“Você está onde sua mente está” é a frase que abre a descrição de Aline Midlej em seu perfil no Instagram. Viver em meio a um turbilhão de notícias faz parte da rotina da apresentadora do Jornal das Dez, da GloboNews. Para não se perder em informações por todos os lados constantemente e manter o foco no momento presente, a jornalista de 38 anos encontrou na respiração consciente uma de suas grandes aliadas.
— Respiro fundo, sinto minha presença até minha voz fica melhor. É quase um reequilíbrio das energias ali, porque é tanta informação, é tanto sentimento que vem durante a apresentação. Sou jornalista, sou formadora de opinião, tenho total noção do meu papel ali, mas sou uma pessoa, dentro e fora do estúdio — reflete.
Por trás da plenitude diante das câmeras tem terapia, ioga, meditação e contato direto com a natureza, revela Aline, que trocou São Paulo pelo Rio de Janeiro há poucos anos. Natural de São Luís, no Maranhão, a jornalista passou a maior parte da vida na capital paulista e hoje celebra cada dia em que amanhece de frente para o mar e ao lado do marido, o diretor de TV Rodrigo Cebrian, do programa Que Mundo É Esse?, da GloboNews, com quem está há três anos. Tanto é que o casal tem uma cama no meio da sala do apartamento junto à Praia da Macumba, na zona oeste do Rio, para acordar mirando as ondas.
— Ele botou essa cama lá exatamente para que a gente tivesse essa experiência ao acordar, para que isso nos levasse para um despertar mais tranquilo, mais consciente, de agradecimento, que nos estimulasse a olhar para o mar, olhar um para o outro quando acordar e não para o celular — contou a jornalista em entrevista por telefone à Donna.
Desconectar-se, aliás, é um dos desafios de Aline, já que as notícias fazem parte também de seus momentos de lazer: um de seus hobbies favoritos é ler jornal impresso à beira-mar nos dias de folga. Contudo, a apresentadora diz que tem aprendido a aproveitar o descanso sem culpa, relaxar de verdade para manter acesa sua grande paixão, que é informar e contar histórias.
— Isso é libertador. Quando volto do descanso para trabalhar, volto mais leve, mais presente no que estou fazendo — diz.
Aline soma vários prêmios na profissão, entre eles o prestigiado Vladimir Herzog, em 2007, com uma série de reportagens sobre mulheres que transformam a vida de outras mulheres, e o Prêmio Esso, em 2010, com uma matéria sobre médicos que atuavam em áreas remotas da Amazônia. Hoje, também apresenta o Jornal Nacional, da TV Globo, nos rodízios de final de semana.
— A cada plantão que faço, tenho essa certeza de que saio uma jornalista melhor — comemora.
Em tudo o que sou, carrego e faço hoje levo comigo mulheres que vieram muito antes da minha chegada. E quando levo comigo estou também abrindo caminho para outras
ALINE MIDLEJ
jornalista
Aline sabe a força e a potência que tem como âncora de um dos principais telejornais do país e usa esse espaço para fazer um jornalismo com mais empatia. Sua essência transparece a cada história que apresenta. A jornalista também faz questão de exaltar suas origens, o que expressa em hábitos como a escolha de vestir roupas brancas às sextas, uma referência à Oxalá, um dos orixás mais importantes do candomblé, mas que considera, principalmente, uma posição em relação a quem é e ao que representa como mulher negra e nordestina em destaque em rede nacional.
— Em tudo o que sou, carrego e faço hoje levo comigo mulheres que vieram muito antes da minha chegada. E quando levo comigo estou também abrindo caminho para outras — afirma a apresentadora.
A seguir, em um papo leve e descontraído, Aline fala sobre carreira, os seus cuidados com a mente e o corpo, estilo, a rotina ao lado do marido e revela qual é a notícia que sonha um dia poder apresentar.
Como você percebe a força de estar à frente de telejornais tão importantes no país? Você se sente realizada?
Acima de tudo, é uma realização como jornalista, de poder viver esse momento da minha carreira ancorando o principal jornal da GloboNews, que se tornou um ponto de encontro em que as pessoas ligam a TV para entender o que foi aquele dia. Ser a voz e a imagem disso me honra muito. Sou muito grata, tenho a dimensão do que é estar ali, da responsabilidade e de tudo o que represento.
Você costuma desejar “força e saúde” no início da apresentação. É um jeito de ficar mais próxima do público?
O exercício jornalístico já pressupõe um olhar humano para o outro e para o que está acontecendo. Consegui amadurecer um estilo que me acompanha desde sempre na minha carreira. O contexto dramático e incerto da pandemia possibilitou que eu exercitasse isso de um jeito mais intenso, conseguindo aprimorar o que acredito que é o jornalismo, que fala com as pessoas, que sente, que se coloca no lugar de quem vai ser impactado por aquela informação e sempre tentando mostrar como há sempre uma intersecção dos acontecimentos. Tudo o que a gente noticia se conecta com interesses que também são nossos, ainda que numa realidade diferente.
Como você vê a presença de mais mulheres negras nas bancadas, na reportagem, nos jornais? Demorou para isso ocorrer?
