BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Enquanto o Ministério da Economia busca medidas para evitar uma paralisia da máquina pública por falta de recursos, propostas em debate no Congresso têm potencial para estrangular ainda mais o Orçamento.
Embora seja considerado mais austero do que a formação do último mandato, o atual Congresso vem trabalhando em iniciativas que ampliam os gastos da União em um momento de forte aperto fiscal.
Em discussão, estão medidas que beneficiam parlamentares e partidos políticos, perdoam dívidas de produtores ruais e ampliam o poder do Congresso na gestão do Orçamento. Há também proposta que multiplica os gastos da União com educação básica, mas sem o aval do governo.
Para o ano que vem, a equipe econômica estima que, após pagar todas as despesas obrigatórias como salários e aposentadorias, restarão R$ 89,2 bilhões para as chamadas despesas discricionárias, que incluem investimentos em infraestrutura, custeio da máquina pública e pagamento de bolsas de estudos.
O valor, que corresponde a 6% de todo o Orçamento, está no patamar mínimo histórico. Na avaliação de técnicos do governo, o montante não é suficiente para o ano e pode levar à paralisia de serviços.
Em meio a esse cenário, parlamentares articulam multiplicar por quatro a participação da União no financiamento da educação básica. Relatório final sobre a renovação do Fundeb prevê que a complementação federal ao fundo passe de 10% para 40%. O governo defende que o aumento vá apenas para 15%.
Pelos cálculos do Ministério da Economia, a mudança deve gerar um impacto de R$ 855 bilhões aos cofres federais em dez anos.
Deputados também negociam a criação de um programa de refinanciamento de dívidas de produtores com o Funrural (Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural) que somam R$ 11 bilhões.
De acordo com o presidente da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), deputado Alceu Moreira (MDB-RS), os débitos se acumularam porque os protutores seguiram decisões de tribunais de Justiça, que entendiam haver bitributação nas contribuições do setor. Entretanto, em 2018, o STF (Supremo Tribunal Federal) validou as cobranças. Um programa de refinanciamento das dívidas chegou a ser implementado, mas a adesão foi baixa. Agora, um possível perdão dos débitos voltou a ser negociado.
"Continuamos discutindo o tema e agora tem a posição do Ministério da Economia de tentar encontrar uma solução que pode ser pela remissão da dívida no Orçamento seguinte, porque se distribui em vários anos, ou pode ser por outra forma. Estamos procurando a solução", disse Moreira.
Há uma tentativa de turbinar o Fundo Eleitoral, que destinará recursos a campanhas de 2020. O valor de R$ 1,7 bilhão distribuído em 2018 seria ampliado para R$ 3,7 bilhões, segundo proposta do deputado Cacá Leão (PP-BA).
Após desgaste político, ele desistiu do aumento, mas o valor segue em aberto e será definido até o fim do ano na votação do Orçamento de 2020 pelos deputados e senadores.
Em outra frente, o Congresso aprovou proposta que engessa ainda mais Orçamento. A medida tornou impositivo o pagamento de emendas de bancadas partidárias, algo que era previsto apenas para as emendas individuais assinadas pelos parlamentares.
O consultor de Orçamento do Senado Vinícius Amaral diz que 19 anos após a implementação da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), as regras ainda não estão maturadas, o que dificulta a aplicação.
A legislação define, por exemplo, que toda medida que cria novas despesas deve trazer sua fonte de custeio, alguma compensação. Isso pode ser feito com corte de gastos ou com aumento de receitas, como criação de tributos e aumento de alíquotas.
"O que acontece se a lei for aprovada sem o atendimento desses dispositivos? Durante muito tempo, se dizia que o presidente da República teria que vetar. Se não vetar, tem penalidade? E se vetar, mas o Congresso derrubar o veto, existe penalidade para o Congresso? Isso nunca foi pacificado", disse.
O consultor afirma que uma decisão do TCU (Tribunal de Contas da União) neste ano traz algum direcionamento. No entendimento recente da Corte, lei aprovadas sem cumprir exigências da LRF passam a não ter eficácia. Ainda assim, segundo ele, restam dúvidas sobre quem será responsável por fazer essa avaliação.
Anualmente, o Orçamento traz uma margem para expansão de despesas, o que, em tese, permitiria a aprovação de projetos sem compensação específica. Neste ano, porém, a margem é negativa, o que significa que não há espaço para expansão de gastos sem medidas extras para compensar.
Segundo Amaral, há comissões na Câmara e no Senado responsáveis por avaliar se os projetos atendem aos requisitos legais. Porém, várias matérias acabam tramitando sem passar por esses colegiados.
"O não atendimento das exigências contribui para uma piora do cenário fiscal porque não se consegue garantia de que aquela despesa é sustentável no médio prazo", disse. "De qualquer maneira, a gente tem percebido uma preocupação crescente dos parlamentares com a adequação orçamentária dos projetos desde que se iniciou a crise fiscal".