O uso de produtos de beleza na infância divide opiniões de mães e especialistas. Afinal, os cosméticos fazem mal à saúde e ao desenvolvimento das crianças? Como lidar com a vaidade das meninas em uma fase tão delicada da vida? Qual é o limite ao descobrir se a sua filha está exagerando ao brincar com maquiagem?
As dúvidas são muitas e cada vez mais frequentes. De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Brasil é um dos principais mercados mundiais do ramo. Não por acaso, empresas lançam uma infinidade de produtos de beleza direcionados a meninas. Em março, por exemplo, a Barbie criou, em parceria com a View Cosméticos, uma linha com glosses e batons para a pele infantil.
Em relação à saúde, o uso de maquiagem na infância deve ser feito com muito cuidado. A recomendação da dermatologista Clarissa Prati, vice-presidente da seccional gaúcha da Sociedade Brasileira de Dermatologia, é que menores de três anos não apliquem nenhum tipo de cosmético.
– A pele das meninas é bem mais sensível e delicada e, com isso, propensa a alergias. Para crianças que têm alguma doença de pele, a orientação deve ser individualizada – pontua a médica.
Uma cartilha elaborada pela Anvisa aponta que um requisito essencial para a maquiagem infantil é ter baixo poder de fixação e ser facilmente removida com água. A entidade também permite que os itens de make infantis contenham substâncias que possuam um gosto amargo, para evitar que a criança leve o produto à boca.
– Além disso, pincéis contaminados podem transmitir infecções. Se a maquiagem for de uso eventual, para uma brincadeira, por exemplo, a criança ficará satisfeita e terá um risco menor de dermatites – acrescenta a dermatologista.
Brincadeira que exige atenção
É na fantasia que a psicóloga Gisleine Verlang Lourenço, professora da Universidade La Salle, acredita. Para ela, se a maquiagem for usada de maneira lúdica e com moderação, só há vantagens.
– Por meio de qualquer brincadeira livre, a criança vai aprender algo e vai ver a consequência disso. Por exemplo, ela vai ter que se limpar depois de se maquiar. Isso é totalmente diferente de uma brincadeira tecnológica, que é só apertar no botão de off e acabou.
A sexualização é fruto do pensamento do adulto. A criança ainda está no processo do autoconhecimento, desenvolvendo sua autoestima. Não se pode culpá-la por isso".
GISLEINE VERLANG LOURENÇO
psicóloga e professora
Já a psicóloga Lisiane Motta defende que deve reinar o bom senso, ou seja: nem estimular a vaidade excessiva da criança, mas também permitir que ela possa experimentar a maquiagem como parte de um processo de autoconhecimento.
– Acho que não se pode problematizar a maquiagem, desde que seja dentro de um contexto de brincadeira. A questão é tratar disso muito cedo, porque a gente sabe que na adolescência muda – afirma.
E aí chegamos a outro ponto importante do assunto e que preocupa as mães. Algumas acreditam que, em excesso, aplicar cosméticos como batom, blush e sombras pode gerar uma adultização precoce. Especialistas reforçam que a prática não deve se tornar hábito – mesmo entre as adolescentes. Lisiane pontua que é importante acompanhar o interesse das meninas desde cedo e evitar que ela acredite que só está bonita se estiver maquiada.
– Na adolescência, principalmente, elas querem passar uma base para disfarçar as espinhas. Mas às vezes, mesmo sem querer, as adolescentes acabam se expondo a algumas questões que envolvem a sexualidade, e a maquiagem pode contribuir ainda mais com isso. De repente também dá para cuidar o uso de algumas cores. Evitar o batom vermelho, de início, por exemplo – orienta.
Gisleine acrescenta que a preocupação com a adultização precoce não deve servir como forma de punir a criança e privá-la da maquiagem.
– A sexualização é fruto do pensamento do adulto. A criança ainda está no processo do autoconhecimento, desenvolvendo sua autoestima. Não se pode culpá-la por isso – sustenta a psicóloga clínica, especialista em educação infantil.
Com a palavra, as mães
Levantamos a questão no Grupo de Mães de Donna do Facebook. Como era esperado, o assunto rendeu discussões. Veja algumas das opiniões:
"Minha filha adora passar batom e pintar as unhas. Não vejo problema quando é da vontade da criança e não uma coisa imposta, só porque ela é menina. Ela tem curiosidade, acha legal ficar toda rebocada. Não proíbo, só tento controlar um pouco por conta da sujeira que ela faz. Fora isso, é o livre arbítrio dela, não prejudica em nada, então não tem problema”. Luiza Ferreira Siqueira, estudante, mãe de uma menina de três anos
"Acredito que a maquiagem faça parte do imaginário infantil. Princesas usam maquiagem. Assim, no faz de conta, libero para minha filha. Da mesma forma que as crianças gostam de usar nossos sapatos de salto, bolsas. De forma lúdica, se a criança não for alérgica, não vejo problema. Mas o uso diário, por vaidade, não deixo. Ela vê a prima adolescente e quer fazer igual. De vez em quando autorizo um batom, mas só. Por ela, saía com máscara de cílios e blush. Temos que zelar de todas as formas pela infância de nossas crianças”. Franciele Sauthier, professora, mãe de uma menina de cinco anos
"Minha filha de sete anos ama se maquiar! Obviamente, não faz isso todos os dias, é uma criança. Mas tem limite sim, sempre! Acredito que enquanto a criança se maquia esporadicamente (durante uma brincadeira ou até mesmo uma make suave para passear),não há problema. Mas se essa passa a querer se maquiar todos os dias, aí sim, precisamos puxar a rédea, fazer combinações, explicar e colocar limites”. Jaqueline Antunes Palma Camara, professora, mãe de uma menina de sete anos
"Criança maquiada igual a adulto? Não. Agora criança fazendo bagunça com maquiagem acho uma graça! Quem nunca pegou o batom da mãe e fez uma festa? E acho legal ter linha para crianças, é bem melhor do que deixá-las brincarem com as nossas, que não são feitas para a pele delas. Que bom que existem essas opções, e aí basta ter bom senso na hora de deixar a criança usar”. Nat Welter, administradora do perfil @surtadanamaternidade, mãe de uma menina de dois anos