O governo Jair Bolsonaro apresentou nesta terça-feira (5) um pacote de medidas encampado pelo ministro da Economia Paulo Guedes.
O pacote traz um conjunto de proposições para dar maior flexibilidade ao orçamento, ações para elevar os repasses de recursos a Estados e municípios, revisão de cerca de 280 fundos públicos e regras para conter gastos em caso de crise orçamentária.
São três propostas de emendas à Constituição (PECs). Portanto, precisam da aprovação do Congresso para entrar em vigor. Confira o teor dos projetos e a avaliação de especialistas.
PEC do pacto federativo
1. Ordem fiscal
- Cria um conselho fiscal da República: representantes do governo federal, presidentes da República, Câmara, Senado, Supremo Tribunal Federal (STF), Tribunal de Contas da União (TCU), governadores e prefeitos avaliam a sustentabilidade financeira da federação.
- Uniformiza a interpretação de conceitos orçamentário e financeiros para evitar divergências entre tribunais de Contas dos Estados e dos municípios.
- Leis e decisões judiciais que criarem despesas só devem ter eficácia se houver previsão no orçamento.
- Benefícios tributários serão reavaliados a cada quatro anos.
- No âmbito federal, a partir de 2026, os benefícios tributários não poderão ultrapassar 2% do Produto Interno Bruto (PIB) – se estiverem acima desse teto, não haverá novas concessões, ampliação ou renovação de benefícios.
2. Autonomia das regiões
Transferência de royalties do petróleo e participações especiais a todos os Estados e municípios. A distribuição de recursos do pré-sal poderá gerar até R$ 500 bilhões a mais em 15 anos aos entes federativos.
ANÁLISES: professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), o economista Mauro Rochlin destaca que a distribuição de recursos é uma das principais ações previstas no Plano mais Brasil. Segundo ele, a medida provocará “reforço importante” para os cofres de Estados e municípios. O economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, especialista em finanças públicas, adota tom mais cauteloso. Para ele, dependendo da situação fiscal de cada Estado ou município e da quantia repassada, o efeito poderá ser pequeno.
- Operação de crédito entre entes da federação (diretamente ou por meio de fundo, autarquia, fundação ou estatal) fica proibida.
- União fica impedida de socorrer entes em dificuldades fiscais e financeiras a partir de 2026.
3. Desobrigar, desindexar e desvincular
- União não precisará mais dar crédito para que Estados e municípios paguem precatórios.
- A parcela do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) destinada ao BNDES será de 14% (a Constituição de 1988 determina que pelo menos 40% dos recursos sejam destinados a programas de financiamento do banco de fomento).
- Estados e municípios passam a receber toda a arrecadação do salário-educação e a definir o uso dos recursos.
- Os percentuais mínimos estabelecidos para saúde e educação não serão alterados. O que será permitido é o gestor administrar conjuntamente ambos os limites, o que significa que ele poderá compensar um gasto de uma área na outra.
- Despesas obrigatórias serão desindexadas (deixam de ser reajustadas) em casos de emergência fiscal. Exceção: benefícios previdenciários e BPC pela inflação.
- Receita pública não será vinculada a nenhum órgão, fundo ou despesa, com exceção de taxas, doações, Fundo de Participação dos Municípios (FPM), Fundo de Participação dos Estados (FPE) e vinculação constitucional.
4. Fortalecimento da federação
- Municípios com menos de 5 mil habitantes e arrecadação própria menor do que 10% da receita total serão incorporados por municípios vizinhos.
- O projeto também trata da restrição à criação de municípios.
ANÁLISE: especialistas em contas públicas avaliam a medida como positiva, já que pequenos municípios costumam depender de transferências federais para fechar as contas. Por outro lado, prefeitos criticam a proposta e projetam dificuldades de aprovação no Congresso.
5. Segurança jurídica
- Com o repasse de royalties e participação especial do petróleo, União e Estados encerrarão a disputa judicial sobre a Lei Kandir.
- Fica proibido o uso de fundos de pensão e depósitos judiciais de ações entre particulares para despesas do ente federativo.
6. Estado de Emergência Fiscal
Ocorrerá na União quando o Congresso autorizar retirada da regra de ouro (impede dívidas para despesas correntes).
Nos Estados, terá início quando a despesa corrente ultrapassar 95% da receita corrente.
União, Estados e municípios não podem promover funcionários (com exceção de serviço exterior, Judiciário, membros do Ministério Público, policiais, militares e que não implique em atribuição de função).
Ficam impedidos ainda reajustes, criação de cargos, reestruturação de carreiras, concurso ou criação de verbas indenizatórias.
Autoriza a redução de até 25% da jornada de trabalho e salário de servidores públicos.
PEC emergencial
Institui gatilhos para conter gastos públicos em caso de crise orçamentária de União, Estados e municípios. Está dividida em dois blocos, o de medidas permanentes e o de medidas temporárias.
No caso das medidas permanentes, há pontos comuns com o pacto federativo, como reavaliação de benefícios tributários a cada quatro anos, não podendo ultrapassar 2% do PIB a partir de 2026.
Entre as temporárias, destacam-se:
- Para Estados e municípios, acionamento de mecanismo sempre que a despesa corrente exceder 95% da receita corrente (um ano).
- Não pode promover funcionário (com exceções), sem dar reajuste, criar cargo, reestruturar carreira, fazer concurso e criar verbas indenizatórias.
- Permite redução de 25% da jornada do servidor com adequação dos vencimentos.
As medidas são automáticas por dois anos.
ANÁLISE: Mauro Rochlin, da FGV, elogia o teor da PEC emergencial. Segundo ele, as medidas podem estimular Estados e municípios a terem contas “relativamente equilibradas”.
— Os entes da federação não estão acostumados a mecanismo que podem adequá-los a nova realidade fiscal. Durante a crise, houve queda brutal na arrecadação de Estados e municípios — diz.
PEC dos fundos públicos
- Dinheiro parado em fundos será usado para pagamento da dívida pública. Novos recursos serão aplicados prioritariamente nos programas de erradicação da pobreza e de reconstrução nacional.
- A maior parte dos fundos será extinta no fim do segundo ano subsequente à aprovação da PEC. Hoje há 281, com quase R$ 220 bilhões em recursos paralisados, segundo o governo.
- A proposta também determina lei complementar para criação de fundos públicos.
ANÁLISE: o economista Mauro Rochlin, da FGV, avalia que a PEC provoca dúvidas e há “névoa” em torno dos eventuais impactos. Para o economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, retirar recursos de fundos para pagamento de dívida não é a atitude mais aconselhável. Na visão do especialista, o dinheiro deveria ser direcionado para investimentos, em áreas como infraestrutura, com capacidade de geração de empregos.