É temporada de propaganda eleitoral. Mais uma vez, os candidatos se esforçam para ganhar nosso voto através de atributos morais duvidosos, já que precisam negociar com Deus e o Diabo ao mesmo tempo. Difícil peneirar uma pepita de ouro em meio a tanto pedregulho. Por isso, já não levo tão em conta o currículo, e sim o jeito da pessoa.
Vale para todas as relações. Ninguém se apaixona pela inteligência, cultura ou riqueza de alguém – claro que isso empolga e abre cancelas, mas o encantamento verdadeiro vem da subjetividade, não de vantagens concretas. A pessoa se torna especial pelo jeito único que ela tem.
O jeito que te escuta. O jeito que trata desconhecidos. O jeito que lida com adversidades. O jeito que, em meio a um mundaréu de gente, te dá uma piscadela à distância, reforçando a conexão entre vocês. Conexão que é rara na política.
O diferencial de Kamala Harris, por exemplo, não está em seu histórico, mas em seu sorriso: é alguém que gostaríamos de receber em casa. Ela dança. Ela usa terno com tênis. É simpática, mesmo quando calada. Então isso basta??? Ora, ninguém sabe quem dará um bom gestor até que assuma. É apenas um sintoma de humanidade neste universo cada vez mais controlado por robôs e Inteligência Artificial.
Nunca escondi minha decepção com a política como ela quase sempre é: um espaço de manutenção e sucessão de poder, voltado para os objetivos particulares dos partidos, favorecendo o bem público apenas quando este serve de alavanca para se autopromover. Sendo assim, escolho a promessa de familiaridade, em vez da sisudez prolixa. Escolho o charme e a educação, em vez da vulgaridade. Escolho o desembaraço que cativa, em vez da malandragem ensaiada.
Candidatos com jeito de gente ao menos permitem que tentemos adivinhar o que eles sentem. Os autoritários são blindados contra a emoção e os fanfarrões só despertam vergonha alheia. Deveriam abandonar seus discursos retóricos e recuperar o tom de voz que usam ao falar com amigos.
Trocar as poses esdrúxulas em estúdio por imagens de arquivo de sua rotina íntima: a vez que torceram por um neto na arquibancada de um ginásio, a vez que tiraram seus amores para dançar numa festa, a vez que gritaram “bravo” ao final de uma peça de teatro – vivências de quando não estavam em campanha.
Não me dá garantia de nada, mas prefiro quem depende pouco do teleprompter, do ponto eletrônico e da decoreba de um texto escrito por marqueteiros. Quem permite que sua essência e seu espírito transluzam, mesmo arriscando parecer simplório. Quem comove pela espontaneidade e, enquanto os concorrentes grudam os olhos nas pesquisas de intenção de voto, dá uma piscadela para você em meio à multidão.