Um tema dos mais importantes para a sociedade brasileira rendeu mais de 500 horas de gravações por diferentes Estados. A situação dos presídios dos país é o fio condutor de Retratos do Cárcere, seriado gaúcho que estreia nesta quinta (6) no canal pago Prime Box Brazil, às 20h30min. Os 13 episódios irão ao ar todas as quintas-feiras.
Com produção da Panda Filmes e coprodução da Falange Produções, a série foi vencedora do edital Brasil de Todas as Telas — Fundo Setorial do Audiovisual, promovido pela Ancine e financiado pelo BRDE. A direção é de Tatiana Sager e o roteiro é do jornalista Renato Dornelles, que repetem a dobradinha do premiado documentário Central, exibido nos cinemas em 2017, sobre o Presídio Central de Porto Alegre.
Retratos do Cárcere se aprofunda na questão com o recorte nacional. Com produção ao longo de quatro anos, a equipe apresenta um painel sobre o sistema prisional visitando 20 instituições em quatro Estados: Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
— É (uma realidade) invisível na sociedade porque, em geral, quem é preso no Brasil é pobre, negro e não tem estudo. No próprio Presídio Central, aqui no RS, tem uma ala somente para pessoas com curso superior, que nunca chega a ter mais de 20 presos. É para quem não tem dinheiro e que não é visto como uma pessoa que pode viver dignamente — aponta Tatiana Sager.
No primeiro episódio, por exemplo, o espectador conhece o perfil da população carcerária no país. Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), entre 2007 e 2019, o número de presos saltou de 422,4 mil para 773,1 mil, tornando-se o terceiro maior do mundo, atrás dos Estados Unidos (2,1 milhão) e da China (1,6 milhão).
Livro
A série também aborda o poder das facções que dominam os presídios, as pessoas que são atingidas diretamente pelo sistema carcerário (como mães, esposas e filhos) e os grupos que são discriminados dentro do cárcere, como gays e travestis.
Retratos do Cárcere, a partir do 11º episódio, mostrará caminhos para amenizar o drama, de iniciativas para humanização do tratamento dos presos a regimes de progressão de pena e ao suporte a quem precisa recomeçar a vida após deixar a prisão.
Um ponto iluminado pela série é como a superlotação dos presídios se reflete nas ruas das cidades e ajuda no fortalecimento do crime organizado, que consegue gerir suas atividades mesmo atrás das grades.
— O Estado procura dar uma visão de calmaria nos presídios, não tendo motim, morte, fugas. As pessoas acham que funciona, mas isso não acontece: o crime está mais fortalecido dentro dos presídios – reforça Renato Dornelles, destacando que depoimentos de presos revelam o lucro das diferentes facções com seus negócios.
Além da vista grossa para este importante elemento da cadeia do crime, o poder público de diferentes Estados nem sempre colaborou com a equipe da série nas gravações. Dornelles recorda que, em mais de uma vez, a equipe foi parada por viaturas após saírem de presídios, com policiais realizando revistas e pedindo que as imagens fossem apagadas.
— Uma vez, vieram três carros com sirenes ligadas e nos fizeram revista em um paredão, como se fôssemos uma quadrilha mesmo. Mas, após muita explicação, conseguimos sair com tudo em mãos — lembra Dornelles.
— O mais inusitado é que nenhum preso, ninguém de dentro das prisões nos atrapalhou, todos ajudaram com depoimentos. E olha que falamos com líderes de facção (risos) —destaca Tatiana.
Além da possibilidade de uma segunda temporada, Dornelles prepara o livro Relatos do Cárcere, com os depoimentos coletados. Nos próximos meses, a expectativa é iniciar a produção de uma nova série, sobre travestis presas.