A decisão do presidente Jair Bolsonaro de aumentar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nos meses de novembro e dezembro para bancar a ampliação do novo Bolsa Família estressou o mercado financeiro na sexta-feira (17), derrubando o Ibovespa, da B3, e elevando o dólar. A medida também foi criticada por especialistas, entidades e empresários.
O decreto com as novas alíquotas do IOF que serão aplicadas de 20 de setembro a 31 de dezembro de 2021 foi publicado na sexta-feira. Para pessoas físicas, passa de 3% ao ano para 4,08%. Para empresas, de 1,5% ao ano para 2,04%.
O secretário especial do Tesouro e Orçamento do Ministério da Economia, Bruno Funchal, afirmou que o governo prevê elevar o benefício médio do Bolsa Família, batizado agora de Auxílio Brasil, dos atuais R$ 189 para cerca de R$ 300 em novembro e dezembro deste ano. Segundo a pasta, os gastos com o novo programa — cujo fôlego é considerado essencial às chances eleitorais de Bolsonaro, o que reforça a atenção do mercado sobre a situação fiscal — acarretarão, neste ano, acréscimo de R$ 1,62 bilhão na despesa obrigatória de caráter continuado.
— Isso está sendo contabilizado com outras medidas do governo com o objetivo único de aumentar o Bolsa Família em um ano eleitoral, como a PEC dos precatórios e a reforma do Imposto de Renda — diz Carlos Kawall, diretor da ASA Investments e ex-secretário do Tesouro Nacional.
Em reação ao anúncio de quinta-feira (16) à noite, o Ibovespa recuou 2,07% na sexta-feira, para 111.439 pontos, no menor nível de fechamento desde 9 de março passado, em meio a um cenário de incertezas fiscais e políticas. A desaceleração na demanda da China por aço, impactando nas ações de siderúrgicas e Vale, também pressionou a bolsa para baixo. Além disso, houve efeito sobre o dólar, cuja cotação subiu 0,33%, para R$ 5,282 em um dia que chegou a avançar até R$ 5,3474.
— A causa (financiamento ao Auxílio Brasil) é nobre, necessária e bem-vinda, mas devia estar sendo financiada com redução de gastos, e não com aumento de tributação — enfatiza Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento. — Este aumento de IOF tem dois efeitos: maior custo de crédito, para a pessoa jurídica e a pessoa física, e inflação, mesmo que seja um efeito pequeno — acrescenta.
A decisão de aumentar a alíquota do IOF é mais uma opção pela saída fácil de colocar o contribuinte para pagar custos adicionais, avalia a pesquisadora de finanças públicas do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) Juliana Damasceno.
— A arrecadação por IOF é rápida e em larga escala, mas gera aumento de custos para a economia inteira. Aumentar imposto neste momento, com carga tributária já elevada e inflação no acelerador, não faz sentido. Isso vai na contramão do que a economia precisa para se recuperar. A perspectiva de consumo para os próximos meses fica bastante desfavorável — critica Juliana.
Para ela, revisar gastos ineficientes, como benefícios fiscais, seria solução mais adequada para o Auxílio Brasil caber no orçamento.
Ao jornal Valor Econômico, a empresária Luiza Trajano afirmou ser favorável a projetos de renda mínima, porém ponderou que "o país não aguenta mais imposto". À mesma publicação, o diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), Bernard Appy, avaliou que a medida irá elevar o custo do crédito em um momento que se verifica desaceleração do crescimento econômico.
Em nota, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) ressaltou que a medida do governo, mesmo que temporária, "agrava o custo dos empréstimos, particularmente em um momento em que o Banco Central precisará subir ainda mais a taxa básica de juros para conter a alta da inflação".
Segundo a entidade, o resultado é o desestímulo aos investimentos e mais custos para empresas e famílias que precisam de crédito. "Esse aumento do IOF é um fator que dificulta o processo de recuperação da economia", destaca a Febraban.
Presidente do Banco Central (BC) entre 2016 e 2019, Ilan Goldfajn disse, em entrevista à Globonews, que a "solução (aumento do IOF) é ruim, é ineficiente, vai dificultar o crescimento, dificultar a agenda do BC, que é de mais eficiência".