Nadia lava o seu rosto no banheiro e entra na sala, na casa que recebe a sua festa de 36 anos. Uma amiga oferece um trago, e ela acaba saindo da comemoração horas depois acompanhada. Engenheira de software, a mulher dispensa a companhia algum tempo depois e sai de casa para comprar cigarros, enquanto se preocupa com o sumiço de seu gato Meow. E quando menos espera, é atropelada. O acidente é fatal.
Na cena seguinte, Nadia volta para o mesmo banheiro. O loop se repete com mortes bizarras e este é o mote de Boneca Russa, seriado que estreou no início deste mês na Netflix. Estrelada por Natasha Lyonne, indicada ao Emmy por sua atuação em Orange Is The New Black, a série se alimenta de um roteiro já conhecido em filmes como Feitiço do Tempo (clássico de 1993 estrelado por Bill Murray) e A Morte Te Dá Parabéns (2017). A diferença é que a temática ganha ares mais reflexivos desta vez.
O fio condutor da trama - descobrir o motivo deste looping fatal estar acontecendo - ganha força com a atuação de Lyonne. Engraçada e muito expressiva, Nadia transforma a experiência mórbida em bons tons de comédia. É possível perceber o quanto ela não consegue acreditar no que está vivendo.
O título do programa faz jus às bonecas tradicionais do país asiático. A cada morte que sofre, Nadia vê um pedaço da sua alma se partindo em duas peças - como os objetos de decoração russos. Ela pega essas duas partes e tenta ligar os pontos. Por ser engenheira de software, trata tudo como um verdadeiro bug no sistema chamado de vida e começa a caçar cada detalhe a fim de corrigir o fluxo da sua rotina.
Reviravolta
O roteiro, que é assinado pela própria protagonista em parceria com Amy Poehler (de Parks and Recreation) e Leslye Headland, fica mais complexo com a aparição de Alan (Charlie Barnett), que está vivendo o mesmo tipo de looping e tenta encontrar o motivo para ficar preso no tempo. Muito metódico, o homem chega a causar agonia ao espectador por seu excesso de padrões, mas sua personalidade consegue se desenvolver bem ao lado de Nadia no enredo. É o tipo de parceria improvável que acaba dando certo por forças maiores.
Boneca Russa é uma das primeiras séries imperdíveis deste começo de ano na plataforma de streaming. Em seu desfecho, a reflexão sobre a importância de viver ganha atenção especial, mas outros elementos configuram a possibilidade de uma segunda temporada. Bem aceita no Exterior - o site especializado Rotten Tomatoes registrou 100% de aceitação da crítica -, é provável que os loopings de vida e morte estejam só começando.