Caso você depare com o perfil @eucrispaz no Instagram, com as mesmas fotos e postagens de @eucrisguerra, não se assuste: ambas as contas são da escritora e empreendedora digital mineira. Ela anunciou, no início deste mês, a transformação de seu sobrenome na mídia — e que marca uma nova fase.
— Não é uma negação, é uma evolução — explica Cris, em entrevista por telefone dias antes de sua vinda a Porto Alegre para conduzir a palestra No Meio da Pedra Tinha um Caminho, na terça-feira (31), em evento com apresentação do Grupo de Atendimento de Veículos (Gavrs) para convidados e patrocínio do Grupo RBS.
Aos 51 anos, a empresária prepara-se para compartilhar com o público gaúcho seus mais recentes aprendizados após dois blogs, oito livros, podcast e colunas em revista e rádio.
— Será um momento de dar uma animada após tempos difíceis, mais motivacional e, graças a Deus, presencial, chamando as pessoas à reflexão, a se identificarem, somos todos tão parecidos no final das contas... — pondera.
Na ocasião também serão abordados temas elaborados em seu oitavo e mais recente livro, Fundo do Poço, o Lugar Mais Visitado do Mundo (Editora Melhoramentos, 256 páginas).
Aqui você confere a entrevista com Cris sobre longevidade, valores pessoais, sua relação com a moda, causas sociais e maternidade.
Como foi o processo de transformação do seu nome?
A mudança tem a ver com a numerologia mas também com vários questionamentos que já me fazia sobre o uso do “Guerra”, apesar de gostar muito. O Pàz acompanha minhas mudanças internas, é mais coerente nesse atual momento. Na psicanálise, já vinha trabalhando também. Estava acostumada a ser chamada de "guerreira" no dia a dia, e pensava “legal, mas estou cansada da guerra” (risos).
Teve influência da atual guerra Rússia x Ucrânia?
Na verdade, a gente está vivendo momentos de guerra desde antes da pandemia. Parece que estamos em um filme. Então pensei: "não quero ser mais guerra no mundo!". Mas o que impulsionou mesmo foi a vontade de fazer um trabalho junto à numerologia. Conheci a numeróloga Nanda Pérèt no lançamento do meu livro e encomendei o estudo com ela, no segmento cabalístico, que é bem místico. Depois que entendemos nossas missões e encaramos o que viemos fazer aqui (nesse mundo), às vezes é possível fazer alguma mudança no nome para suavizar a caminhada, se necessário. A sugestão inicial foi não usar mais o Guerra e aderir ao meu outro sobrenome “Souza”, mas achei muito estranho. Foi então que meu namorado (Alexandre) sugeriu que fosse feito o estudo com o nome “Paz” e deu supercerto, incluindo ainda a crase no a.
Qual o significado da crase no 'Pàz'?
Não é um disfarce, nem troca, nem negação, é evolução. E o que vem depois da guerra, se Deus quiser, é paz.
CRIS PÀZ
Escritora, publicitária e empreendedora digital
Na numerologia os acentos têm valor numérico. Para a conta dar certinha, você acrescenta um acento ou uma crase. Achei muito charmoso. Desde 4 de maio comuniquei. É claro que muita gente vai rir, achar que é brincadeira. Muitos me perguntam o que farei com tudo que está ranqueado no Google como "Guerra”. A história vai toda comigo. No começo vai ser um pouco difícil, vou ter que explicar para todos que Cris Pàz é uma evolução de Cris Guerra. Não é um disfarce, nem troca, nem negação, é evolução. E o que vem depois da guerra, se Deus quiser, é paz.
No Instagram você ainda está como @eucrisguerra...
Estou em processo junto ao Instagram para fazer a alteração, mas leva tempo. Por enquanto estou nos dois perfis com os mesmos conteúdos: @eucrispaz e @eucrisguerra.
O que a família achou da mudança?
Não sei, não perguntei, estou com medo de saber (risos). Mas estou muito feliz, muita gente já me disse que o Pàz tem muito mais a ver comigo. O significado é a busca de paz interna, de fazer parte dos valores que trago hoje — e que farão parte da palestra — sobre longevidade e etarismo. Acho que aos 50, 51 anos, assumimos uma outra relação com o tempo. A paz, a calma são coisas que passamos a almejar mesmo, como objeto de desejo.
