A reunião do grupo conhecido como Coalizão Indústria com o presidente Jair Bolsonaro e outros membros do governo tinha uma pauta bem definida: situação da indústria, ações e doações para o combate ao coronavírus, retomada do setor produtivo — com a explicação de que a pandemia veio logo após uma longa crise que atingiu as indústrias — e retomada do crescimento, com diminuição do custo Brasil e volta da agenda de reformas. O encontro de quinta-feira (7), no entanto, acabou sendo marcado por uma discussão sobre a flexibilização da quarentena que foi levantada pelo presidente.
Segundo relatos ouvidos pela reportagem, quem entrou no assunto foi o próprio presidente, ainda durante a reunião no Planalto. Só depois disso, Marco Polo de Mello Lopes, da Açobrasil, concordou com o presidente. Foi nesse momento, dizem os industriais, que Bolsonaro perguntou se eles teriam coragem de falar que a indústria brasileira está na UTI, precisando de oxigênio, com quem estivesse de plantão no Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com participantes do encontro, o grupo afirmou apenas que precisa haver um planejamento para a reabertura, para que a indústria esteja preparada no momento.
— Não houve pedido para reabertura de comércio — disse Synésio Batista, presidente da Associação Brasileira de Brinquedos (Abrinq).
Outro industrial, que preferiu não ter o nome revelado, disse que os empresários sabem que não cabe ao presidente decidir sobre a reabertura do comércio, e sim aos governadores e prefeitos.
A coalizão tem se reunido com membros do governo com frequência, sobretudo após o início da pandemia do coronavírus. Na última reunião com o ministro da Economia, Paulo Guedes, o grupo havia sugerido que o governo utilizasse os bancos públicos para ajudar a liberar o dinheiro emergencial a pequenas e médias empresas que estão passando por dificuldades por conta da quarentena. Esta foi também uma das principais reclamações feitas durante o encontro com o presidente. Guedes e Bolsonaro reconheceram que o crédito ainda não chegou à ponta e afirmaram que estão trabalhando para que o dinheiro chegue a quem precisa de capital de giro.
Outro ponto levantado foi o risco de invasão de produtos asiáticos no mercado brasileiro, já que a indústria dos países do continente — especialmente na China, onde se deu o início da pandemia da covid-19 — voltou a funcionar com normalidade, após o surto ter diminuído.
— Achei extremamente positiva a reunião, porque o governo reconheceu que precisa resolver o processo de crédito das empresas e que a indústria vai sair prejudicada. Vamos precisar da agenda de competitividade do país e da retomada da agenda do custo Brasil e das reformas — disse José Velloso, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).
Os industriais afirmam, no entanto, que o governo não apresentou nenhum tipo de proposta concreta para que o crédito chegue às empresas.
Mesmo que a flexibilização não tenha sido uma das agendas previstas para a reunião, foi após um encontro com os membros da coalizão que a proposta para a flexibilização da quarentena imposta para conter o coronavírus no estado de São Paulo começou a ser gerida pelo governador João Doria (PSDB). À época, o grupo disse apoiar a quarentena, mas pediu ao governador ao menos uma previsão de quando as coisas começariam a ser flexibilizadas.
O grupo que forma a Coalizão Indústria é um antigo interlocutor do presidente. A primeira reunião com Bolsonaro ocorreu em outubro de 2018, uma semana antes do segundo turno das eleições. A coalizão surgiu como alternativa para que industriais tivessem comunicação direta com o governo, sem depender de entidades como a Fiesp. Atualmente, 15 entidades do setor participam da associação.