Fui uma menina romântica. Vibrava quando o príncipe surgia no final da história da Branca de Neve e da Bela Adormecida: ufa, basta de perrengue, agora é só subir na garupa do cavalo branco e ser feliz pra sempre, bora.
Mas não demorou para eu descobrir que esse desapego – elas não levavam nem bolsa – era irreal. Um dia, uma colega de aula me convidou para ir à sua casa: sua irmã mais velha iria se casar dali a uma semana e ela queria me mostrar uma coisa. O que seria? Cheguei e fomos direto para o quarto da tal irmã, que não estava. Minha colega abriu a porta bem devagarzinho. Meu coração aos pulos. Foi então que vi.
Ou melhor, não vi. Não vi a cama. Não vi as mesas de cabeceira. Não vi o chão. Estava tudo – tudo! – coberto de presentes, pratarias, cristais. Tum-tum, tum-tum, meu peito batia forte. Parecia a caverna do Ali Babá. Jogos de louça, faqueiros, copos, cálices, vasos, castiçais, bandejas, luminárias, liquidificador, torradeira, aparelho de fondue, baldes de gelo, pratinhos de sobremesa, porta-retratos, jogos americanos, aparelhos de chá, xícaras, cachepôs. Que cavalo branco, o quê. Quem casa precisa é de um bom caminhão de carreto.
Meu romantismo infantil foi ligeiramente corrompido por aquela visão materialista. Amor e uma cabana? Só se a cabana for muito bem equipada. Tudo bem, ainda parecia um conto de fadas. Deveria ser estimulante começar vida nova ganhando tanta coisa, desde o pano de prato até a baixela de prata.
A partir de então, passei a valorizar esse rito de passagem matrimonial, tanto que, quando recebo um convite de casamento, logo me pergunto: em que bazar estará a lista de presentes? Planejo ir até a loja e, diante das opções sugeridas pelo casal, encontrar algo que me permita participar de seu novo cotidiano, seja através da jarra em que eles se servirão de suco pela manhã ou dos cálices em que tomarão seu vinho à noite. Ou dar algo mais original, feito por alguma artesã que eles não conheçam: tigelas pintadas à mão para a salada de frutas ou uma toalha de mesa bordada. Até que alguém me acorda e avisa que parei no tempo, que tudo o que relatei acima virou um documentário de época e que hoje os noivos vivem juntos e já têm casa montada. Lista? No site.
O processo de presentear agora é instantâneo: você abre o computador e encontra um cardápio com fotos de alguns objetos utilitários, ou a proposta de comprar uma cota para as passagens aéreas e os passeios que serão feitos durante a lua de mel. Você escolhe, clica, dá o número do seu cartão de crédito, digita uma mensagem virtual e envia – foi. Os noivos, do outro lado da tela, receberão o quê? O dinheiro equivalente.
Tum-tum, tum-tum, bateria meu coração emocionado, se ainda se emocionasse.