Nova York Londres Uruguai Abu Dhabi
Quem é leitor de Martha Medeiros sabe: tanto quanto a escritora gosta de Woody Allen (ou mais), ela aprecia viajar. Apreciar é pouco. Como você lerá na entrevista a seguir, ela precisa viajar para dar um tempo da domesticidade e da correria da vida e reencontrar a liberdade de ser uma recém- chegada com nenhuma outra obrigação a não ser se deixar levar diante de um lugar novo a desbravar. É esse olhar diante de destinos como Londres, Nova York, Uruguai, México e Miami que Martha compartilha em seu novo livro, Um lugar na janela 2, que ela autografa no dia 5 de novembro, na Feira do Livro de Porto Alegre. Mas não espere um guia de viagens com dicas de onde comer ou se hospedar. Na prática, Martha convida o leitor a experimentar como é viajar com( o) ela: – Não dou dica de nada, só quero dividir o meu espírito de viajante. É quase como uma biografia minha em viagens.
VOCÊ DIZ NO LIVRO QUE “ PESSOAS VIAJAM PELO MUNDO PARA CONHECER MONUMENTOS, COMER, COMPRAR”. E O QUE VOCÊ BUSCA?
Nunca é uma coisa só. A intenção primeira é conhecer tal lugar, o óbvio: “ Quero conhecer o Marrocos, Fernando de Noronha, voltar a Nova York... Mas viajo por tanta coisa: para quebrar a rotina, para determinar antes e depois, se estou muito cansada, se estou em uma batida muito repetitiva... A viagem, mesmo que seja uma semaninha que eu caia fora, é uma quebra para voltar renovada. Viajo porque adoro me sentir uma estranha no lugar onde estou. Aqui, a gente se adequa à rotina e aos hábitos, que a gente nem questiona mais, está no automático. Basta sair dessa condição automatizada em que se vive para entrar em um ambiente com outros costumes. O lance bom de viajar é que tu tens uma liberdade enorme a respeito de ti mesma: pode comer quando tiver fome, dormir quando tiver sono, não dormir, não comer, resolver ir para um lugar, mudar de ideia e ir para outro. Tu és dona das tuas vontades, coisa que, às vezes, no dia a dia, a gente não consegue, está sempre negociando com o trabalho, com a família e tal. Viajo por isso, para matar a saudade da liberdade total.
O QUE UM DESTINO PRECISA TER PARA DESPERTAR SEU INTERESSE? Quase todos os destinos do mundo têm potencial para me atrair, vai depender do momento em que estou, do tempo que tenho para investir, qual a modalidade da viagem... Sou apaixonada por Londres, quando penso em viajar, a primeira coisa em que penso é “ Vou para Londres”. E daí tenho que puxar o freio de mão e dizer: “ Tem outros lugares que tu não conheces”. Há pouco, fui para Nova York meio que para fazer as pazes com a cidade, que nunca me cativou tanto. Gosto de NY, mas acho que é uma cidade com um ego imenso, tudo é muito grande, muito opressivo. Claro que é uma baita cidade, não sou louca de desprezar NY, mas, por exemplo, acho Londres muito mais interessante, tem mais alma. Mas é uma coisa meio subjetiva.
Tenho amigas que estão interessadas em ir para o Sri Lanka, algo que nunca me passou pela cabeça.
Mas, de repente, pode ser uma boa. Tenho que aproveitar que ainda tenho saúde, joelhos para fazer viagens que possam me exigir mais fisicamente – trilhas, essas coisas. Tudo me atrai, vai depender do momento. Não há uma condição, tipo “ para ir a um lugar tem que...”. Tem lugares que não me cativam tanto, como o Canadá, nem sei por quê. Mas, daqui a pouco, alguém me convida e posso mudar tranquilamente de opinião.
VOCÊ DEDICA UM CAPÍTULO A MONTEVIDÉU, DIZENDO QUE NÃO HÁ TANTOS LUGARES A CONHECER, E QUE O LEGAL É ENTRAR NA VIBE.
É quase o oposto de Nova York, uma cidade bem tranquila, mas que tem seu barato justamente por isso.
Cada cidade tem um espírito: NY é o dinamismo, e tem lugares que te convidam a uma desaceleração.
Então, tem que pensar o teu estilo.
ANTES DE VIAJAR VOCÊ PESQUISA EXAUSTIVAMENTE SOBRE O LUGAR OU VAI PELO IMPROVISO? Exaustivamente não faço mais nada na minha vida (risos), mas pesquiso, sim. Antes de ir para Nova York, dei uma pesquisada, fui ver o que abriu de novo no Soho, um restaurante legal para conhecer... Sempre pesquiso, faço uma lista, mas a cidade acaba nos apresentando outras mil opções.
