Na tela do celular, o produtor Bruno Berwig Tombini, 29 anos, controla pelo aplicativo a quantidade de água irrigada na lavoura de milho em Carazinho, no norte do Estado. Ao mesmo tempo, o pai, Leomar Luis Tombini, 61 anos, se informa em tempo real sobre as cotações no mercado de grãos e de insumos. Enquanto isso, trocam constantemente informações com o grupo de Whatsapp formado pela equipe técnica das cinco propriedades da família.
Ambos, pai e filho, ilustram o rápido crescimento do uso da tecnologia entre produtores rurais – de todas as idades. Pesquisa da Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio (ABMRA) revela que o percentual de aparelhos móveis com internet cresceu de 17% para 67% em quatro anos no Rio Grande do Sul. O índice gaúcho é 11% superior à média brasileira.
– O smartphone facilitou o suporte técnico e também a comunicação dentro da propriedade. O aparelho se tornou uma ferramenta de gestão – destaca Jorge Espanha, presidente da ABMRA, que ouviu mais de 2,8 mil produtores em 15 Estados brasileiros.
A 7ª Pesquisa Hábitos do Produtor Rural também investigou o uso de redes sociais, onde o Whatsapp aparece com 96%. O smartphone ajudou a introduzir produtores no mundo tecnológico, já que muitos tinham acesso limitado ou quase nulo a computadores. Foi por meio do aparelho que Leomar Tombini passou a se conectar mais.
O desafio é transformar dados em informações que resultem em conhecimento para tomada de decisão.
RAFAEL VIEIRA DE SOUSA
Professor de Engenharia de Biossistemas da USP
– Raramente acessava a internet pelo computador. Agora, com o telefone, fico atualizado o dia todo – conta o agricultor, que é presidente do Sindicato Rural de Carazinho.
Com a cotação da soja na Bolsa de Chicago e do câmbio brasileiro na tela do celular, Leomar toma decisão de vendas antecipadas do grão e compra de defensivos e fertilizantes. Acompanha as safras americana, argentina e paraguaia – que repercutem diretamente no mercado local:
– Antes, a informação demorava a chegar no campo, agora é instantânea.
Se para Leomar o celular auxilia nos negócios da Sementes Tombini, para o filho é também ferramenta de apoio técnico e agronômico. Por um aplicativo, Bruno recebe informações sobre umidade do solo e água necessária no pivô de irrigação. Por outro, controla o tempo em estações meteorológicas instaladas nas fazendas.
– Nossos gerentes informam o quanto choveu e o aplicativo indica o volume de milímetros de água necessários para equilibrar a umidade – explica Bruno, formado em Administração.
Pelo smartphone, o jovem também monitora doenças e pragas nas lavouras de soja, trigo, milho, aveia, linhaça e canola – repassando relatórios instantaneamente à equipe técnica de sete pessoas. A médio prazo, o jovem pretende controlar a frota de máquinas pelo celular.
Acesso à tecnologia móvel facilita sucessão
Não bastassem os ganhos de produtividade, o acesso à tecnologia permitiu a Bruno ter mais liberdade nos negócios da família, facilitando o processo de sucessão. A pesquisa mostra ainda o rejuvenescimento da decisão de compra no campo: 27% do poder está nas mãos de produtores de 26 a 35 anos – na comparação com 2013, um aumento de 50%.
– A tecnologia, junto com a automação, é um grande atrativo para segurar os jovens no campo. São eles que ajudam a abrir a cabeça do pai, que acaba sendo ‘fisgado’ pelas inúmeras possibilidades trazidas pelo mundo digital – avalia Rafael Vieira de Sousa, professor de Engenharia de Biossistemas da Universidade de São Paulo (USP).
A reversão da tecnologia em ganhos concretos, pondera o especialista, depende da eficiência da interpretação dos dados gerados.
– O desafio é transformar dados em informações que resultem em conhecimento para tomada de decisão assertiva. Estamos falando de BIG Data, de inteligência artificial por meio de algoritmos – avalia
O crescimento do uso de smartphones no campo fez o acesso à internet alcançar 87% dos entrevistados no Estado – contra 63% na média nacional. O percentual superior pode ser explicado pela exposição maior dos gaúchos aos meios de comunicação.
A barreira geográfica tecnológica está cada vez menor
MARCELO CLAUDINO
Diretor de Inteligência de Negócios do Grupo Informa/FNP
– O produtor do Sul é um grande consumidor de informação, em diferentes plataformas – destaca Jorge Espanha, presidente da ABMRA.
A influência da digitalização no desempenho produtivo e econômico da produção orgânica no Estado está sendo investigada em pesquisa iniciada este ano. Desenvolvido pela UFRGS, Embrapa, Imed e Secretaria da Agricultura, o projeto é apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs).
– O foco será em aplicativos justamente por terem se tornado uma ferramenta de mudança organizacional das propriedades nos últimos anos – explica Carlos Alberto Oliveira, pesquisador da Secretaria da Agricultura.
A opção por produtores orgânicos se deu pelo nível de internalização dos processos, levando em conta que precisam desenvolver tecnologias para escapar dos insumos convencionais. A pesquisa terá duração de três anos.
Rural e urbano mais próximos
A disseminação de celulares com internet entre produtores reduziu a distância entre o campo e a cidade.
– A barreira geográfica da tecnologia está cada vez menor – analisa Marcelo Claudino, diretor de Inteligência de Negócios do Grupo Informa/FNP, executor da pesquisa encomendada pela ABMRA.
O sentimento de proximidade com o meio urbano é compartilhado pelo casal Otair e Juliana Wingert. Produtores de hortaliças em São Sebastião do Caí, no Vale do Caí, eles usam o smartphone e o tablet para tudo: serviços bancários, compra de insumos, compartilhamento de dados e consultas técnicas. Em 2017, quando passou a usar a tecnologia, Juliana identificou brócolis murchos na lavoura. Na hora, fotografou as plantas e enviou para técnicos.
O produtor gaúcho é um grande consumidor de informação, em diferentes plataformas
JORGE ESPANHA
Presidente da ABMRA
– Em poucos minutos, identificamos o fungo que estava atacando o solo, tendo a receita correta do que precisávamos aplicar para fazer o tratamento – lembra a produtora.
A conexão móvel também está ajudando o casal a organizar a propriedade de oito hectares, com aplicativos específicos de gestão e de produção.
– Queremos avançar na rastreabilidade e na sanidade dos alimentos, e para isso precisamos ter os dados organizados e digitalizados – conta Juliana, participante do Programa Juntos para Competir, do Senar, Sebrae e Farsul.
A tecnologia também ajudará a família a migrar da produção convencional para a orgânica, diminuindo gradativamente o uso de químicos na lavoura.