O Congresso aprovou na noite de terça-feira (11) o projeto de lei que libera R$ 248,9 bilhões em dinheiro extra para o pagamento de despesas do governo federal. A adoção do crédito suplementar reflete as dificuldades das contas públicas no país, frisam analistas. Abaixo, entenda o que é a medida e como será feita a operação.
O que é o crédito suplementar?
A medida foi adotada para que o governo consiga pagar despesas correntes, incluindo benefícios assistenciais e Previdência. Em linhas gerais, significa aumento da dívida pública, cujo resultado bruto chegou a R$ 5,48 trilhões em abril — 78,8% do Produto Interno Bruto (PIB).
— Faltou dinheiro. Crédito suplementar é endividamento. É como ir ao banco e fazer um empréstimo para pagar os gastos no supermercado — compara o economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, especialista em contas públicas.
O que é a regra de ouro?
A diretriz impede a União de se endividar para pagar despesas correntes. Para descumpri-la e ter acesso ao crédito suplementar, o governo precisava do aval do Congresso. Sem a permissão do Legislativo, o presidente Jair Bolsonaro poderia ser enquadrado no crime de responsabilidade fiscal.
— A Constituição prevê o caráter de exceção para o descumprimento da regra de ouro. O crédito suplementar precisa de aprovação do Congresso. Quando o Orçamento deste ano foi enviado, já havia essa previsão — explica a pesquisadora Juliana Damasceno, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Em 2016, a então presidente Dilma Rousseff (PT) foi alvo de impeachment após denúncia de crime de responsabilidade, no episódio das "pedaladas fiscais". A expressão descreve o atraso nos repasses do governo a bancos públicos, obrigando as instituições a usarem recursos próprios para pagar benefícios como o Bolsa Família.
— O crédito suplementar foi necessário porque não tinha outra saída. As fontes de receita foram secando, mas o déficit continuou. O governo não tem muita margem de manobra — pontua o economista Fabio Klein, especialista em contas públicas da Tendências Consultoria.
Para quais áreas o dinheiro deve ir?
Dos R$ 248,9 bilhões, cerca de R$ 201,7 bilhões são destinadas a despesas com Previdência. Outros R$ 30 bilhões devem ir para o Benefício de Prestação Continuada (BPC), voltado a idosos e pessoas com deficiência. O crédito ainda contempla R$ 8,1 bilhões para subsídios, R$ 6,5 bilhões para o Bolsa Família e R$ 2,4 bilhões para compensar o INSS pela perda de receita com a desoneração da folha de algumas empresas.
Qual a origem do dinheiro?
Para conseguir os R$ 248,9 bilhões de crédito suplementar, o governo deve emitir títulos públicos. Ou seja, endividar-se.
O que são títulos públicos?
São uma opção de investimento para interessados. O órgão responsável pela emissão dos papéis é o Tesouro Nacional. Ao comprar títulos públicos, investidores "emprestam" dinheiro para o governo financiar sua dívida. Em troca, recebem rendimento em forma de taxas de juro.
Quem pode comprar títulos públicos?
A população em geral, desde investidores individuais até pessoas jurídicas, como bancos e demais instituições financeiras.
Como comprar títulos públicos?
Os títulos podem ser comprados em plataformas de bancos e corretoras de valores ou por meio do site do Tesouro Direto, com aplicações a partir de R$ 30. Para investir, é necessário ter conta em uma instituição financeira.
— A vantagem dos títulos do Tesouro em relação a outras aplicações de renda fixa, como a caderneta de poupança, é o retorno maior — diz o economista Martin Kirsten.
Quando o Tesouro Nacional emitirá os títulos para garantir o crédito extra ?
O Ministério da Economia informa que há títulos em estoque e não necessariamente haverá nova emissão.
O crédito suplementar será usado de novo?
Por causa da crise nas contas públicas, o Ministério da Economia projeta que precisará de autorização para descumprir a "regra de ouro" ao menos até 2022. Ou seja, durante todo o governo Bolsonaro. As estimativas apontam para necessidade de crédito extra de R$ 264,9 bilhões em 2020 e de aproximadamente R$ 150 bilhões nos dois anos seguintes.
— Sem sombra de dúvidas, a reforma da Previdência é necessária, mas não é a única que deve ser feita para mudar esse quadro. O que chama atenção é o fato de que o descumprimento da regra de ouro deveria ser uma exceção, e não ser usado com caráter normal — diz a pesquisadora Juliana Damasceno, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV).