Com quase 80% da matéria-prima dos fertilizantes importada, o Brasil deverá bater recorde no consumo dos três principais macronutrientes para as plantas: nitrogênio, fósforo e potássio. As vendas da conhecida fórmula NPK deverão alcançar a marca histórica de 36,2 milhões de toneladas em 2019, segundo projeção de indústrias do setor. Estimulado pelo aumento da tecnologia na agricultura, o uso de adubos químicos nas lavouras do país cresceu 450% nos últimos 30 anos — período em que a média mundial não passou de 50%.
— O consumo de fertilizantes está relacionado ao crescimento da produção agrícola brasileira, em uma velocidade não vista em nenhum outro lugar do mundo — destaca Carlos Eduardo Florence, diretor-executivo da Associação dos Misturadores de Adubo do Brasil (AMA Brasil).
Quarto maior mercado mundial de fertilizantes, atrás de China, Índia e Estados Unidos, o Brasil tem terreno fértil para investimentos de indústrias. Multinacional norueguesa, a Yara está com projetos em andamento no país — que responde por 25% do faturamento global da empresa. Um deles no Rio Grande do Sul, onde a companhia está duplicando o complexo industrial de Rio Grande, no sul do Estado. Com 75% das obras físicas prontas, o empreendimento está previsto para ser concluído no final de 2020. O investimento, superior a R$ 1,5 bilhão, ampliará a capacidade de produção de 750 mil toneladas para 1,2 milhão de toneladas por ano.
— Esse aporte suprirá a demanda dos agricultores de vários Estados nos próximos 25 anos — projeta Cleiton Vargas, vice-presidente de Vendas e Marketing da Yara Brasil.
Também instalada no Rio Grande do Sul, a Águia Fertilizantes obteve na última quarta-feira (16) licença prévia da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) para mineração de fosfato em Lavras do Sul, na Campanha. Após essa etapa, a empresa cumprirá os requisitos para obter a licença de implantação e começar as obras físicas. A previsão para entrar em operação é meados de 2022. O minério de fosfato poderá ser extraído da mina por mais de 60 anos. O projeto Fosfato Três Estradas prevê investimentos de US$ 100 milhões.
— É uma iniciativa inovadora, ambientalmente amigável e benéfica para pequenos e grandes produtores — afirma Fernando Tallarico, diretor-geral da Águia Fertilizantes.
Multinacional americana com unidades de fosfatados e potássio no Brasil, a Mosaic Fertilizantes está focada em melhoria de processos nas plantas em Minas Gerais, Goiás e Sergipe.
— O país tem terra arável disponível, clima adequado e grande potencial de desenvolvimento de tecnologias adequadas ao clima tropical — afirma Eduardo Monteiro, diretor de Distribuição da Mosaic do Brasil.
Barreiras para reduzir dependência externa
Enquanto o consumo interno cresce, o país continua com limitações para reduzir a dependência de matéria-prima trazida de fora — no potássio, por exemplo, as importações chegam a 96%. Embora a disponibilidade tenha a ver também com recursos naturais, há obstáculos de mercado — como a falta de isonomia tributária entre produção nacional e importada e a baixa oferta de gás natural, controlada no país pela Petrobras.
— Sem uma política nacional para o setor, há poucas chances de conquistar a independência da importação desses nutrientes — indica Monteiro.
Indústrias reclamam que o regime atual de ICMS sobre fertilizantes isenta o imposto nas importações, reduzindo competitividade da produção nacional e inibindo investimentos.
— Há potencial para aumentar a produção, o problema é que o segmento foi deixado de lado nos últimos anos — diz o diretor-executivo da AMA Brasil.
Há plantas de nitrogênio desativadas e obras inacabadas da Petrobras em três Estados brasileiros. Uma unidade na Bahia e outra em Sergipe estão paradas desde o ano passado pela falta de fornecimento de gás natural. Uma outra operação, em Mato Grosso do Sul, que receberia gás natural da Bolívia, teve a construção interrompida há cinco anos — quando o empreendimento estava com 80% dos recursos aplicados. As unidades devem ser vendidas ou arrendadas à iniciativa privada.
Há ainda uma reserva de potássio no Amazonas, considerada uma das maiores do mundo, pertencente a uma empresa canadense, que enfrenta problemas de exploração por questões fundiárias envolvendo áreas indígenas.
Tática para comprar no melhor momento
Influenciado pelo câmbio e demanda mundial, como qualquer commodity, o preço dos fertilizantes no país tem uma grande variação ao longo do ano — o que exige planejamento do agricultor para compra dos produtos. Levantamento da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) dos últimos cinco anos mostra que a diferença entre o melhor e o pior momento para aquisição de adubos chega a 23%.
— Não existe período mágico de compra, cada ano é um ano. Mas o que as estatísticas têm mostrado é que o trimestre maio, junho e julho costuma ser de bons negócios, na comparação com outros meses — explica Antônio da Luz, economista-chefe do Sistema Farsul.
O especialista recomenda ao agricultor adotar estratégia de compra, pois os preços tendem a subir após a largada do crédito para custeio, por conta de maior demanda, por exemplo.
— Nem sempre o câmbio exerce tanta importância na formação de preço. É preciso observar os sinais do mercado para aproveitar as oportunidades — completa Luz.
Produtor em Santa Bárbara do Sul, no Noroeste, Adriano Cattani costuma comprar fósforo e nitrogênio no máximo até o final de abril. O potássio, aplicado mais tarde na lavoura, é adquirido ao longo do ano — conforme variação de preço.
— Estamos aumentando os investimentos em fertilizantes por acreditar que o retorno é proporcional, o custo-benefício certamente compensa — afirma Cattani, 27 anos.
Com 1,2 mil hectares cultivados com grãos, o produtor tem agricultura de precisão em 100% da área há 10 anos. De lá para cá, aumentou em quase 80% as doses de adubo nas lavouras, com aplicações assertivas. Nesse período, o rendimento médio da soja na propriedade passou de 50 para 75 sacas por hectare — aumento de 50%. No milho, a variação de produtividade saltou 80%, saindo de cem para 180 sacas por hectare no sequeiro.
— A tendência a partir de agora, com maior reserva de fertilidade no solo, é de uma necessidade menor de adubação — projeta Cattani.
Tendência de oferta menor e preço maior
Com o preço dos fertilizantes em dólar menor neste ano, na comparação com 2018, a tendência é de recuperação das cotações em 2020. Há um ano, o valor da tonelada de fósforo no mercado internacional estava 31% mais baixo, de ureia (base do nitrogênio), 21% menor e de potássio, 10% inferior — segundo a AMA Brasil.
— Haverá um ajuste na produção mundial e maior demanda de países do Hemisfério Norte, o que deverá pressionar as cotações para cima — projeta Rafael Ribeiro de Lima Filho, consultor de mercado da Scot Consultoria.
A cotação do dólar acima de R$ 4 no câmbio brasileiro também deverá contribuir para a alta de preço no mercado interno, acrescenta o consultor. Para a safra 2019/2020, a relação de troca na soja (quantidade de produto agrícola necessária para adquirir uma tonelada de fertilizante) é de 24,44 sacas — o maior volume da última década, segundo levantamento da Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado (Fecoagro).
— Em compensação, a produtividade cresceu 15,8% no período. O custo maior do fertilizante se reflete em colheitas maiores — pondera Tarcísio Minetto, economista da Fecoagro.
A soja lidera o mercado de fertilizantes no Brasil, com 41% do consumo, seguida por milho (16%), cana de açúcar (12%), café e algodão (4% cada).
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