O governo federal anunciou, na manhã desta terça-feira (27), o Plano Safra 2023/2024, com valor de R$ 364,22 bilhões. O programa anual prevê as diretrizes e aportes para financiamento da agricultura e da pecuária no país. Neste ano, o anúncio foi separado em duas etapas. Nesta terça-feira, contempla o ramo empresarial, espraiando-se para médios e grandes produtores rurais. Na quarta-feira (28), ocorrerá no âmbito da agricultura familiar. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, participam do lançamento, em Brasília. O governo considera o maior montante da história.
Os valores são destinados para o crédito rural para produtores enquadrados no Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp) e demais grupos. A cifra representa um aumento de cerca de 27% em relação ao financiamento anterior (R$ 287,16 bilhões para Pronamp e demais produtores).
Dentro do do bolo de R$ 364,22 bilhões, R$ 272,12 bilhões são destinados ao custeio e comercialização — salto de 26% ante 2022. O restante, R$ 92,1 bilhões, são encaminhados para investimentos — alta de 28%.
Pedindo licença simbólica do cargo de ministro da Agricultura ao presidente Lula para falar como senador, Fávaro fez críticas ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, na condução da política monetária do país.
Segundo Fávaro, Campos Neto deveria ir ao Senado para explicar a responsabilidade dele com o Brasil diante da Selic que não cede em um ambiente de inflação menos agressiva. Em seguida, afirmou que a construção para chegar no valor recorde do Plano Safra exigiu esforço, nesse contexto de juro básico do país estacionado em patamar elevado:
— O Plano Safra do ano passado tinha taxa básica de juros de 12,75%. E agora foi construído com juro de 13,75%. Equalizar isso é um esforço impressionante. Aumentamos muito o recurso, em 27%, e conseguimos baixar até um pouco a taxa de juros.
O presidente Lula afirmou no evento que o governo "não pensa ideologicamente" ao criar o Plano Safra e prometeu lançar, a cada ano, um programa melhor que o do ano anterior.
Taxas
O plano prevê que R$ 186,4 bilhões (+31,2%) terão taxas controladas, dos quais R$ 84,9 bilhões (+38,2%) com taxas não equalizadas e R$ 101,5 bilhões (+26,1%) com taxas equalizadas (subsidiadas). Outros R$ 177,8 bilhões (+22,5%) terão a taxas livres.
Produtores enquadrados no Pronamp terão taxas de juros para custeio e comercialização de 8% ao ano. Já os demais produtores contarão com taxa de 12% ao ano. No âmbito dos investimentos, as taxas variam entre 7% e 12,5% ao ano. Em linhas gerais, o governo manteve as taxas, mas destacou incentivo para produtores com destaque em sustentabilidade (veja mais abaixo).
Sustentabilidade
A atual edição do Plano Safra na esfera empresarial conta com incentivo para produtores que atuam com mais força na sustentabilidade. Produtores que estão com o Cadastro Ambiental Rural (CAR) analisado e os que adotam práticas agropecuárias consideradas mais sustentáveis serão premiados. Existe a previsão de redução de 0,5 ponto percentual na taxa de juros de custeio para os empresários rurais que têm o CAR analisado, em uma das seguintes condições: 1) em Programa de Regularização Ambiental (PRA), 2) sem passivo ambiental ou 3) passível de emissão de cota de reserva ambiental.
Produtores que adotarem práticas de produção agropecuária consideradas mais sustentáveis também terão direito à redução de 0,5 ponto percentual na taxa de juros de custeio. Essa categoria leva em conta algumas ações, como produção orgânica ou agroecológica, bioinsumos, tratamento de dejetos na suinocultura, pó de rocha e calcário, energia renovável na avicultura, rebanho bovino rastreado e certificação de sustentabilidade. O governo explica que a definição do rol dessas práticas, bem como a regulamentação de como elas serão comprovadas pelos produtores rurais junto às instituições financeiras, ocorrerá após o lançamento do Plano Safra 2023/24.
As reduções na taxa de juros de custeio via incentivo poderão ocorrer de forma independente ou cumulativa. Caso o produtor preencha os dois requisitos, ele poderá ter uma redução de até um ponto percentual na sua taxa de juros de custeio nesse caso.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse que o Brasil é o país que reúne as melhores condições para estar na vanguarda, e não na retaguarda, da sustentabilidade. Nesse sentido, precisa agir agora para não ficar para trás ante outros países ou blocos econômicos, como Estados Unidos, Canadá, China e União Europeia.
— Não se vai tornar um país sustentável, um setor sustentável da noite para o dia. Isso é trabalho, investimento, persistência. Mas a gente tem de dar os primeiros passos para não ficarmos trancados pelo lado de fora, porque o mundo caminha nessa direção — avaliou Marina.
O governo também anunciou que o Programa para Financiamento a Sistemas de Produção Agropecuária Sustentáveis (RenovAgro) incorpora os financiamentos de investimentos identificados com o objetivo de incentivo à adaptação à mudança do clima e baixa emissão de carbono na Agropecuária.
Armazéns e irrigação
O plano também prevê aumento de 81% no volume de recursos destinados ao Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA) para a construção de armazéns com capacidade de até 6 mil toneladas e de 61% para para espaços de maior capacidade. No âmbito da irrigação, está previsto crescimento de 30% nos valores destinados ao Programa de Financiamento à Agricultura Irrigada e ao Cultivo Protegido (Proirriga).
Análise
O vice-presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), José Mário Schreiner, afirmou que o anúncio conversa com as propostas entregues pela entidade ao Ministério da Agricultura. Schreiner afirmou que ainda existem alguns pontos que poderiam avançar melhor, como maior clareza sobre recursos necessários ao seguro rural, mas elogiou o plano de maneira geral e destacou que a entidade vai observar de perto os próximos passos:
— De uma forma geral, o plano safra atende bem aos anseios dos produtores, às propostas que a CNA entregou, porém agora vem o grande desafio de vermos esse recurso chegar de forma contínua para que não haja rupturas, falhas, falta de recurso no meio do caminho.
O professor da Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS Paulo Dabdab Waquil, que atua nas áreas de agronegócio e desenvolvimento rural, afirma que o novo plano traz avanços, como diálogo com o setor, expansão do volume de crédito e incentivo a sustentabilidade. A ampliação do limite de renda bruta anual para o enquadramento no Pronamp, de R$ 2,4 milhões para R$ 3 milhões, também é importante, segundo o docente:
— Quem estava no meio desse valor, na faixa de R$ 2,5 milhões por exemplo, acessava o crédito nas outras modalidades com juro mais elevado. Agora, consegue taxas mais baixas. Isso ajuda o setor.
Em relação aos pontos que carecem de melhora, Waquil cita a taxa de juros, que poderia ser menor, e o aporte menor em investimento. O professor avalia que destinar mais verba para investimento garante um avanço estrutural e não de curto prazo, como ocorre em custeio e comercialização.