Verdade que o presidente por vezes fala demais, mas uma coisa não dá para entender. Cada vez que ele se manifesta sobre os juros abusivos, mercado & jornalistas surtam. Como se fosse aceitável uma taxa de 13,75% ao ano, o que faz do Brasil o país com os maiores juros reais do mundo.
Eu, hein? Para gostar dessa situação, o sujeito só pode estar lucrando com ela, o que não é absolutamente o caso de quem vive do trabalho. Agora, descalabro mesmo são os juros do cartão de crédito. Minha Nossa Senhora do Rotativo, me ajude a nunca pagar o mínimo no cartão, senão nunca mais que a coisa se apruma.
Dados de fevereiro: com uma taxa média de 14,68% ao mês, o juro do cartão chega a 417,43% ao ano. E o Banco Central, sempre ele, já disse ao governo que estabelecer um teto para o crédito rotativo está fora de questão, então é possível que os números continuem para o alto e avante.
A serem mantidas essas taxas, o que seria o quadro menos trágico na atual conjuntura, os juros do rotativo podem virar uma dívida até cinco vezes maior ao final de um ano. Seguem alguns exemplos, mas sugiro sentar e até pegar o tubo de oxigênio antes de ler.
Se você deve R$ 500 no cartão de crédito e não quita, em 12 meses deverá R$ 2.587,15. Digamos que não consiga pagar. Ao final de cinco anos, você deverá R$ 1.854.518,03 para o banco.
Se você deve R$ 1.000,00, em 12 meses vai acumular uma dívida de R$ 5.174,31. Em cinco anos, R$ 3.709.036,07. E se você deve R$ 5.000,00 hoje? Em um ano estará devendo R$ 25.871,54. Em cinco anos, R$ 18.545.180,33.
Os cálculos são de Miguel José Ribeiro de Oliveira, da Associação Nacional de Executivos (ANEFAC), que reúne profissionais de finanças, economia, administração e contabilidade, entre outros. Imagino que de cálculo a turma entende. Os dados foram publicados originalmente na Folha de São Paulo.
O pior é que não é difícil ficar com uma dívida obscena dessas no cartão. Basta usar o rotativo para perder o pé e, na sequência, botar o pescoço na corda.
Os bancos pensaram em uma forma de diminuir o sofrimento – deles, claro. Desde abril de 2017, a dívida do rotativo é automaticamente parcelada após um mês. A própria instituição estabelece o número de prestações que o cliente vai assumir, agora com uma taxa mais baixa. A ideia é humanitária – para os bancos, óbvio: diminuir o risco de calote.
O problema é que o cliente já afundou e não tem condições financeiras para pagar o parcelamento. Que, por sua vez, pode até ter taxas mais baixas, mas que ainda assim são altas demais.
Ou seja, não tem saída.
O que vem a seguir é o bloqueio do cartão, a inclusão do CPF do infeliz nos cadastros de dívida e toda a incomodação subsequente.
Se alguém fizer uma versão 2023 de A Hora do Pesadelo no Brasil, o vilão Freddy Krueger tem que ser substituído pelos juros. É com eles que boa parte da população se debate em tormentos noturnos, isso quando consegue pegar no sono.
Assim como a gente sabe que a mocinha do filme não deveria entrar sozinha em uma casa abandonada, também se sabe que entrar no rotativo é quase um caminho sem volta. Sempre que der, melhor procurar outra alternativa. Na vida real, o final só é feliz para os bancos.
The End.