Com mais de cinco décadas de carreira na teledramaturgia brasileira, o ator Tony Ramos, 72 anos, vê com maus olhos quem defende que novelas são produtos audiovisuais de menor valor. Em entrevista à Rádio Gaúcha na manhã deste sábado (5), o ator equiparou telenovelas ao mesmo patamar de séries.
— É insuportável aquela relação blasé contra novela. Séries e minisséries são folhetins, você quer saber o final. A novela Laços de Família já tinha esse folhetim — afirmou o ator.
Tony falou ao programa SuperSábado sobre a reprise da novela Laços de Família, que volta ao ar na Globo nesta segunda-feira (7), no Vale a Pena Ver de Novo (ouça a íntegra abaixo).
Exibida entre 2000 e 2001, a novela de Manoel Carlos e Ricardo Waddington é considerada uma das melhores da teledramaturgia brasileira. Na trama, Tony Ramos é Miguel, um viúvo que cuida dos filhos Ciça (Júlia Feldens) e Paulo (Flávio Silvino) e se envolve com Helena (Vera Fischer).
— Quando você assiste a Breaking Bed, Homeland ou 24 horas, você sempre fará a pergunta: o que vai acontecer no próximo episódio? Tanto que os americanos dizem em cada episódio: aconteceu isso na semana passada. Isso é novela: quem matou quem, quem faz o quê, como terminará. Esse folhetim, que Dostoiévski também escreveu, é uma busca do cotidiano através da ficção. A telenovela brasileira tem essa cumplicidade. Eu faço novela há 56 anos. Os tempos e as reações mudaram, mas as pessoas querem uma história bem contada e criar uma expectativa para o próximo episódio. Laços de Família tem tudo isso — afirma.
Questionado sobre a expectativa da volta de Laços de Família 20 anos após a estreia, Tony confessa que está ansioso pela recepção de um novo público.
— Eu estou, acreditem ou não, com a mesma ansiedade de 20 anos atrás. Que ansiedade é essa, se eu já fiz a obra e ela foi o sucesso que foi? É a ansiedade da releitura. Mas tenho absoluta consciência dessa linda história do grande Manoel Carlos — comentou.
Mergulhar na personagem e levar os hábitos da ficção para casa não são hábito de Tony. Ele separa o trabalho da realidade – fronteiras que faz questão de manter separadas.
— Sinceramente, não há a menor possibilidade de eu colocar no cabide do meu camarim a roupa da personagem e caminhar até meu automóvel levando essa personagem. A única coisa que eu possa levar, com cidade cenográfica e 14 horas de trabalho em um estúdio, é cansaço nas costas, ainda mais trabalhando intelectualmente e decorando textos. Levar dores e alegrias de uma personagem e misturá-las à minha vida pessoal, não há a menor possibilidade. Eu sou um homem de definições claras do que quer para a vida, do que sou e da preservação da minha casa e da minha companheira. Eu vivo para respeitar meu trabalho, começando a me respeitar — comentou.
Tony afirma sentir "alegria" de ter sua longeva carreira artística confundida com a própria história da televisão brasileira.
— Quando entrei para a TV Tupi, de São Paulo, a televisão não tinha feito o baile de debutante, tinha 13 anos. Fiz ficção ao vivo e depois passamos a gravar, mas não podia errar, tinha que voltar do começo da cena. É uma alegria participar desses 70 anos de TV dando um testemunho vivo da importância da TV aberta, que é absolutamente democrática. Algumas historias caem no gosto popular, outras não. Nunca me senti querendo ser exemplo. Cada um é cada um. Não quero ser exemplo, o que eu faço é correr com a vida trabalhando — disse.