Estava saindo para ir ao teatro quando entrou um WhatsApp da minha filha que mora na França. “Mãe, está circulando nas redes um vídeo com imagens de Paris sendo bombardeada. Bem realista, mas fake, não te estressa”. Assisti ao vídeo, uma obra-prima da montagem. No final, revelava ser uma peça de propaganda pró-Ucrânia, mas, antes de chegar aos créditos, quem tivesse filhos morando em Paris já teria enfartado.
Ainda sobre a guerra, há quem tenha acusado a modelo ucraniana Marianna Podgurskaya, grávida, de posar sobre uma maca, fingindo ter sido atingida pelo bombardeio russo em uma maternidade (prédio que teria sido convertido em uma base militar). E há quem diga que não houve encenação nenhuma, que ela se feriu realmente, mas está tudo bem, deu à luz uma garotinha saudável dias atrás.
São dois exemplos bobos se comparados aos estragos gigantescos que a desinformação provoca. É ela que nos governa nesses tempos em que tuítes funcionam como mísseis virtuais, alcançando qualquer ponto do planeta. Nunca foi tão fácil viralizar uma mentira, nem tão rápido, nem tão devastador. De filtros fotográficos que alteram a aparência, até a indústria internacional das fake news, ressignificamos McLuhan: o meio é a mensagem, porém desvinculada da verdade, descomprometida com a realidade, vadia e livre para destruir reputações, eleger canalhas e enganar os trouxas.
Quem ganha com isso? Os criminosos organizados e ocultos que automatizam o boato a fim de manipular a opinião pública. Antes que sejam punidos, eles já se valeram da ingenuidade de uns, da ignorância de outros e da preguiça da maioria: quem tem disposição para checar uma notícia, buscar outras fontes, conversar com pessoas que dominam melhor o assunto? É tarefa que consome um tempo que não está sobrando pra ninguém, e assim o comodismo se torna um aliado do mal. Acreditar em tudo ou acreditar em nada nos desorienta da mesma maneira.
Ao eliminarmos a fronteira entre verdade e mentira, liberamos o tráfego para o desvario. Textos circulam com autoria trocada, notícias de sete anos atrás são veiculadas como se fossem atuais, bizarrices ganham status de fato importante e edita-se qualquer declaração, bastando, para isso, um celular. Continuamos brincando de telefone sem fio, quando sussurrávamos no ouvido do coleguinha: “Vou almoçar na casa do Alberto porque é dia de lasanha”, para descobrirmos, às gargalhadas, que a frase original havia se transformado em “A moça tem um casamento aberto com sua tia baranga”.
Hoje vale o que foi mal compreendido e quem não aprova casamento aberto ou se ofende com a palavra baranga abraça uma causa que não existe e assim justifica seu voto. Desvario é pouco.