SÃO PAULO, SP, BRUXELAS, BÉLGICA, E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Após mais de 20 anos de discussões, Mercosul e União Europeia selaram nesta sexta-feira (28) um histórico acordo de livre-comércio entre os dois blocos.
Em acordos de livre-comércio, países se comprometem a reduzir ou zerar tarifas de importação de produtos. Existem também negociações não tarifárias, como regras sanitárias que devem ser seguidas.
O entendimento é especialmente simbólico por se dar em um momento em que os Estados Unidos acirram a guerra comercial travada com a China, o que foi ressaltado por europeus nesta sexta.
O tratado já esteve perto de ser fechado outras vezes, e a conclusão das conversas foi atribuída pelo governo brasileiro e por membros do lado europeu à vontade política do Brasil em chegar ao acordo.
As tratativas vinham em ritmo mais acelerado no começo dos anos 2000, quando europeus temiam perder mercado para a Alca (Área de Livre-Comércio das Américas), o bloco liderado pelos Estados Unidos e que não prosperou.
As negociações chegaram a ser interrompidas nas gestões de Lula e Dilma, entre 2004 e 2012, mas foram retomadas em 2016, já no governo Temer.
Na prática, ainda que o presidente Jair Bolsonaro tenha considerado o acordo prioridade de seu governo, ele só foi fechado com seis meses de mandato em razão da retomada das conversas sob Temer.
O Ministério da Economia estima que o acordo deva representar um incremento de US$ 87,5 bilhões (R$ 336 bilhões) em 15 anos para o PIB brasileiro, podendo chegar a US$ 125 bilhões (R$ 480 bilhões). Esse é o prazo máximo para que o acordo seja completamente implementado.
O PIB brasileiro de 2018 somou R$ 6,8 trilhões --o incremento potencial em 15 anos representa 7% do PIB atual.
Já a CNI (Confederação Nacional da Indústria) prevê um aumento de US$ 9,9 bilhões (R$ 38 bilhões) nas exportações brasileiras para o bloco europeu, um aumento de 23,6% em dez anos.
O prazo não começa a contar imediatamente e depende da assinatura efetiva do acordo, que ainda deve demorar.
O que ocorreu nesta sexta-feira foi a conclusão das negociações e o anúncio político. A partir de agora, os dois blocos fazem a revisão técnica e jurídica dos termos fechados. Só nesse ponto será definida uma data para assinatura.
Depois disso, os presidentes dos países do Mercosul enviam o acordo para a aprovação do Congresso. Na UE, o acordo é encaminhado para votação no Parlamento Europeu.
Conforme informações do Ministério das Relações Exteriores e do Ministério da Agricultura, o tratado comercial cobre temas tarifários e regulatórios, incluindo serviços, investimentos, compras governamentais, barreiras, medidas sanitárias e propriedade intelectual. O pacto entre os países-membros envolve 780 milhões de pessoas.
O documento firmado nesta sexta prevê que mais de 90% das exportações do Mercosul terão tarifas zeradas em até dez anos. O restante das exportações terá reduções parciais e cotas de importação.
Um dos casos é o setor automotivo, que inicialmente terá cota de 50 mil veículos e carência de sete anos para o início da redução da alíquota, conforme apurou a reportagem.
O ritmo de corte nas alíquotas por setor só deve ser detalhado no fim de semana.
A União Europeia é a segunda maior compradora de bens do Mercosul (20%), atrás apenas da China.
As exportações de Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai para os 28 países do bloco europeu totalizaram 42,6 bilhões (R$ 186 bilhões) em 2018. No outro sentido, a UE vendeu o equivalente a 45 bilhões (R$ 196,7 bilhões).
Carnes, soja, café, bebidas e tabaco estão entre os itens mais comercializados do sul para o norte. Na contramão, a União Europeia vende sobretudo veículos e máquinas, produtos farmacêuticos e químicos ao Mercosul.
Na parte agrícola, o acerto deve reduzir barreiras no mercado europeu de produtos importantes para o Brasil, como suco de laranja e café solúvel.
Representantes do setor produtivo consideraram os termos do acordo modestos.
Conforme fontes em Bruxelas, a cota para exportação de açúcar e de carne de frango que poderá entrar sem cobrança de tarifa chegou a 180 mil toneladas por ano.
Já a cota de carne bovina foi selada em 99,9 mil toneladas, abaixo dos 100 mil, como era exigência dos europeus, e dos 140 mil que já haviam sido oferecidos em rodadas anteriores de negociação anos atrás.
O Mercosul, no entanto, conseguiu reduzir a tarifa aplicada para os produtos importados dentro do limite da cota.
No setor de vinhos, que era uma das preocupações dos sul-americanos dada a alta competitividade dos europeus, o prazo para a redução de tarifas será longo, principalmente para espumantes.