Eram os anos 1980 e uma piada divertia os yuppies (lembra disso?) e demais espertinhos da época: vá ao teatro, mas não me chame. A frase era uma provocação do jornal Planeta Diário e da revista Casseta Popular, ancestrais do famoso Casseta e Planeta da televisão. O deboche foi feito em cima de uma campanha que tentava convencer os brasileiros a prestigiarem o teatro. Pegou muito mais do que a campanha.
Confesso que eu achava a maior graça na frase infeliz. E concordava com ela - estou falando de idos dos 1980. Vá ao teatro, mas não me chame. Deus me livre EU em um teatro meio caído, meio sem ar-condicionado, meio vazio, meio sem lugar para estacionar, meio com um elenco local. Se não bastasse esse combo, ator gaúcho adora aparecer pelado no palco. Deus me livre disso tudo, prefiro ficar no conforto do meu lar. Bem verdade que a reinauguração do Theatro São Pedro, em 1984, mudou um tanto essa percepção. De repente, graças à dona Eva Sopher, ir ao teatro ficou lindo. E é lindo mesmo, mas talvez precise de uma certa maturidade para se perceber isso. Só pode ser essa a explicação para tantos espectadores mais velhos que, seja qual for a atração, estão presentes em todas as sessões de teatro.
Fica aqui um convite: vá ao teatro. Custa pouco, tem meia entrada e vale muito. Faça como os mais velhos estão fazendo: vá ao teatro, vá. E me chame.
Acabei de comprovar isso em uma peça que esteve em cartaz no Teatro do Centro-Histórico Cultural Santa Casa - lugar que vale muito a pena conhecer. Fato é que o pessoal de mais idade foi maioria nas quatro apresentações da peça. Maioria mesmo, com um M tão maiúsculo como maduro. Atores e produção se perguntavam nos bastidores: será que eles sabem qual é a temática, será que vieram por engano? Até que percebemos que as nossas questões não passavam, pura e simplesmente, de preconceito. Por que diabos as senhoras e os senhores do recinto não iriam gostar de uma comédia sobre um casal de rapazes que se separou e se encontra para uma DR? Pelo retorno que tivemos, gostaram.
Enquanto as aposentadorias ainda sustentam pequenas alegrias, não há calor ou chuva ou frio ou preguiça que impeça os espectadores mais velhos de rumarem para os teatros. Nas peças nacionais que chegam ao São Pedro e nas estreias com jovens artistas daqui. Nas atrações confirmadas, aquelas que vão e vêm com temporadas lotadas. No Porto Verão Alegre e no sempre esperado Porto Alegre Em Cena, que vem aí. Ouso dizer que os espectadores mais velhos são responsáveis por boa parte da renda dos espetáculos. É um achômetro, mas talvez tenha fundamento.
Uma coisa, em especial, é fascinante: as amigas. Podem ser duas, três, um grupo. As amigas, muitas da vida inteira, chegam bem antes e conversam como meninas até a função começar. Riem muito, se divertem. As amigas têm mais pique que muita gente de 30, 40, 50. E depois da peça, algumas ainda emocionadas, não deixam de cumprimentar os atores e a equipe. Eu, se chegar lá, quero as amigas comigo em todas as peças.
Para que mais gente vá ao teatro em um futuro bem próximo, o pessoal tem investido na formação de público. A Santa Casa, por exemplo, convida turmas do EJA para assistir aos espetáculos. O projeto Inclusão em Cena não só leva a criançada ao teatro, como apresenta espetáculos infanto-juvenis em escolas de Porto Alegre. Criar um bom hábito cultural, eis aí algo que pode ajudar na luta contra a ignorância que andamos travando nesses últimos tempos.
As companhias, os atores, os diretores, os técnicos, as equipes, todo mundo está investindo trabalho, dedicação e - quando há - grana para mostrar o melhor nos palcos da cidade. Fica aqui um convite: vá ao teatro. Custa pouco, tem meia entrada e vale muito. Faça como os mais velhos estão fazendo: vá ao teatro, vá. E me chame.
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Dica para, quem sabe, descobrir a Nathalia Timberg e o Francisco Cuoco que estão aí dentro, loucos para atuar. O curso de Comunicação, Expressão e Criatividade da Casa de Teatro começa no dia 21 de abril e vai até 16 de maio. Pode acreditar: não há talento que não se revele com o professor Zé Adão Barbosa. Informações pelo fone (51) 3029-9292