Ameaças no cenário externo e dificuldades encontradas pelo governo Jair Bolsonaro no Congresso preocupam investidores do mercado financeiro. Com a combinação dos dois ingredientes, a bolsa de valores de São Paulo (B3) perdeu fôlego, apesar do alívio na sessão desta quinta-feira (3), que manteve o índice Ibovespa acima da marca simbólica dos 100 mil pontos.
O indicador mede o desempenho das principais empresas. Nesta quinta, apresentou estabilidade ao longo da sessão. Nos momentos finais da jornada, conseguiu engatar alta de 0,48%, a 101.516 pontos.
Segundo analistas, a leve subida esteve relacionada à leitura de que o Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, poderá cortar o juro americano de maneira mais intensa. Com taxas menores no país de Donald Trump, há possibilidade de investidores correrem mais riscos em busca de melhor retorno financeiro. Isso poderia beneficiar mercados emergentes como o brasileiro.
O avanço de 0,48% ocorreu após o Ibovespa ter queda de 2,9%, na quarta-feira (2). A redução, a mais intensa desde agosto, refletiu dados que apontam menor vigor da economia mundial, além de revés sofrido pelo governo na tramitação da reforma da Previdência.
Ao concluir a votação em primeiro turno do projeto de mudança no sistema de aposentadorias, o Senado derrubou alteração na regra do abono salarial. Com isso, a economia prevista pela reforma teve redução de R$ 76 bilhões, para R$ 800 bilhões, em 10 anos.
— A percepção de risco vem aumentando no cenário externo, o que gera angústia entre investidores. Os Estados Unidos e a China travam guerra comercial. Internamente, houve letargia na tramitação da reforma da Previdência, e a proposta foi desidratada. Isso entrou no radar do mercado — avalia o professor de finanças Giácomo Diniz, especialista em investimentos.
Segundo analistas, o humor do mercado financeiro nas próximas sessões deve seguir atrelado a eventuais desdobramentos da agenda de reformas prometida por Bolsonaro. No cenário externo, a guerra comercial e a perda de ritmo da economia global tendem a continuar sob análise.
— O mercado é muito sensível a fatores que podem acontecer de maneira inesperada. Agora, a principal questão é a aprovação da reforma da Previdência. O mercado também vai analisar o comportamento do governo federal em relação a concessões e privatizações — pontua o economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating, Alex Agostini.
A taxa básica de juro da economia brasileira está no menor nível histórico, de 5,5% ao ano. Como a Selic serve de referência para aplicações de renda fixa — entre elas, a caderneta de poupança —, a bolsa poderá ganhar mais investidores em busca de melhor rendimento, dizem analistas.
— Com juro baixo, é preciso repensar investimentos. A questão é que a bolsa tem riscos —pondera o economista Alexandre Espirito Santo, da plataforma Órama.
Em nova queda, dólar chega a R$ 4,0894
O cenário externo gerou o principal impacto sobre o dólar ontem. Ao final da sessão, a moeda americana recuou 1,09%, vendida a R$ 4,0894. A queda foi influenciada por sinais de desaceleração da economia dos EUA. Diante da situação, analistas projetam corte mais forte no juro local, o que poderia beneficiar o mercado brasileiro, entre outros emergentes.
Conforme dados divulgados nesta quinta, o crescimento do setor de serviços dos EUA desacelerou em setembro para seu ritmo mais lento em três anos. A atividade mais fraca reforça a preocupação com os desdobramentos da guerra comercial travada com os chineses.
No Brasil, analistas do mercado financeiro consultados pelo Banco Central (BC) projetam que o dólar fechará o ano em R$ 4. A estimativa integra o relatório Focus — a edição mais recente é de segunda-feira. A previsão anterior para a cotação era de R$ 3,95 ao final de 2019.
Em tese, quando o dólar cai, beneficia segmentos importadores da economia brasileira. Isso tende a ocorrer porque commodities como petróleo e trigo têm seu valor atrelado à moeda americana. Ou seja, o câmbio tem reflexos sobre os preços de itens como combustíveis e alimentos.
No sentido contrário, quando a moeda americana sobe, pode gerar algum estímulo às exportações brasileiras, já que os valores de produtos vendidos a outros países tendem a avançar.