Imagine alguém atento aos seus mínimos desejos. Interessado em satisfazer todas as suas vontades, até as que você mal cogitou, mesmo aquelas que não passaram de uma brisa. Não é uma pessoa da família, um namorado ou namorada, muito menos um benfeitor. Nem sequer é alguém, mas algo. O nome é algoritmo.
Algoritmo: na internet, o responsável por processar grandes volumes de informações num curtíssimo espaço de tempo. O instrumento para classificar conteúdos em redes sociais e criar recomendações que são a sua cara.
É justamente aí, nas sugestões personalizadas que oferece sem parar, que o algoritmo vira o chato mor para quem navega pelas redes, ele e os produtos e serviços que você não pode deixar de ter, alugar, reservar, conhecer, comprar.
Pobre de quem olha, meio distraidamente, um anúncio de colchão. A cada duas selfies no Instagram, os tipos mais tecnológicos de colchões serão oferecidos para que suas noites, seu sono e sua coluna nunca mais sejam os mesmos. Pode fazer em três vezes sem juros ou com 5% de desconto no pix.
Passa o anúncio de uma bota lindona e você nem clica, só se detém por alguns segundos. Mas em se tratando de algoritmo, melhor não olhar muito. Em sua próxima incursão ao Instagram você será submetido a todas as botas que certamente compraria, se seu cartão de crédito já não estivesse sangrando.
Até existe a opção “ocultar anúncio”, da qual faço uso dezenas de vezes por dia. Mas adianta alegar que os anúncios estão sendo exibidos com uma frequência desesperadora? Óbvio que não. A tendência tratorada das botas do inverno 2023 continuará sendo postada até você se render. O algoritmo é mais persistente que um matador de aluguel, não desiste até que você morra em mais uma compra. Aproveite, adquirindo nas próximas duas horas 14 minutos e seis segundos, o frete é grátis.
Sem falar em quando você comenta perto do seu celular que adoraria viajar para Porto Seguro. Na próxima vez que entrar no Instagram, pacotes turísticos, biquínis e passeios de banana boat farão fila na sua timeline. Chega a arrepiar. O algoritmo tem parte com o sete peles, só pode.
Submetido à propaganda nas redes, o consumidor chega a ter saudade da velha propaganda na TV. Sou desse tempo e, embora tenha trabalhado por muitos anos em Publicidade, sempre considerei os intervalos da novela perfeitos para se ir ao banheiro ou dar comida para o cachorro. Dá para dizer que o consumidor podia escolher se seria atingido pela propaganda tradicional. Nas redes, não. Os anúncios são enfiados goela abaixo da gente. O preço para ver a vida feliz dos outros custa um sofá, um pingente de coração, um curso de inglês, uma capa de chuva, um anel do prazer, um faqueiro, outra bota, um carimbo, uma panela. Cadastre-se e ganhe 10% de desconto utilizando o cupom SOU10.
Há quem não se incomode, há os irritados que, a despeito dos maus bofes, continuam a navegar por entre pechinchas e queimas de estoque. Fora os golpes, que também são muitos. Quem já comprou e não recebeu bota o dedo aqui.
Seu desejo já foi uma ordem. Agora é um algoritmo.
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O poeta Pedro Gonzaga, que hoje vive em Buenos Aires, acaba de lançar Porto Alegre Blues (Editora Ardoreompo), livro-poema de uma só estrofe. Pedro acompanha a caminhada de um homem desde o seu despertar na madrugada fria do centro até o amanhecer na Rua da Praia.
Já a Christina Dias lançou O Mistério das Histórias Invisíveis (Editora Acesso Popular), infantil que propõe uma reflexão sobre o Hino do Rio Grande. Ilustrações de Wagner Mello. Propaganda passando na sua página, mas dessa vez não é coisa do algoritmo. La garantia soy yo.