O foco de Ludmilla, na fase atual, está bem definido. É cantar, produzir e trocar com o público cada vez mais e melhor. Todo o resto é consequência desse objetivo: os prêmios e nomeações são para coroar o trabalho árduo; o abdômen trincado é para aguentar o tranco de escrever, lançar músicas e performar por horas.
Aos 27 anos de idade e perto de completar 11 de carreira, a artista fluminense que começou no funk com o viral Fala Mal de Mim hoje também transita com propriedade pelo pop, trap e pagode, alimentando a ideia de que “Ludmilla nunca para de inventar moda”. Ela concorda:
— É bem por aí mesmo (risos). Sou movida a música, se não estou ouvindo, estou cantarolando ou compondo. Quem convive comigo sabe: acabo contagiando a todos com essa minha paixão.
Ludmilla é uma das principais atrações do Planeta Atlântida, que está de volta em sua 26ª edição, após a pausa de dois anos por conta da pandemia. Na conversa que teve com Donna, por e-mail, a cantora manteve suspense sobre o que planejou para o show marcado para este sábado (4) – a primeira vez com um palco só seu no festival – mas falou da sua certeza de querer voltar à Saba mais vezes.
O Planeta é uma das programações que marcam o início da temporada 2023 da cantora, em que o desafio será superar o ano que passou, considerado por ela como o melhor da sua carreira. Somente em 2022, a fluminense foi técnica pela segunda vez do The Voice + (versão do reality show da TV Globo para maiores de 60), tornou-se a primeira artista negra da América do Sul a ultrapassar 2 bilhões de reproduções no Spotify e ainda realizou uma das apresentações mais comentadas do Rock in Rio.
Boa parte desse sucesso se deve ao projeto de pagode Numanice, que marcou seu debut nesse estilo. Do EP lançado em 2020, Ludmilla trilhou caminhos até lotar a Marquês de Sapucaí com um show para 33 mil pessoas, no ano passado, com Numanice #2.
E foi justamente esse disco que lhe rendeu o primeiro Grammy Latino da carreira, na categoria Melhor Álbum de Samba/Pagode. Em um ritmo que tradicionalmente é dominado por vozes e narrativas masculinas, Ludmilla chegou rompendo barreiras e fazendo algo inédito para o público, que pôde ouvir uma mulher cantando uma declaração de amor para outra.
É o caso da canção Maldivas, feita para a esposa Brunna Gonçalves, que diz: “É a minha de fé/ Minha preferida/ Eu caso com essa mulher/ E vou parar lá em Maldivas”. Elas estão casadas há três anos e sonham em aumentar a família, embora Ludmilla sublinhe que os filhos estão nos planos de longo prazo, nada imediato.
Sem desacelerar diante das conquistas passadas, ela já começou 2023 com programação agitada. Está ensaiando o samba-enredo da Beija-Flor e fará dupla com Neguinho da Beija-flor no Carnaval da Sapucaí. Além do desfile, a cantora vai puxar seu próprio bloco, o Fervo da Ludmilla, no Carnaval do Rio de Janeiro. E como conciliar ritmos já virou sua marca registrada, também deixou marcado para a próxima terça-feira o lançamento de dois novos singles, dessa vez no gênero trap: Nasci Para Vencer e Sou Má, que define como “um single pra se sentir gostosa, para curtir com as amigas”.
No bate-papo a seguir, Ludmilla comenta, entre outros temas, sobre seus combustíveis de evolução e resiliência: a confiança em Deus e a paixão pela música, o público e a família.
O que planejou para a primeira vez no Planeta Atlântida com um palco só seu?
Um setlist animadíssimo para fazer o público se divertir a valer no meu show, porque já sei que vou querer voltar para este festival lindo. Tudo surpresa, hein, gente.
Seu 2022 foi repleto de shows, lançamentos e prêmios, e você chegou a dizer que foi o ano mais importante da sua carreira. A meta é superá-lo neste?
