Qual o segredo de Ricardo Darín? É a pergunta clássica feita aos que atingem uma rara unanimidade. Se há quem o despreze, é por desconhecer seu currículo ou por insolência boba - esnobar alguém que todo mundo gosta é um meio de se diferenciar. Eu sou do time que presta reverência a esse argentino que emenda um filme no outro sem medo de cansar a plateia - em vez de saturada, ela quer mais e mais e mais de Darín, extasiada com sua presença na tela e na vida.
Se você já assistiu a alguma entrevista com ele, sabe que espécie de homem ele é (falo em assistir, e não ler uma entrevista, pois o olhar, a voz e os gestos de um entrevistado traduzem sua alma mais do que palavras impressas).
Temos aí um ponto. Darín não é apenas um grande ator, mas um grande ser humano. E essa junção faz diferença, sim. Sucesso e inteireza se cumprimentam e até dormem junto.
Se você já assistiu a alguma entrevista com ele, sabe que espécie de homem ele é (falo em assistir, e não ler uma entrevista, pois o olhar, a voz e os gestos de um entrevistado traduzem sua alma mais do que palavras impressas). Viralizou um depoimento que ele deu certa vez a um programa de TV em que afirma não ficar tentado a fazer carreira em Hollywood. "Para quê? Para interpretar um narcotraficante mexicano?". Darín não se interessa em promover estereótipos e não objetiva ter mais dinheiro do que tem. "Tomo dois banhos quentes por dia. Tenho uma família fenomenal. Recebo abraços das pessoas na rua. Preciso mais do quê?". O ingênuo entrevistador comete a insensatez de sugerir jatinhos. Darín ri e não comenta, nem precisa. Jatinhos? Hangar, manutenção, combustível, funcionários. Jatinhos garantem um deslocamento fácil, mas e o deslocamento da realidade que vem embutido? Isolar-se não conecta pessoas. Em vez de focar em ter fortuna, que induz ao excesso de consumismo, mil vezes trabalhar menos, voltar pra casa mais cedo e pedir uma pizza. Desculpe aí o provincianismo, sei que pode soar chocante.
Ricardo Darín esbanja integridade e retidão de caráter, e não apenas por interpretar homens de boa índole, como no excelente A Odisseia dos Tontos, que está em cartaz - ele também já adicionou alguns vilões em sua filmografia. Darín é íntegro porque não se vende, não se deslumbra, não cai na esparrela de se comportar como um astro. Tem luz própria suficiente, consciência social, compreende a importância da moralidade e o seu talento dispensa caras e bocas. É másculo e sensível, o combo dos sonhos. Um sujeito confiável, que mantém o ego sob controle. Quantos desse naipe você conhece? O autoendeusamento é não só ridículo, como também entediante: a indústria do entretenimento produz semideuses em série, todos com o rótulo de "inatingível" grudado na testa. Darín poderia ser o vizinho da porta ao lado.
Mas não é, então vá ao cinema, nem que seja pra ter a sensação de que ele entraria no elevador e daria bom dia pra você.