Além da paralisação das demarcações de territórios indígenas, no radar do presidente Jair Bolsonaro estão também outras pautas de interesse do setor agropecuário, como reforma agrária, anistia de produtores em débito com o Funrural e flexibilização da posse de arma, anunciada na quarta-feira (16). Veja:
R$ 17 bilhões do Funrural a serem perdoados
O governo de Jair Bolsonaro se manifestou favorável a perdoar passivos de produtores em relação ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural), medida que impactaria em R$ 17 bilhões as finanças do país, conforme a Receita Federal. O rombo projetado para as contas públicas no ano de 2019 é de R$ 139 bilhões. De acordo com a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, "existem grupos estudando (a questão)".
O passivo bilionário foi acumulado a partir de 2010, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) avaliou um processo e decidiu que a contribuição era inconstitucional para caso específico, do frigorífico Mata Boi, com sede em Minas Gerais. Com isso, milhares de produtores – embasados ou não em liminares – deixaram de fazer o recolhimento. Em março de 2017, o STF julgou constitucional a contribuição, possibilitando a cobrança retroativa.
Até 31 de dezembro, era possível aderir ao Programa de Regularização Tributária Rural, o chamado Refis do Funrural. No Estado, a adesão foi de cerca de 3 mil pessoas físicas, segundo a Receita Federal, em universo de 365 mil estabelecimentos agropecuários existentes. A dívida declarada por quem aderiu à renegociação no Estado é de cerca de R$ 800 milhões.
Vai e volta da reforma agrária
Outra bandeira levantada por Bolsonaro, a revisão da reforma agrária parecia já ter sido colocada em prática no terceiro dia de governo, quando o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) determinou a paralisação de todos os processos de aquisição, desapropriação ou outra forma de obtenção de terras.
Após o caso tornar-se público, o presidente substituto do Incra, Francisco Nascimento, revogou a decisão no último dia 8 e explicou que os memorandos haviam sido elaborados e encaminhados "por inciativa própria das duas diretorias e sem anuência da presidência".
Estão em andamento na superintendência regional do Incra no Estado 12 processos de obtenção de terras para reforma agrária. No país, são 250. Para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a suspensão agravaria a tensão no campo e geraria prejuízo aos cofres públicos, pois o governo gastou recursos em vários processos de identificação das terras. Segundo Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST, existem 120 mil famílias acampadas no Brasil e "elas não vão desistir da luta pela terra, sempre pela paz no campo, repudiando a violência".
No Estado, são cerca de 2 mil famílias acampadas. A paralisação da reforma agrária é um temor dos trabalhadores rurais sem terra. O presidente da comissão de Assuntos Fundiários da Farsul, Paulo Ricardo Dias, diz que a entidade é "contra a colocação de recurso público em assentamentos de cunho ideológico, mas acha legítimo que os pequenos produtores rurais tenham crédito diferenciado".
Posse de arma rural para aumento da segurança
Principal promessa de campanha do atual presidente, a flexibilização da posse de arma de fogo foi levada a cabo por decreto no dia 15. Bolsonaro baniu a subjetividade da comprovação de efetiva necessidade – declaração que precisava ser apresentada à Polícia Federal justificando o pedido.
Uma das maiores entidades do agronegócio, a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja-Brasil) manifestou apoio à flexibilização da posse de arma, incluindo nas propriedades rurais. A bancada ruralista articula, ainda, a criação de uma categoria para posse de arma rural. Conforme a norma vigente, é permitido que o proprietário mantenha arma “exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou dependência destes”. A definição de "dependência" é dúbia e os tribunais têm decidido que no campo é autorizado carregar apenas dentro da residência e, no máximo, nos arredores dela.
A nova categoria acabaria com a ambiguidade da legislação ao dar aos ruralistas direito a carregar a arma por toda a propriedade. E, ainda, de um local a outro, desde que arma e terrenos de origem e destino sejam seus. Os detalhes dessa proposta ainda são discutidos, mas assunto deve pautar o Congresso ainda neste ano quando o PL 3722/2012 e outras matérias que tramitam em conjunto forem apreciados.
Esses textos alteram o Estatuto do Desarmamento, com menos exigências, burocracia e custo para aquisição de armas. Isso aumentaria a segurança, segundo Bolsonaro.
Fim das demarcações
A identificação, delimitação, demarcação e registro de territórios indígenas – competências que passaram a ser do Ministério da Agricultura e não mais da Fundação Nacional do Índio (Funai). O próprio órgão indigenista deixou a pasta da Justiça no início do mês para ser incorporado à dos Direitos Humanos. Com 19 territórios em estudo pelo governo para possível demarcação, o maior número entre todos os Estados, o Rio Grande do Sul será afetado pelo cenário de mudanças.