E qual seu sonho hoje?
Quero ter tempo para ler todos os meus livros e não ter que trabalhar tanto. Ainda estou muito longe disso mas um dia chego lá. Hoje me sustento com palestras, conteúdos e livros — é claro, não sou uma Martha Medeiros, né (risos).
Com uma carreira multidisciplinar, qual você considera ser o fio condutor para o seu êxito em tantas áreas diversas?
É engraçado porque a gente vai contando nossa história várias vezes e, mesmo assim, olhamos para trás e percebemos que ainda não tínhamos visto algo. Sou publicitária e estudei história dos meios de comunicação de massa, hoje são muito mais nichadas. Então exercitei a criação de mensagens que chegassem a muitas pessoas. Sempre que precisava criar campanha, texto, roteiro, sempre pensava em ser acessível, sintético. Sou na comunicação alguém que tenta fazer pontes com humor e delicadeza. Há um outro lado também que é contar minha história abertamente. Isso sempre algo muito meu, não tenho muito pudor. Sou absolutamente sincera.
Você é engajada com diversas causas importantes, entre elas a ambiental e o combate ao etarismo.
A causa ambiental é muito urgente. Não adianta lutarmos contra o racismo, o etarismo e tantas causas se não preservarmos nossa existência. Atualmente estou falando mais sobre a Serra do Curral, em Minas Gerais. Já foi ocupada por mineradoras mas tem um novo projeto que envolve várias questões criminosas e com consequências muito sérias. Sempre tive consciência, mas quando está mais perto de nós, a gente se sensibiliza ainda mais. A situação brasileira e o aumento de violência, o racismo, tudo isso assusta muito. São tempos em que as pessoas parecem ter autorização para serem irracionais. Tudo o que fazemos tem consequência.
O que mais move você hoje?
Acho que resumindo em uma palavra é o "coletivo". Algumas pessoas não veem o coletivo, se isolam e acham que vão poder viver assim. Precisamos construir pontes e não muros. A solução, talvez, seja buscar uma comunicação em que a gente possa se ouvir mais. Percebo isso no meu público. Desde que viralizou um vídeo que fiz direcionado ao Porchat, respondendo sobre uma questão de etarismo abordada no Porta dos Fundos, que não foi legal, percebi que já conversava com públicos diversos. Creio que isso se deva ao fato de não falar nos rótulos a exemplo de patriarcado, feminismo. Quero estabelecer diálogos sem rótulos panfletários, pois eles dificultam.
Me vejo muito mais coerente com o que penso, sou mais consciente politicamente, mais engajada, é um caminho sem volta. Quando o olhar feminista acorda, nunca mais você dorme!
CRIS PÀZ
Escritora e empreendedora digital
Você trabalha o tema longevidade em seus conteúdos e palestras. Qual é a mensagem para as mulheres 50+ neste atual universo de mais liberdade e possibilidades?
Gosto de dizer que nem toda mulher de 50+ briga com o tempo, algumas estão justamente fazendo as pazes com ele. Acho que, ao menos na minha experiência pessoal, envelhecimento traz muitas questões, medos, desvantagens. Não é questão de dourar a pílula, mas somos mais seguras e podemos olhar para o nosso tempo de uma forma muito mais generosa. A primeira coisa a dizer para as mulheres é: não viramos E.Ts, não deixamos de ser quem somos, tem coisas que só vem com o tempo.
Quando jovem, era muito imediatista, ansiosa. Hoje tenho outras ansiedades, mas não de fazer o tempo passar, ao contrário. Muitas mulheres de 60 anos me dizem que “só fica melhor”.
É a tal “curva da felicidade”?
Existe esse estudo sobre a “curva da felicidade”, que indica índices em vários lugares do mundo e que Mirian Goldenberg (antropóloga, autora de Por que os Homens Preferem as Mulheres Mais Velhas?) confirmou esse estudo nas mulheres. Você começa a vida no auge da felicidade, e o nível vai caindo até os 45, forma uma curva em “U” (ou o que seria o “fundo do poço”) e depois vai subindo de novo. Isso explica por que mulheres (e também homens) vão ficando mais felizes. A vida vai ficando com mais sentido, cada uma com um foco: algumas se dedicam a uma causa, outras ao neto. Acho que temos esse poder de bruxa (que a Rita Lee fala).
