A forte desvalorização da lira turca desde a semana passada trouxe mais nervosismo para o mercado de câmbio do Brasil nos últimos dias. Porém, economistas avaliam que o país tem fundamentos melhores do que a Turquia e não deve sofrer turbulência mais significativa, a despeito do risco de manutenção da volatilidade na cotação do dólar ante o real.
Uma das principais diferenças entre as duas nações está nas reservas cambiais. Enquanto no país asiático o valor está em cerca de US$ 100 bilhões, no Brasil é quase quatro vezes maior, de US$ 380 bilhões.
Por também ser um emergente, o Brasil sente os efeitos do derretimento da moeda turca devido à maior aversão ao risco dos investidores internacionais nos países em desenvolvimento. Ao mesmo tempo, teme-se que a crise na Turquia possa afetar bancos europeus detentores de títulos daquele país e elevar o nível de contágio.
Mesmo assim, apesar do quadro fiscal delicado, a situação do Brasil é mais sólida, de acordo com o coordenador do Centro de Macroeconomia Aplicada da Escola de Economia da FGV-SP, Emerson Marçal.
— Somos um caso diferente. Temos contas externas mais ajustadas, inflação sob controle, nível de reservas alto, autoridade monetária com certa independência. Se olhar para a Turquia, é bem diferente — compara.
Para Marçal, a maior vulnerabilidade do Brasil hoje é o déficit fiscal. Com taxa de juro bem mais baixa do que no passado recente no país, a crise na Turquia acaba sendo mais um argumento para grandes investidores internacionais retirarem recursos do Brasil e levar para mercados mais sólidos.
O economista Rafael Gonçalves Cardoso, da Daycoval Investimentos, lembra que, além das reservas cambiais menores, a Turquia tem inflação em 12 meses de 16%, enquanto no Brasil está abaixo de 5%. Cardoso ressalta que, apesar de o episódio ter sido deflagrado por uma disputa específica com os Estados Unidos, a crise cambial na Turquia está em um contexto maior.
— Há um movimento mais amplo, que é o fortalecimento do dólar no mundo. Quatro meses atrás a bola da vez era a Argentina — observa Cardoso.
O estopim, desta vez, foi a decisão da Casa Branca de sobretaxar o aço e o alumínio da Turquia, em represália à manutenção da prisão de um pastor americano acusado de conspirar contra o governo do presidente Recep Tayyip Erdogan.
O economista Carlos Pedroso, do banco MUFG Brasil, lembra que, desde a última quarta-feira, enquanto a lira turca se desvalorizou cerca de 18% ante o dólar, o real perdeu apenas 3% frente à moeda americana. Nesta terça-feira (14), a moeda da Turquia até se valorizou 8% frente à americana, mas no ano perdeu cerca de 40% do valor. Apesar de o câmbio no Brasil ter estressado nos últimos dias, com o dólar chegando a R$ 3,93 na segunda-feira, não há motivo por enquanto para intervenção do Banco Central, entende Pedroso.
— O BC deve manter a postura de agir apenas em momentos em que o real tiver comportamento pior do que o mercado, e não quando acompanha seus pares — diz o especialista.
Enquanto no início do mês o dólar chegou a R$ 3,70, na segunda-feira fechou cotado a R$ 3,89. Nesta terça após três dias consecutivos de alta, encerrou em queda de 0,7%, a R$ 3,86. Para Marçal, da FGV, sem resolver a questão fiscal, o país terá instabilidade de qualquer forma, seja importada ou gerada no próprio país.