidou o governo estadual a participar dos debates. Uma das sugestões envolve o pagamento, por parte do Estado, de bolsas de estudo para alunos de baixa renda em universidades comunitárias. Isso está previsto na Constituição estadual, mas ainda carece de regulamentação.
A outra sugestão feita por Souza é incluir ações relacionadas à primeira infância (como a abertura de vagas em creches e pré-escolas) no projeto do Palácio Piratini que pretende vincular o ICMS das prefeituras à educação. O texto ainda não foi apresentado, mas a ideia básica é adotar o desempenho na área como critério para a distribuição de recursos. Para o presidente da Assembleia, apostar em melhorias na fase inicial da vida pode fazer toda a diferença no futuro.
Cinco pontos que chamaram a atenção
1) Percepção da situação social
- Antes da pandemia, 53,5% se consideravam pobres, de classe baixa ou classe média baixa. Durante a pandemia, 70,6% se definem dessa forma
2) Aspecto mais importante para uma vida melhor
- Para 42,6% dos entrevistados, melhorar de vida depende de melhorar financeiramente e, para 31,9%, é necessário ter acesso a atendimento de saúde
3) Voluntariado e participação
- A pandemia ampliou em 65% a participação dos gaúchos em ações voluntárias ou em entidades representativas
4) Apoio na alimentação
- 26,8% dos gaúchos precisaram de ajuda para comprar alimentos, sendo que esse percentual foi mais alto na região de Passo Fundo (33,6%)
5) Auxílio governamental
- 79,1% não recebem nenhum tipo de auxílio de programa social
- 20,9% recebem algum suporte, como auxílio emergencial, Bolsa Família ou seguro desemprego