Uma questão que volta e meia vem à tona são as "palmadas" para educar os filhos. Há situações em que fazem sentido? Ou são uma forma violenta de lidar com as crianças? A discussão voltou a pipocar nas redes sociais nesta sexta-feira (12), quando a atriz e apresentadora Karina Bacchi, mãe do pequeno Enrico, de dois anos, deu sua opinião sobre a prática:
“Jamais faria isso. Acredito que existem diversas alternativas para ensinar sem repreender de forma tão severa. A palmada causa trauma, medo, afastamento... Não é essa relação que quero ter com meu filho”, disse ela.
Para a psicóloga Natália Vargas Filomeno, a atitude de Karina reflete uma mudança de comportamento que se vê em muitas famílias atualmente: não é raro que pais e mães tenham abolido completamente a palmada como uma forma de "castigar" as crianças.
— Hoje, o diálogo está mais presente nas relações familiares. E, justamente por isso, muitas famílias não concordam com a palmada — explica.
Mais do que discutir se faz ou não efeito, em seus atendimentos no consultório, Natália costuma incentivar os pais a refletirem: a palmada é realmente a única alternativa para educar uma criança? Ou existem outras estratégias que fazem mais sentido com os valores que você passar ao pequeno? O objetivo é mostrar que, sim, há outros métodos de educar e ensinar aos filhos o que é certo e o que é errado.
— Costumo conversar com a família sobre o que significa o bater, se cabe bater ou não, o que significa isso para os pais. Se é um bater que extrapola, ou é um bater que dá limite. Se educa ou não — conta. — Dizer categoricamente que é certo ou não pode afastar as pessoas. Mas existem outras alternativas.
O diálogo está mais presente nas relações familiares. Por isso, muitas famílias não concordam com a palmada
NATÁLIA VARGAS FILOMENO
psicóloga
Segundo a psicóloga Mariana Balardin, famílias e cuidadores que vêem a palmada como alternativa, geralmente, foram educadas desta forma - com medo de um castigo físico após uma estrepolia.
— Nossa cultura valida práticas parentais que sejam violentas e autoritárias. É algo que vem de muitas gerações, está internalizado nas pessoas — pondera.
Para a profissional, é preciso que os pais analisem os possíveis efeitos de uma palmada - muitas vezes, a criança entende que não deve repetir aquela atitude, mas não, necessariamente, saberá por que o seu comportamento não foi bom.
— As palmadas, teoricamente, podem funcionar como uma atitude que vai gerar medo e fazer com que a criança obedeça. Mas ela não vai internalizar o motivo daquilo. Ou, pior, vai internalizar que a culpa é dela, que está errada. Vai ficar com raiva e não vai aprender.
Vale lembrar que está em vigor desde 2014 a chamada Lei da Palmada, que busca coibir maus-tratos e violência contra menores ao determinar que pais não podem impor castigos que resultem em sofrimento ou lesões aos filhos. A regra também foi intitulada como Lei Menino Bernardo, em referência ao garoto Bernardo Boldrini, assassinado no Estado mesmo ano em que a legislação foi sancionada.
O que as mães dizem?
Lançamos a questão no Grupo de Mães Donna no Facebook para ouvir o que nossas leitoras pensam sobre o assunto. Algumas admitem que já deram palmadas, mas, na prática, não perceberam o efeito desejado e se arrependeram. Já outras afirmam que nunca teriam essa atitude. Confira alguns depoimentos:
"Já dei uma palmada no meu filho. Foi por impulso e por raiva minha. Depois, chorei junto com ele. Nunca mais dei. Apanhei muito quando criança. E a gente tende a repetir o comportamento dos nossos pais. Graças a Deus, somos seres evoluídos. Descobrir que palmada não agrega em nada é algo importante para nossa sociedade."
Danielle Rampi, 34 anos, administradora. Mãe do Eduardo, de dois anos.
"Para mim, a questão não é causar trauma. A questão é que estamos ensinando a criança que problemas e conflitos se resolvem com violência. O que ele fará, no futuro, com um amigo ou com a namorada que contrariarem ele, se ele aprendeu que, nesses momentos, a solução é a agressão?"
Júlia Rauber, 38 anos, servidora pública. Mãe do Arthur, de quatro anos, e do Eduardo, de sete meses.
"Sou totalmente contra o uso da força para se fazer respeitar. Isso só gera medo. Tenho um filho de 13 anos e nunca fiz isso. Nunca tive reclamação dele por comportamento ou falta de educação, em qualquer lugar que fosse."
Anelise Machado Badin, 42 anos, professora de matemática. Mão do João Victor, de 13 anos.
"A lei dos maus-tratos é coerente. Sei que a maior parte dos meus colegas psicólogos é contra qualquer tipo de agressão física, mas, diante da cultura e da fé das famílias, usar a vara ou a punição física é um recurso que não necessariamente é violento. Pode ser um dos inúmeros recursos que disciplina, mas quando é o único, vira um problemão."
Letícia Pedroso, 40 anos, psicóloga. Mãe de do Pedro e do João, ambos de oito anos.
"Sempre fui resistente a palmadas e qualquer outra forma de castigo que desrespeitasse o outro ser humano como eu e, principalmente, criança. Até que um dia, no auge do terrible two (os terríveis dois anos), ouvi muito que uma boa palmadinha ajudaria a dar limites e eu, quase enlouquecendo, acabei dando ouvidos. Conclusão: na hora, foi uma beleza, aqueles olhinhos arregalados me olhando, chorando e parando imediatamente com a teimosia. Talvez por medo, por surpresa, por não acreditar que a mamãe dele, que era seu porto seguro, o machucou. Depois de algumas horas, passei a ver uma criança chorando por qualquer coisa, amedrontada, insegura, sensível. E se passaram uns quatro dias assim. Para mim, isso não funcionou MESMO! Aprendi que tem outras formas de fazê-lo parar, como tirar os brinquedos, deixá-lo sozinho para se acalmar e conversar afetuosamente quando acaba a teimosia. Sinto que desta forma estou ajudando a construir um ser humano seguro e confiante, capaz de compreender que tem limites, mas que vive com afeto."
Camila Fialho, 40 anos, empresária, mãe do Gustavo, de três anos.