Como é a sua relação com a moda hoje, visto que foi pioneira em lançar o ‘look do dia’?
A idade também vai trazendo amadurecimento para essa área. Para mim a moda sempre foi, assim como a escrita, um instrumento de autoestima, identidade, terapia e expressão — não exatamente sou a pessoa que estuda e sabe todas as últimas tendências. Quando comecei a fazer look do dia, em 2007, já vinha de uma época em que tinha sido consumidora compulsiva. Hoje é outro momento, de mais consciência. A partir de 2007 passei a curar esse lado meu, ver que não era por aí.
É um processo de autoconhecimento...
De 10 anos pra cá, de cinco, mais especificamente, acho que por me conhecer mais, conhecer meu corpo, saber quem sou, perdi essa “gula” toda. A gente sabe o que cai melhor, passei a usar mais cores depois que deixei o cabelo branco (minha cabeleireira é visagista e me orientou a usar). Era muito do preto. Meu armário hoje ainda tem muita coisa, não cheguei no minimalismo, mas consumo muito menos, mesmo. Acho que em tempos difíceis para todos, como os de hoje, não tem sentido. Me vejo muito mais coerente com o que penso, sou mais consciente politicamente, mais engajada, é um caminho sem volta. Quando o olhar feminista acorda, nunca mais você dorme! (risos)
Alguma razão pontual lhe despertou?
Depois dos 40 anos voltei a estar mais ligada ao ambiente. Enquanto atuei em meus primeiros blogs (Para Francisco e, em 2008, o primeiro blog de looks diários do Brasil, o Hoje Vou Assim) estava ainda elaborando a perda do meu marido (durante a gravidez do filho, Francisco). Hoje sou mais segura. Não que esteja tudo resolvido, tenho um filho adolescente, mas de cinco anos pra cá, houve uma explosão de saber quem sou, o que quero, dos valores nos quais acredito, da responsabilidade que tenho como consumidora e comunicadora. Tudo isso chega pra ficar, não vai embora.
E como é ser mãe de adolescente hoje?
É difícil demais, viu? Tive a primeira grande briga com Francisco nesta semana. Fui ao fundo do poço. Para você ter ideia cheguei a dizer "quero morrer" de tão ruim que foi o sentimento. Sabemos que na adolescência há a necessidade da ruptura, mas ela pode ser da forma mais dura. O adolescente vai se contrapor, vai focar nas diferenças, a linguagem muda e a comunicação fica mais difícil. Temos momentos excelentes, mas aos 15 anos ele já tem seus compromissos, é sempre uma oposição. É assim mesmo, mas dói. É um abandono, não quer saber da mãe. Não é simples, por mais que a gente saiba que é uma fase, vai explicar isso pro coração!
E o cabelo branco, fez parte da última transformação?
Foi em setembro 2019, quando comecei a falar sobre longevidade. Não achava, de jeito nenhum, que um dia fosse deixar branco. Na época fazia um podcast sobre longevidade com outras mulheres e um dia fiquei curiosa pra saber como seria o meu cabelo naturalmente branco. Tinha medo, mas minha cabeleireira me incentivou. Fiquei como uma adolescente, esperando o cabelo natural crescer (risos). Hoje até vem uma vontade de pintar, mas logo passa. Acho que o branco suavizou minha fisionomia.
Você se vê hoje mais como influencer ou empresária?
Trabalho com influência digital, é uma das minhas funções, mas me considero muito diferente do estereótipo do influencer. Digamos que sou uma “influenciadora raiz”. Sou empresária, tenho meu podcast 50 Crises (disponível no Spotify), que é sobre as várias mulheres que sou. Nunca me senti tão múltipla. A longevidade é uma potência, estamos com olhos mais abertos, e a neurociência indica que o auge da nossa capacidade cerebral é aos 50 e 60 anos. Acho que faço coisas demais e diferentes entre si. Tenho coluna em rádio e revista, faço minhas palestras. O influencer é como uma agência de publicidade e uma produtora em si, é exaustivo. Conto com uma pequena equipe remota, mas no dia a dia sou eu com minha escada e as ring lights. Mas não abro mão de ser empreendedora, são muitas possibilidades de novos projetos criativos.