A comemoração do 20 de Setembro deste ano vai ter churrasco, mate, bombacha e lida no campo. Se não for na vida real, será no mundo virtual. Isto porque a Epopeia Games está planejando o lançamento do jogo Gaucho and the Grassland (Gaúcho e o Campo, em tradução livre) na Steam (plataforma de distribuição de jogos para computadores) e, com o título, a cultura do Rio Grande do Sul chega a galope para prosear com a comunidade gamer. O preço para o mercado nacional será de R$ 60. Para fora, o valor cobrado será US$ 20.
A história do game acompanha um gaúcho — é claro — que, cansado da vida na cidade, na década de 1920, decide voltar para o pago onde cresceu. Por lá, ele precisa reconstruir o lugar, mas percebe que tudo está diferente e que agora, seres folclóricos habitam a mesma região que os seres humanos. Assim, o objetivo do jogador é fazer com que os dois mundos convivam em harmonia.
Desta forma, o jogador, além da experiência no formato farm simulator (simulador de fazenda), ainda encontrará em sua jornada digital entidades místicas como Boitatá, Negrinho do Pastoreio e Salamanca do Jarau, bem como a lenda da erva-mate e outros contos, tendo como inspiração o autor pelotense Simões Lopes Neto (1865-1916). Tudo isso, enquanto os dois mundos paralelos colidem, fazendo o gaúcho transitar entre realidades. É uma vibe meio Stranger Things — ou Tchêngs, como preferir.
A ideia do game nasceu em 2017 com o CEO da Epopeia, Ivan Sendin, 35 anos, juntamente com outros sócios da empresa, pensando em como seria interessante jogos que explorassem a cultura brasileira — e em especial, a gaúcha. Depois de desenvolverem as suas capacidades com outros títulos, em 2020, eles decidiram apostar na criação de Gaucho and the Grassland, que inicialmente se chamaria Pago — Um Jogo Sobre o Reencontro do Gaúcho Com Sua Querência, mas acabou ganhando um nome mais universal.
Isso foi um acerto, visto que o resultado apareceu antes mesmo do lançamento oficial. Na wishlist — ou seja, lista de desejos — da Steam, 18 mil pessoas já demonstraram interesse pelo jogo, sendo que metade delas não é do Brasil, mas de países como Estados Unidos, Alemanha e Vietnã. A ideia é que o game esteja disponível em 28 idiomas até a data de lançamento.
— Acho que a gente está abrindo portas que não foram abertas antes e virando referência para outras empresas nacionais produzirem jogos com qualidade para, aos poucos, a gente ir se inserindo dentro do mercado internacional. Cada lançamento vai ajudando a colocar um degrau até a nossa cultura brasileira ser, de fato, popular lá fora — acredita Sendin, que é formado no curso de jogos digitais da Feevale.
Bah!
Recheado de expressões gaudérias, como "buenas, tchê", "zero bala", "esse é o meu Rio Grande, tchê", "mas é bom esse chima, tchê", "buenas e me espalho" e "mas que cagaço", o jogo, segundo Sendin, é visto pelo público de fora do país com entusiasmo. Mesmo que os gringos não entendam o gauchês, os retornos estão sendo positivos de quem já viu o trailer ou prestigiou a demo.
— A ideia de botar esse linguajar foi para divertir as pessoas. Na minha visão, para o mercado internacional, passava a sensação que nem Minions. O cara não entende o que o personagem está dizendo, mas é divertido a forma como ele está falando. O mercado internacional gerou essa percepção sobre nós. Eu estava falando justamente com um alemão que me disse: "Eu não sei o que esse cara fala, mas está muito engraçado"— conta o CEO da Epopeia.
Apesar desta pegada mais cômica, o trabalho de vozes é bem sério. Quem está cuidando desta parte do game é a Radioativa, empresa gaúcha de produção de áudio que já cumpriu a mesma função em jogos de grande renome mundial, como Diablo IV (2023). Ou seja, todas as vozes ouvidas no game são, de fato, de pessoas do Estado.
Baita negócio
O primeiro incentivo para tirar do papel Gaucho and the Grassland veio em 2020, quando os criadores receberam R$ 100 mil do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) do governo estadual, por meio de um edital que selecionou projetos destinados "a movimentar a produção cultural do Estado". A partir de então, o game virou prioridade dentro da Epopeia, que hoje conta com 14 profissionais — sendo 12 gaúchos. Depois, a empresa investiu mais de R$ 500 mil e, no total, o orçamento do projeto deve ultrapassar os R$ 600 mil.
O investimento parece ter sido seguro, visto que Sendin espera que os custos se paguem ainda na primeira semana de vendas do jogo e, depois disso, ele já comece a dar lucro. O acerto vem da carona que o título pega nos sucessos de Animal Crossing e Stardew Valley, mas com o diferencial da temática gaúcha, que se "encaixou como uma luva" no formato.
As atividades no jogo vão de laçar bois, passando por cuidar de vacas até cultivar erva-mate. Como não há dinheiro, o protagonista terá de praticar a velha arte do escambo, trocando animais por um terreno, por exemplo. Para construir estruturas de madeira, o gaúcho derrubará araucárias da floresta e contará com ajudantes: um cavalo, o Alazão, e um cachorro, o Cusco. E eles são personalizáveis, bem como os protagonistas — o Gaúcho e a Gaúcha.
A história principal do jogo deve demorar entre oito e 10 horas para ser concluída, mas a expectativa é que DLCs (downloadable contents, ou seja, conteúdos extras) sejam disponibilizados depois do lançamento do título. O jogo deve ser lançado na Steam para computadores e, até o final do ano, o game chegará ao Nintendo Switch. No primeiro semestre de 2024, Gaucho and the Grassland deve pintar nas versões mais recentes de Xbox e Playstation. Não vão faltar opções para poder jogar o título, mas, até lá, o jeito é ir preparando o mate enquanto aguarda a aventura começar.