Adoro o livro Como Cozinhar Sua Preguiça, da chef Gabriela Barreto, dona do Chou, restaurante de São Paulo que eu frequentei diversas vezes quando morava naquela cidade. Não nos conhecemos pessoalmente, mas em cada linha de seu livro tem algo muito familiar, muito feminino e muito belo que me identifico.
A começar pela essência da sua cozinha – a Gabriela usa e abusa dos sabores da brasa. E, assim como eu, não está interessada na alta gastronomia ou em gourmetização. Mas na experiência que remete a lembrança de um instante no tempo que ficou marcado pela riqueza do sabor e pela simplicidade do ingrediente e do preparo. Uma comida simples, que vem carregada de memórias e de emoções.
Algo tão singelo como valorizar as memórias, apreciar os cheiros, os silêncios, a luz do dia, as estações, o céu de outono e da primavera da minha infância e, principalmente, dos sabores na companhia dos nossos amigos, compartilhados com quem amamos – para nós, é o verdadeiro motivo que nos reúne em volta de uma mesa. Pura felicidade e regozijo. E isso eu tinha de sobra, também no pátio de casa, onde o churrasco era preparado. O cheiro da lenha, os aromas da carne assando, a incandescência das brasas, as iguarias preparadas com amor trazendo também memórias dos nossos antepassados, uma manhã ensolarada com o frescor do ar perfumado da árvore de laranjeira.
Não à toa que me identifiquei com o universo do churrasco – que chamo de Cozinha da Brasa. Esse jeito de cozinhar, usando o fogo vivo e a brasa incandescente me encantou desde pequena. Entendi que ali existia uma magia que eu precisava conhecer e desvendar, para poder compartilhar.
Acredito profundamente que vem da essência feminina os sabores e a alquimia dos ingredientes se transformando num simples preparo e provocando lembranças ancestrais. Como verdadeiras bruxas e sacerdotisas que dominam e celebram o fogo e o tempo, revelamos sabores tão simples, mas repletos de saberes e deslumbramentos. Simples e descomplicado.
A cozinha da brasa é algo além do churrasco e tem a “liberdade poética” de levar para a brasa os melhores e mais simples ingredientes e transformar em uma experiência inesquecível. Uma coisa é certa, é uma cozinha de intuição, de criação, sem receitas específicas, mas com preparos que requerem um pouco de aprendizagem para tirarmos o melhor proveito do fogo, mas que nos entrega muitas camadas de sabor e prazer.
Por tudo isso é que não é aceitável que o churrasco seja um reduto, geralmente, masculino. Motivo pelo qual não me canso de incentivar e inspirar mais e mais mulheres a protagonizar a Cozinha da Brasa – o churrasco – pois neste lugar, que é ancestral, retomamos a nossa essência livre e poderosa. Você pode não gostar de fazer, mas preste atenção. Um churrasco não é só um churrasco. São camadas de muitas gerações de mulheres que afirmam em alto e bom tom: “Lugar de mulher é onde ela quiser”
Feliz Dia Internacional da Mulher. Que o fogo sempre nos inspire.
Ótimos churrascos, pessoal.