Ainda está demorando, é um processo. Quando penso em 16 anos atrás, quando comecei, era muito menor o número de pessoas, jornalistas, apresentadores, produtores, nos bastidores e de frente para as câmeras. Eu tinha poucas referências. Hoje, pensando numa matemática mais simples, acho que já dá para encher mais de duas mãos. A representatividade não é só plástica, ela é cultural, tem que passar pelo conteúdo. Ser parte desse processo é algo importante para mim, é também representar essa mudança e entender o papel que tenho como referência. É um peso bom, que me alegra, que me traz mais consciência para executar o meu trabalho com primor.
A representatividade não é só plástica, ela é cultural, tem que passar pelo conteúdo. Ser parte desse processo é algo importante para mim, é também representar essa mudança
ALINE MIDLEJ
jornalista
Existe a crença da rivalidade feminina, mas parece é que há uma grande amizade entre as jornalistas da GloboNews. Como é a relação de vocês nos bastidores?
Trabalhar na GloboNews é uma delícia, pela convivência e pela sororidade. A gente foi criada numa sociedade que ainda é muito machista. Então, naturalmente, os efeitos evidentes do machismo passam essa ideia de que tem que rivalizar com a outra e que para receber um elogio tem que detonar a outra. Cresci sendo alimentada por essa rivalidade, desconstruir isso é um processo. A GloboNews é uma ilha dentro disso, é um canal que está à frente do seu tempo e a sororidade também faz parte desse pacote. A gente se dispôs a essa parceria, de levantar a moral uma da outra. É mais legal conviver assim, é muito mais interessante para quem está assistindo ver um ambiente afetivo real. O jornalismo ganha com isso. Mas não vou romantizar e falar que é tudo lindo. Ter sororidade, ter uma parceria real no universo feminino exige atenção, cuidado, reflexão.
Como é a sua rotina de autocuidado para se manter plena em frente às câmeras?
Terapia, sou uma grande entusiasta da terapia, faço há muitos anos, semanalmente, e acho que o autoconhecimento é você conseguir promover o seu melhor com você mesma e com o mundo. Quem se conhece se torna uma pessoa melhor para si e para o outro. Somado a isso, pratico ioga há muitos anos, isso me ajuda bastante. A meditação também me acompanha, é muito transformadora para mim, mas ainda não consegui ter aquela prática meditativa intensa, aí criei um hábito meu, que é da respiração ativa e atenta, consciente. Pode ser revolucionário para o seu estado mental e para o corpo também.
Você é referência para muitas pessoas. Isso influencia também na sua escolha de looks e penteados?
Sou ligada à moda, tenho muito cuidado com as minhas roupas, acessórios, sapatos. A moda é muito potente e acho que comunica muito. Por ser uma mulher negra, acho importante a comunicação do que sou ali (na TV), de poder usar o meu cabelo como quiser. Crespo, como ele é, é a minha marca, mas também uso coque, mais liso, fechado, com coque alto de bailarina, que fica lindo, e também uso dividido no meio. A gente não pode aparecer mais do que a notícia, mas acho importante essa coisa da estética e sei que as minhas roupas comunicam. Gosto de cuidar do meu corpo, estar bem vestida, estar bonita.
Por ser uma mulher negra, acho importante a comunicação do que sou ali (na TV), de poder usar o meu cabelo como quiser
ALINE MIDLEJ
jornalista
Você veste roupa branca toda sexta-feira. Como é a sua relação com a fé?
Sou uma pessoa muito espiritualizada. Usar branco às sextas-feiras tem uma relação direta com a minha ancestralidade. É uma referência a Oxalá, obviamente, na prática do candomblé, mas é principalmente uma posição em relação ao que sou, ao que represento e ao que carrego. Tem muito da energia, do respeito, de uma mensagem de tolerância, que a gente tem que ter principalmente com as religiões de matriz africana. Vestir branco é uma mensagem de paz, de amor, de afeto, é um posicionamento. O (escritor João) Guimarães Rosa sempre falava que o que a vida pede da gente é coragem. Peço licença a ele para dizer que o que a vida pede da gente é posicionamento. A gente tem que se posicionar diante das coisas, com todos os bônus e ônus que isso traz.
Você contou em entrevista recente que se apaixonou pelo seu marido no ar, durante uma transmissão. Como isso aconteceu?
Rodrigo foi um ponto fora da curva total. O que a gente faz no ar diariamente é trabalhar e sempre olhando para o outro como um profissional. Obviamente, o que aconteceu ali foi um grande encontro de amor. Rodrigo é a grande história da minha vida, é o meu grande amor, e quis o destino que fosse assim o nosso encontro. No mais, ele é a grande exceção da exceção, e que sorte a minha.
Quando vocês estão juntos, tem muita conversa sobre trabalho?
A gente ama contar história, conversar. O Rodrigo sempre tenta me esperar para jantar e aí a gente conversa e fala do jornal. É um interesse comum que nos aproxima e existe uma admiração intelectual muito grande, que é uma parte importante da relação e da razão desse amor tão grande que nos uniu. Acho fantástico a disposição e a rapidez que ele tem de raciocínio e de inteligência. Somos um casal muito conectado, mas que tem vivido esse desafio de se desconectar com a ajuda da natureza.
Qual a notícia que você sonha em apresentar?
Meu sonho é falar que o Brasil atingiu os melhores índices de educação pública do mundo. Espero muito que possa dar alguma notícia que se aproxime disso.