A pandemia encolheu a quantidade de vagas de trabalho no Rio Grande do Sul. Não à toa, o nível de gaúchos ocupados, em postos com ou sem carteira assinada, no terceiro trimestre de 2020, caiu para o menor percentual de uma série histórica iniciada em 2012.
A informação aparece no Boletim de Trabalho do RS, divulgado nesta quarta-feira (27) pelo Departamento de Economia e Estatística (DEE). Vinculado à Secretaria Estadual de Planejamento, Governança e Gestão, o DEE elaborou o estudo com base em dados oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
No terceiro trimestre de 2020, o número de gaúchos ocupados caiu para 4,97 milhões. Com isso, o nível de ocupação baixou para 51,5%, o menor da série. Na prática, o percentual mede o número de profissionais empregados em relação ao total de pessoas em idade de trabalhar (14 anos ou mais), estimado em 9,65 milhões.
No segundo trimestre do ano passado, o nível estava em 53,1%. Antes da pandemia, no terceiro trimestre de 2019, era maior, de 58,3%. À época, o Estado tinha 5,57 milhões de ocupados.
Ou seja, no intervalo de um ano, houve queda de 596 mil pessoas no grupo. O número supera, com alguma folga, a população de Caxias do Sul (517,5 mil), o segundo maior município gaúcho.
Um dos responsáveis pelo estudo, o pesquisador Raul Bastos, do DEE, afirma que, além da pandemia, a estiagem que atingiu o Estado no primeiro semestre de 2020 também causou reflexos negativos no mercado de trabalho.
— A economia gaúcha teve uma recuperação parcial no terceiro trimestre do ano passado, mas não foi suficiente para impedir a queda em alguns indicadores de emprego — frisa o pesquisador.
O boletim aponta ainda que, entre julho e setembro de 2020, os profissionais empregados ou em busca ativa de ocupação no Estado representaram 57,5% das pessoas em idade de trabalhar. Esse indicador é conhecido como taxa de participação na força de trabalho (TPFT). A marca também foi a menor da série histórica.
Em outras palavras, a TPFT pode ser entendida como a soma de ocupados e desempregados (5,54 milhões) em relação ao total de pessoas em idade de trabalhar (9,65 milhões). Uma pessoa está desocupada quando não tem trabalho e segue em busca de recolocação.
— A taxa de participação pode ser interpretada como indicador de atratividade do mercado de trabalho. Quanto mais atrativo é o mercado, mais as pessoas tendem a ficar interessadas em participar dele. A taxa no menor nível da série evidencia as dificuldades da pandemia combinada com a estiagem — pontua Oscar Frank, economista-chefe da CDL Porto Alegre.
No terceiro trimestre do ano passado, a taxa de desemprego no Estado foi de 10,3%. É a maior de toda a série histórica, representando 574 mil pessoas.
O número de desempregados poderia ter sido ainda maior sem a criação de programas de estímulo à economia. Entre eles, o auxílio emergencial, voltado para camadas como a dos informais. O benefício, lembra Bastos, protegeu a renda e permitiu que trabalhadores ficassem mais tempo em casa, sem a procura por novas oportunidades em meio ao período de escassez de vagas e riscos sanitários.
— O auxílio teve papel muito relevante. Permitiu que parte dos trabalhadores ficasse afastada — sublinha Bastos.
Alta no mercado formal em 2019
Além dos dados do IBGE, o boletim do DEE também analisou números específicos do setor formal. Esses detalhes integram a Relação Anual de Informações Sociais (Rais), disponibilizada pelo Ministério da Economia.
Em 2019, ano com os dados mais recentes à disposição, o Rio Grande do Sul registrou expansão no trabalho formal. Ao final do período, o Estado teve saldo de 57.194 postos criados com carteira assinada.
Com isso, o total de empregos formais chegou a 2,96 milhões. Foi a primeira alta depois de quatro anos consecutivos de baixa ou estagnação.
Segundo o levantamento, o avanço está atrelado, em parte, a modalidades "menos protegidas", estabelecidas ou alteradas na reforma trabalhista de 2017, em detrimento de "vínculos mais tradicionais".
Retomada depende da vacinação
Analistas frisam que a melhora no mercado de trabalho depende da retomada da economia como um todo. Neste início de 2021, a vacinação contra a covid-19 é considerada peça fundamental para a recuperação dos negócios.
— No primeiro trimestre, a situação ainda vai ser complicada, com o fim de programas para sustentação de demanda e emprego. É que o governo não tem condições de sustentar a economia por tempo indeterminado. Nos demais trimestres, devemos ter uma recuperação lenta e gradual da economia — projeta Oscar Frank, economista-chefe da CDL Porto Alegre.
Márliton dos Santos Sabino, 27 anos, resolveu utilizar o período de crise para focar em um negócio próprio. Em abril de 2020, depois de ser demitido do setor calçadista, o morador de São Leopoldo, no Vale do Sinos, decidiu direcionar sua atenção para a venda de roupas fitness. Sua marca, que comercializa produtos com lojas e consumidores finais, já existia desde janeiro de 2018, mas hoje é a grande aposta do empreendedor.
— Sempre quis ter um negócio próprio. Antes, tinha o conforto do salário fixo, e minha empresa era mais um hobby. Agora, não. O negócio virou meu ganha-pão. Vejo pelo lado positivo, estou correndo atrás da máquina — diz.
Ele relata que o plano é seguir empreendendo. Uma das metas para 2021 é aperfeiçoar a venda de produtos por e-commerce. Hoje, a maior parte dos clientes fica em Porto Alegre e Vale do Sinos.
— A experiência tem sido bem interessante. É isso que quero para minha carreira — conta Márliton.