Não devo obediência ao que está na lista.
QUE TIPO DE TURISTA VOCÊ É? Viajo de mochila, sempre levo uma caderneta para anotar e sempre anoto o meu dia. Não é um relato literário nem para ser publicado, mas para mim. Carrego pouca bagagem, gosto de viajar leve. Sou uma pessoa aberta para viajar. Saio com algumas vontades a realizar, mas muito consciente de que vão ficar pelo caminho e ser trocadas por outras vontades: acho que esta é uma condição importante para quem vai sair do seu mundinho organizado. Tem que entender que, dentro dessa pseudo- organização de onde vai dormir, quanto dinheiro vai levar, vai parar em uma desorganização, está saindo para dias muito abertos.
VOCÊ FOTOGRAFA MUITO? Fotografo. Fotograva mais com máquina fotográfica do que hoje com o celular – talvez porque antigamente ainda não tinha viajado tanto... Inclusive ainda imprimo as fotos, tenho álbuns. Adoro álbuns de viagem. Se vou para um lugar mais exótico, como o Japão, algum lugar para onde sei que não vou mais voltar, faço álbum.
VOCÊ DESTACA O QUANTO AS VIAGENS AJUDAM A GENTE A SE CONHECER MELHOR.
O QUE VOCÊ DESCOBRIU SOBRE SI MESMA?
Descobri minha coragem. Fiz minha primeira viagem quando tinha 23 ou 24 anos, um mochilão pela Europa, passei dois meses sozinha. Até encontrei com um namorado depois, mas embarquei sozinha e fiquei os primeiros 40 dias sozinha. E me lembro que fiquei muito surpresa, me descobri muito à vontade com a solidão – a solidão pode ser uma coisa boa – e com o desconhecimento dos dias que eu tinha pela frente. Adorava acordar e não saber onde iria dormir à noite, estava em um país e decidia ir para outro. Antes de fazer aquela viagem, não pensei que fosse desprendida, mas vi que não tinha os medos que pensava que eu tinha. Foi uma grande descoberta, valeu por 30 anos de terapia.
QUE LUGARES MAIS SURPREENDERAM VOCÊ?
O que mais me surpreendeu foi percorrer as estradas do Marrocos, fiquei fascinada: não esperava uma região tão montanhosa, as estradas são muito boas e o cenário é espetacular. Tenho a maior vontade de fazer uma viagem de carro de novo por lá. O México, aqui perto, me encantou muito também: não só a capital, mas o interior do país. Abu Dhabi foi outra surpresa, até porque é um lugar onde jamais iria como destino final – passei um dia lá em uma conexão. Fiquei bem impactada, até porque eu tinha um certo preconceito com os Emirados, aquela coisa meio fake do dinheiro do petróleo, mas é incrível ver a cidade brotar do deserto, um oásis de concreto. Achei muito bacana. Machu Picchu é um cartão- postal universal. Sempre imaginei que não me provocaria grande emoção, mas mesmo já tendo visto aquela imagem um milhão de vezes nas revistas, fiquei emudecida diante da natureza e da grandiosidade de tudo.
VOCÊ EXPERIMENTA OLHAR PORTO ALEGRE COM OLHOS DE TURISTA?
Faço isso constantemente. Sempre que estou andando de carro, em algum bairro onde não vou tanto, pensou como eu, estrangeira, olharia Porto Alegre. Nós estamos passando por um momento complicado, com muita violência e descaso, mas ainda assim acho Porto Alegre bonita, interessante. Pratico esse olhar distanciado. Tem uma frase que repito bastante: “ Eu me sinto mais estrangeira empurrando um carrinho de supermercado do que caminhando com uma mochila nas costas em um país que não conheço”. Tenho um espírito que, às vezes, vai contra a domesticidade da vida – essas coisas triviais com as quais a gente tem que se preocupar todo dia, como pagamento das contas, tomar conta da casa...
Então, me sinto mais eu quando estou longe e livre da rotina.
QUAL SERÁ SEU PRÓXIMO DESTINO?
Aqui pertinho: passar o Ano-Novo no Uruguai. E, ano que vem, África do Sul.
PRETENDE FAZER UM SAFÁRI?
Eu estou a fim! Enquanto ainda tenho essa coragem que tanto propago...(risos)
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UM DESTINO PARA IR...
A DOIS
“Estando apaixonada, pode ser até Cubatão.”
SOZINHA
“As grandes metrópoles: Paris, Londres e Nova York.”
COM AMIGAS
“Algo junto da natureza, para não ficar aquele bando de amigas indo a lojas: um lugar com uma praia deslumbrante, trilhas... Uma grande aventura natureba.”
RECARREGAR ENERGIAS
“ Recarregar as energias em Fernando de Noronha é um luxo.”