O ano de 2023 será de muito trabalho, assim como foi 2022. A meta é sempre fazer mais e melhor. Tomara que supere. No que depender de mim e da minha equipe, vamos trabalhar para isso.
Você está fazendo algo inovador em Numanice, em que ouvimos uma mulher cantando para outra, algo que não existia no samba e no pagode. Qual a importância desse trabalho?
Já falei tanto do quanto Numanice me surpreendeu positivamente que qualquer coisa que eu diga vai ser redundante. O projeto nasceu despretensiosamente, ultrapassou barreiras e conquistou tantas coisas e espaços, que é muito lindo ver essa evolução.
Maldivas é uma das músicas deste projeto, uma declaração de amor de uma compositora apaixonada para a sua musa inspiradora, como tantas outras. Mas sei que ser um casal de mulheres ainda é assunto em pauta.
E que bom que temos sido abraçadas por tanta gente e que tantas famílias conseguem entender melhor o amor entre duas pessoas do mesmo sexo, nos acompanhando e se inspirando em nossas famílias.
Você se tornou a primeira artista negra da América do Sul a ultrapassar 2 bilhões de streams no Spotify. Como enxerga isso?
Avalio como o resultado de muito trabalho. Amo o que faço e sou muito inquieta.
Estou sempre criando e querendo fazer mais e melhor. Todo reconhecimento, como números, prêmios e marcos, são consequências, não foco. O foco é dedicação para entregar o melhor ao público.
Estou sempre criando e querendo fazer mais e melhor.
LUDMILLA
Cantora
E há preconceito por ser uma mulher bissexual no cenário musical brasileiro? Como você se blinda contra manifestações de ódio?
Tem isso, mas é algo que já não toma meu tempo. Me cerco de pessoas de verdade, que me respeitam, e ponto.
No ritmo frenético que tem a sua carreira, como faz para cuidar da cabeça? No que você se apega quando as coisas estão difíceis?
Em primeiro lugar, tendo tempo para estar com a minha família, já que ter eles por perto é fundamental para me manter no eixo. Também lanço mão de terapia e tenho muita fé e confiança em Deus.
Quando está longe do palco e do estúdio, o que tem curtido fazer?
Gosto muito de fazer churrasco na minha casa, com a família e meus amigos. E gosto de viajar.
É preciso um corpo forte para aguentar essa carreira. Como é a sua relação com seu físico, de que forma cuida dele?
Tenho me exercitado com alguma frequência, não tanto quanto gostaria, mas tenho. E também tenho cuidado melhor da alimentação. Desde o Rock in Rio, passei a cuidar mais desta parte para ter mais pique para toda essa agenda que tenho.
O resultado acabou se refletindo no corpo e gostei bastante. Foi um combo, mas o principal é isso: tem feito muito bem para a minha performance como cantora em todos os âmbitos.
Na música Maldivas, que fez para a sua esposa, você fala sobre querer três filhos. A maternidade está nos planos?
Sim, mas ainda não estamos neste momento.
São mais de 10 anos de carreira. O que mais mudou em você nesse meio tempo?
Nossa, não sei se dá para falar que tudo, mas muita coisa. Comecei muito jovem, em uma época em que estamos nos construindo como pessoas, né.
Então, foram dois processos ao mesmo tempo, nos quais amadureci demais como artista, cantora, compositora e como ser humano.
Você tem 27 anos e já conquistou muita coisa. Onde espera chegar daqui para a frente?
Não tenho muito disso de projetar. Claro que planejo muitas coisas, mas vou plantando, plantando, e, com o tempo, vêm os frutos. Mas quero estar fazendo o que mais amo, que é cantar, é claro.
Uma pergunta em nome das suas fãs gaúchas: quando você vai trazer o Numanice para o Rio Grande do Sul?
Olha, quero muito e espero que muito em breve!