Em 2024, comemoramos os 10 anos do A Churrasqueira, um projeto pioneiro, que começou com cursos de churrasco só para mulheres quando ainda estava no mercado de produção cultural, mas que, imediatamente, tomou conta dos meus sonhos. Entrei com os dois pés nesse propósito. Desde então, venho acompanhando de camarote a evolução do mercado do churrasco, da cadeia produtiva da carne, do campo à mesa, e a mudança no perfil do consumidor.
Tão logo comecei os cursos, tive uma reportagem de 15 minutos na Ana Maria Braga e, em seguida, diversas matérias em revistas nacionais e em programas de gastronomia – algo inédito para algo tão regional. Mas a realidade foi outra. O mercado do churrasco estava começando a ganhar espaço no Sudeste, principalmente em São Paulo, com grandes eventos, como a Churrascada. Este evento – a Churrascada – deu início ao movimento do churrasco como entretenimento em grande escala, trazendo chefs de cozinha consagrados para o fogo vivo da brasa e abrindo espaço para as experiências gastronômicas em outro nível. O churrasco raiz ganha espaço nacional, alinhado ao toque de talentosos chefs, que começam a valorizar a relação das pessoas com o fogo e com os sabores da brasa. Paralelo a isso, na Argentina, surge o trabalho magnifico do chef Francis Mallmann, com seus sete fogos e o destaque para a potência dos ingredientes e das técnicas. Realmente uma abolição de oportunidades.
Toda a cadeia produtiva começa a se mexer. Todos os setores envolvidos na oferta de produtos e de serviços começam a primar pela qualidade e pela experiência do consumidor, fazendo com que o segmento premium – não commodity – iniciasse um caminho crescente de evolução e de distribuição. O churrasco premium começou a ser democratizado.
No campo, pode-se dizer que a evolução genética, o investimento do produtor em qualidade e bem-estar animal já vinha acontecendo e começou a ganhar maior escala. Projetos focados em carne de qualidade começaram a surgir e a se solidificar. E o consumidor apaixonado por carne começa a entender e a diferenciar os produtos, optando mais pela qualidade do que pela quantidade.
De outro lado, ainda no caminho até a mesa, os frigoríficos se especializaram, tanto na sanidade animal, na inspeção, no sistema de cortes e de embalagens, acompanhando de forma fundamental a garantia na qualidade da entrega nos pontos de venda. Sem isso, provavelmente, todo o investimento feito no campo não seria percebido.
Os pontos de venda começam a ganhar outra escala também. A oferta de carnes e de cortes em casas especializadas, a apresentação para o consumidor, o cuidado na manutenção da qualidade dos produtos – que precisa de investimentos em infraestrutura para manter temperaturas e manipulações adequadas –, são percebidos rapidamente. A experiência de compra vai além da gôndola dos supermercados e ganha vitrines em todo o país. O açougueiro começou a ser valorizado, o assador, a assadora, os produtos que giram em torno do churrasco, como temperos, utensílios, aventais, roupas se tornam estilo de vida, com adeptos de norte a sul… do mundo.
O Rio Grande do Sul, onde o churrasco é a gastronomia mais importante, demorou para se dar conta do que estava acontecendo. Para nós, sempre fez parte da cultura alimentar, desde pequenos, mas faltava valorizar e abrir a cabeça para todas as possibilidades. Lembro de viajar pelo Brasil para participar de festivais e encontros de churrasco com profissionais incríveis, de todos os cantos, onde diferentes técnicas e cortes eram valorizados e consumidos. Quando voltava a Porto Alegre, sentia falta da diversidade do nosso.
Mas o que mais ouvia era que se não fosse no espeto não era churrasco gaúcho. Isso me fez alavancar um projeto de um livro, uma expedição pelo Rio Grande do Sul, para mostrar aos próprios gaúchos que existem diversos modos de preparar cortes e carnes dependendo da região e das imigrações daquele local.
Mas tem uma coisa que eu sempre valorizei e sou ativista: a carne gaúcha. Nada como o nosso terroir do Pampa, da Campanha, das nossas raízes. Me sinto privilegiada de, como assadora profissional, nesses 10 anos, oferecer a todos os que sentam em volta da minha churrasqueira um produto que, além da qualidade, tem muitos significados. Assim como essa minha jornada, que tem a importância da representatividade feminina e o olhar de quem sabe de onde vem e para onde vai. Sempre em direção à crosta perfeita.
Parabéns a toda a cadeia produtiva que vem evoluindo e trabalhando para atender um consumidor cada vez mais exigente e expert.
Ótimos churrascos, pessoal