Sem poder ir a shows, o público está experimentando novos modos de consumir música. Tentando se posicionar neste novo momento, artistas e outros agitadores culturais, por sua vez, testam formas de usar o financiamento coletivo, ferramenta que já havia se consolidado no mercado, mas que tem se revelado mais criativa e flexível com a pandemia.
Um dos principais divulgadores do blues no Rio Grande do Sul, Luciano Leães acaba de lançar a campanha Vida de Pianista na plataforma Catarse. Trata-se de uma ação de financiamento permanente, em que os apoiadores contribuem mensalmente em troca de materiais exclusivos, a exemplo de projetos que já são bastante difundidos no Exterior, como o norte-americano Patreon.
O financiamento continuado é uma alternativa que tem se ampliado no Brasil, mas Leães mesclou características de um crowdfunding pontual, com hora para acabar. Há um objetivo a cumprir: o lançamento de seu próximo disco, previsto para maio de 2021.
– Com a pandemia, os músicos ficaram sem a principal fonte de renda, que são os shows. Não foi diferente comigo. Comecei a buscar alternativas e lembrei dos meus ídolos, que estão em iniciativas como o Patreon. Juntei isso com o desejo que já tinha de realizar um crowdfunding para meu novo disco – conta Leães.
Os apoiadores participam de reuniões para sugerir os rumos do álbum e têm poder de voto na escolha do repertório. Também recebem vídeos e áudios com atualizações do trabalho no estúdio e podcasts com seleções musicais comentadas e entrevistas.
– Depois que o disco sair, a ideia é que a campanha continue para o próximo, e assim por diante – planeja Leães.
Apesar de não estar em uma campanha permanente, o projeto 100 Grandes Álbuns do Rock Gaúcho trabalha com uma ideia de prazo bastante distinta da maior parte dos financiamentos coletivos. Enquanto a maioria dos projetos conta com cerca de 45 dias de prazo, a iniciativa foi lançada há uma semana e deve ficar no ar até julho de 2021. A meta é lançar um livro em formato grande e luxuoso, ao estilo coffee table book, com os discos que fizeram a história do rock no Estado.
O projeto tem à frente o jornalista Cristiano Bastos e o designer Rafael Cony.
– Um dos grandes diferenciais do crowdfunding é a possibilidade do financiador exercer o importante papel de um mecenas que ajuda a gestar importantes projetos culturais, os quais, principalmente em tempos de crise, como agora, não poderiam ser realizados – avalia Bastos.
Um grupo criado no Facebook voltado para a publicação também engaja o público, que recebe informações exclusivas da pesquisa. Os leitores também poderão votar para eleger um disco entre os seus prediletos. O álbum eleito ganhará o selo indicativo Escolha do Público.
– O termo rock que intitula o livro serve, sobretudo, para identificar um gênero de música muito associado à juventude gaúcha. Mas isso não significa que é só rock que o livro vai abarcar – explica Bastos.
Praticidade
Há também os artistas que prescindem de plataformas especiais para realizar seus financiamentos coletivos. É o caso do violonista Rodrigo Nassif, que planeja lançar até outubro o próximo disco de seu trio, complementado por Leandro Schirmer (bateria e teclados) e Samuel Basso (baixo).
O grupo vinha com uma movimentada agenda de shows, depois de circular pelos Estados Unidos e diferentes cidades do Brasil. Com a pandemia, muitos concertos foram cancelados e Nassif resolveu se dedicar a um novo disco por meio do financiamento coletivo.
O músico chegou a cadastrar uma campanha em um site voltado para crowdfundings, mas muitos fãs tinham dificuldade ou resistência para realizar o cadastro antes de pagar. A solução encontrada foi simples: escreveu uma mensagem com um resumo do projeto, valores sugeridos para doação e conta bancária, e a tem repassado para seus contatos nas redes sociais, acompanhada de um vídeo explicativo.
– É através dessa mensagem que o disco vem saindo do chão. Se a pessoa responde que não curte fazer cadastro, já digo na hora que não precisa. Se mora fora do Brasil, fiz um PayPal. Facilito tudo o que for possível. E está dando certo. Já paguei o estúdio e quase todos os músicos convidados – comemora Nassif.