A renda de quem segue empregado no Rio Grande do Sul sinaliza leve melhora em relação ao início da pandemia. Em julho, a soma dos salários recebidos pelos gaúchos subiu 1,6% frente ao mês anterior. Contudo, na comparação com o nível habitual de rendimento, os trabalhadores amargam queda de 14,3%. Ou seja, mesmo com a evolução gradual, os dados reforçam que o cenário continua marcado por dificuldades.
Os números integram estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Batizado como Pnad Covid-19, o levantamento dimensiona os efeitos do coronavírus nas áreas de saúde e economia.
Para estimar a soma dos salários em cada mês, o IBGE calcula o indicador de massa de rendimento médio real efetivamente recebido. Em outras palavras, é o valor que, de fato, chegou aos trabalhadores empregados com ou sem carteira assinada. Em julho, a massa efetiva alcançou R$ 10,72 bilhões no Estado. Trata-se do maior resultado desde o início da pesquisa, com estatísticas a partir de maio.
Por outro lado, o rendimento habitual dos trabalhadores foi estimado em R$ 12,5 bilhões em julho. Essa quantia representa a soma dos salários que os mesmos profissionais costumavam receber normalmente com suas atividades. Moral da história: a diferença entre os indicadores aponta que, mesmo com a evolução nos últimos meses, quase R$ 1,8 bilhão deixaram de ir para o bolso dos gaúchos em julho.
– Em relação ao início da crise, os números indicam melhora na renda das pessoas que continuaram trabalhando. Mas há um longo caminho até uma recuperação dos salários – observa a economista Izete Pengo Bagolin, professora da Escola de Negócios da PUCRS.
Conforme Luís Eduardo Puchalski, gerente substituto de pesquisa do IBGE, pelo menos dois fatores explicam a leve melhora, entre junho e julho, do rendimento efetivo dos gaúchos. O primeiro é o aumento nas horas trabalhadas por semana. O indicador subiu, em média, de 32 para 33 horas.
O segundo, diz o analista, é o recuo no número de pessoas que estavam afastadas do emprego sem receber dinheiro. Em julho, o grupo teve baixa de 40,2%, para 166 mil.
– Houve gente que voltou a trabalhar e a receber salários. Ajudou a aumentar a massa de rendimento. E as pessoas conseguiram trabalhar um pouco mais e, portanto, ganharam mais – pontua Puchalski.
A combinação dos dois fatores também ajudou a compensar o efeito negativo da queda no número de trabalhadores ocupados. Em julho, a parcela de profissionais com alguma atividade diminuiu de 5,2 milhões para 5,1 milhões.
Com isso, o número de desempregados voltou a subir, de 558 mil para 568 mil. Para o IBGE, a pessoa é considerada desocupada quando perde o emprego e segue em busca de nova oportunidade. A covid-19, porém, dificultou a procura.
Prova disso é que o número de profissionais que gostariam de trabalhar, mas não buscaram vagas por conta da pandemia ou da escassez de empregos, pulou de 419 mil para 534 mil. Em um mês, a camada teve aumento de 115 mil profissionais no Estado.
A pesquisa ainda detalha o rendimento real dos trabalhadores ocupados. Em julho, subiu 4,4% frente ao mês anterior. Isso significa que os gaúchos receberam, em média, R$ 2.180. É o maior valor desde o início do levantamento. Entretanto, está 14,25% abaixo do rendimento médio habitual dos profissionais (R$ 2.542).
– A boa notícia é que paramos de piorar, mas não quer dizer que a melhora será rápida, nem fácil – frisa Izete.
Assim como o Estado, o Brasil também teve aumento na massa de rendimento efetivo em julho. O indicador nacional alcançou R$ 166,5 bilhões, avanço de 3,9% em relação a junho. Contudo, o valor é 12,6% menor do que a soma da remuneração habitual.
Alívio em meio a incertezas
A exemplo do restante da economia, o mercado de trabalho gaúcho tem pela frente um horizonte repleto de incertezas. Especialistas mencionam que a eventual reação nos indicadores de emprego e renda dependerá da capacidade do Rio Grande do Sul de enfrentar a pandemia nos próximos meses. No momento, o que traz dose de alívio é a sinalização de que o fundo do poço da crise pode ter ficado para trás.
Na sexta-feira, a divulgação de mais um dado reforçou essa leitura. Conforme o Ministério da Economia, o Rio Grande do Sul abriu quase 1,3 mil empregos formais em julho. Foi o primeiro resultado positivo em um mês desde fevereiro. Ou seja, é o primeiro desempenho no azul desde que a covid-19 chegou ao Estado.
Por outro lado, no acumulado do ano, o cenário ainda é de destruição de postos com carteira assinada. De janeiro a julho, o Rio Grande do Sul fechou 95 mil vagas. Os números são do Caged, o cadastro de emprego formal do ministério.
Cautela
Professora da Escola de Negócios da PUCRS, Izete Pengo Bagolin avalia que o Estado pode ser beneficiado nos próximos meses pelo recuo nos casos de coronavírus em parte dos países para os quais os gaúchos exportam. Mesmo com a eventual melhora nas vendas internacionais, a economista adota cautela ao avaliar o cenário:
— Ainda é cedo para fazer previsões de médio e longo prazos, mas existem algumas sinalizações de retomada em parte dos setores. Empresas têm feito investimento em adaptações para operar enquanto não há uma vacina contra o vírus.
Professor da ESPM em Porto Alegre, Fábio Pesavento também acredita que o Rio Grande do Sul pode ter deixado o fundo do poço para trás. No entanto, ainda é “difícil” projetar a velocidade de reação dos negócios e, consequentemente, do mercado de trabalho, pondera o economista.
Pesavento ressalta que, durante a pandemia, políticas como o auxílio emergencial do governo federal serviram para mitigar impactos da crise. Na visão do professor, um dos principais desafios que o Brasil terá pela frente é dar andamento a ações na área social em meio a dificuldades nas contas públicas.
– A reação da economia em todo o país dependerá muito da dinâmica do vírus nos próximos meses. Ações como o auxílio emergencial e o Bolsa Família reverberaram de forma positiva em vários setores. A questão é que a dívida federal vem crescendo de maneira muito rápida – sublinha o economista.