Cria da zona norte de Porto Alegre, mais especificamente do bairro Sarandi, Marcito Castro vem, cada vez mais, popularizando o seu conteúdo pela internet e pelos palcos de comédia. Em suas apresentações, o humorista detalha o dia a dia na periferia, mesclando o sentimento de nostalgia do cotidiano de quem cresceu nos anos 1980 e 1990 com os perrengues de quem vive com pouco dinheiro no bolso, mas não deixa de se divertir.
Aos 39 anos, Marcito conta que a comédia o acompanha desde piá, quando fazia piada de qualquer situação que vivia. Esse bom humor para lidar com os acontecimentos cresceu com ele e, após se formar em História, passou a integrar as aulas de Marcito após ele se tornar professor, fosse nas escolas ou nos cursinhos pré-vestibulares. E o alívio cômico aparecia para falar da Revolução Francesa, da Grécia ou da Era Vargas.
— Sempre me senti muito bem se estivesse em um lugar com uma galera que estivesse rindo, feliz, pelas coisas que eu estivesse falando, fosse uma piada ou algo que eu tivesse inventado. E esse meu lado foi sempre em paralelo com a minha vida, tanto que as pessoas sempre se perguntavam: "Será que o Marcito tá falando sério?" — explica.
Essas histórias engraçadas criadas por Marcito durante as aulas rendiam comentários de seus colegas, alunos e chefes, incentivando o professor a investir em criar um show de stand-up comedy. Apesar do receio de ser obrigado a ser engraçado, já que em uma apresentação de comédia as pessoas já vão com grande expectativa de rir, ao contrário do que ocorre em uma sala de aula, em 2018, depois de uma tentativa fracassada de ser "sério" por alguns meses, decidiu apostar na comédia.
— Eu pensei: "Quer saber, eu tenho um monte de coisa na minha cabeça, textos, ideias, aulas, minha vida na periferia, vou fazer um stand-up" — conta, pontuando que a sua primeira apresentação amadora foi num bar na Cidade Baixa, que contou, majoritariamente, com amigos e alunos.
Logo depois, empolgado com os risos que arrancou da plateia, começou a entrar em contato com o pessoal que faz comédia e "foi para as cabeças". No final de 2018, já estava dando os seus primeiros passos na área e, em apenas dois meses, atropelou a etapa inicial da trajetória dos comediantes, que é o open mic, ou seja, um breve show de abertura para outros humoristas.
— Isso aconteceu porque o público que ia no stand-up gostava tanto de mim que, muitas vezes, dizia que tinha preferido o meu show de abertura do que do cara, que era uma atração nacional — relembra, ressaltando que, no começo de 2019, já estava ganhando para se apresentar, dividindo a sua vida profissional entre dar aulas e contar causos.
Naquele mesmo ano, após a sugestão de um amigo, o comediante começou a gravar vídeos para as redes sociais sobre como era o dia a dia na periferia "nas antigas". E, com isso, viralizou pela internet. Logo, conseguiu uma agência para dar ainda mais projeção a sua carreira. Porém, com a pandemia, os shows foram cancelados e estão retornando somente agora, quase dois anos depois.
Com essa retomada, o humorista tem a ambição, a qual ele chama de sua "bandeira", de elevar o mercado gaúcho da comédia. Consciente de que o polo do humor é a região sudeste do país, Marcito pretende ajudar o Rio Grande do Sul a ter uma "cena forte e soberana" para que os profissionais da área possam viver dignamente no Estado.
— Quer ir para São Paulo, para o Rio de Janeiro, para a Bahia? Vai, vai fazer show em tudo que é lugar. Mas se tu não quiser, quiser ficar aqui, que tu tenha a dignidade de conseguir fazer uma grana, sustentar os teus filhos e viver aqui — destaca.
"Tu acha que eu não te dole?"
Segundo o comediante gaúcho, que recentemente deixou o Sarandi para ir para Viamão — que, em suas palavras, também é vila, pois dá para saber pelo semblante dos cachorros na rua —, as suas histórias sobre periferia conseguem chegar ao grande público com efetividade por inserir em seus textos temas universais, como a vida nas décadas passadas, que acabam gerando identificação ou reconhecimento. E, claro, entra junto a distorção cômica, a surpresa, que leva ao riso até aqueles que nunca pisaram na vila.
— E além de tudo isso, tem o fato de que quem me olha na cara, sabe que eu sou um maloqueiro vileiro, né? — brinca Marcito, que teve, entre as suas inspirações, o também gaúcho Rafinha Bastos.
E dessa vivência na periferia, surgiram os bordões que fazem sucesso junto ao público do humorista. "Tu acha que eu não te dole?" — que, inclusive, virou o nome do seu primeiro show — e "respeita a vila" são frases ditas com frequência nas apresentações e nos vídeos do comediante. E, mesmo sem intenção, acabaram "pegando", sendo repetidas pelos seus fãs.
— O humor que eu faço, inclusive, é em defesa dessa ideia de respeitar a vila, de identificação, carinhoso, não para depreciar. Não sou um cara que faz um estereótipo, um clichê do pobre da vila para fazer os outros rirem disso. É um humor no qual eu me coloco nele, não estou falando de um lugar mais alto para debochar de outras pessoas — reflete.
Com gosto pela escrita e seu talento cada vez mais validado, Marcito também passou, além de seus próprios shows, a roteirizar piadas e causos para outros comediantes apresentarem, como Cris Pereira, em A Praça é Nossa, e Rodrigo Marques, integrante de A Culpa é do Cabral. Com esse fluxo intenso de trabalho, a comédia tomou conta e, hoje, o humorista quase não entra mais em sala de aula. Leciona, agora, em apenas um cursinho. Apesar de gostar de ser professor, sua paixão, de fato, é fazer as pessoas rirem.
— Quando eu tô no palco, é o prazer da minha vida — explica.