Há onze anos, Renato Borghetti tem concretizado o que considera seu projeto de vida. Trata-se da Fábrica de Gaiteiros, iniciativa que produz e ensina gaita-ponto para mais de 500 alunos de 13 unidades espalhadas por Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Atualmente, a fabricação dos instrumentos segue em ritmo normal, em acordo com protocolos de segurança sanitária. As aulas também não estão paradas, com ensino a distância.
E as iniciativas para motivar os estudantes não param por aí. A Fábrica acaba de abrir inscrições para o I Festival Virtual de Gaita-Ponto, voltado a jovens entre sete e 15 anos de idade de todo o país – o prêmio máximo é uma gaita produzida na Barra do Ribeiro, cidade que sedia o projeto.
Nesta entrevista, Renato conta como a Fábrica, iniciativa sem fins lucrativos, tornou-se um foco de atenção tão importante quanto os palcos.
A Fábrica de Gaiteiros acaba de lançar o I Festival Virtual de Gaita-Ponto. No que consiste a iniciativa?
A raiz da Fábrica de Gaiteiros foi a carência de gaitas no mercado para quem queria se iniciar no instrumento. Não havia fábrica. Os instrumentos importados eram caros. Os antigos, reformados, também. Então a ideia sempre foi de fabricar o instrumento pra as crianças terem acesso. Nossa filosofia é de fabricar mas não vender. As crianças podem levar para casa para estudar, mas precisam devolver. A ideia do festival é de uma competição aberta para jovens de dentro e de fora da Fábrica, e que o vencedor ganhe uma gaita.
A Fábrica de Gaiteiros parece ter se tornado um projeto central na sua vida. Está conseguindo conciliar com sua carreiro nos palcos?
O Marcão (Marcos Borghetti, irmão e produtor de Renato) é quem fica bravo comigo (risos). Mas tudo isso é reflexo do meu gosto pela gaita. É um projeto que toma tempo, se quiser acompanhar os processos, para não delegar tudo. Eu não me importo. Se tiver um probleminha na unidade em Lagoa Vermelha, por exemplo, eu gosto de pegar o carro e ir lá ver. Já aproveito e dou uma passadinha em Lages. Vou solito. Faço isso com o maior prazer. Mas, ao mesmo tempo, tem o trabalho musical, que quem cuida é o Marcão. Por enquanto, mantenho as duas agendas. Dá para conciliar bem.
Quais serão os próximos passos da Fábrica?
A gente faz só gaita-ponto. Mas o acordeom apianado é outro exemplo de gaita a que precisamos dar atenção. Quando a criança quer aprender a tocar o acordeom, só tem aqueles gaitões grandes. Além de serem caros, são muito pesados. Uma criança pequena não consegue nem puxar o fole. Se procurar um bom instrumento pequeno, não vai encontrar. Por isso, estamos desenvolvendo um acordeom apianado pequeno. Já temos todas as matrizes prontas. Criamos tudo do zero. As teclas são desenvolvidas com casca de arroz, uma tecnologia desenvolvida por um amigo da Barra.
Com a energia criativa voltada para a Fábrica, tem sobrado tempo para compor?
Sempre me considerei mais um instrumentista que um compositor. Mas é claro que também componho. Desde o meu primeiro disco, todos têm composições minhas. Nessa quarentena, tenho me dedicado muito a essa manutenção da prática, não deixar os dedos parados.
Você tem se dividido entre a Capital e Barra do Ribeiro?
Com a pandemia, tenho ficado mais por Porto Alegre. Para minha atividade musical, preciso estar aqui, e essa está precisando de mais jogo de cintura. O circuito de shows não está acontecendo, então temos que encontrar outras soluções, porque minha profissão é músico. Essa solução passa mais por Porto Alegre do que pela Barra. Lá na Barra, acabo me dispersando, porque fico envolvido nos projetos da Fábrica.
O que tem feito para levar adiante a carreira musical na pandemia?
Um coisa que eu não estou fazendo é a tal da live. No início, essas lives não tinham uma produção tão caprichada. Além disso, era uma coisa para não ficar parado, para não perder o contato com o público. Mas tem outro lado em que precisamos pensar. Esse é o nosso trabalho. A gente vive disso, paga nossas conta com ele. Acho injusto essa coisa da live gratuita e não gosto dessa produção malfeita, de ligar a câmera de um telefone e sair tocando. Mas tenho feito muitas lives para conversar, para bater papo, trocar ideia. Isso faço direto. Acho muito legal. Mas lives com shows não tenho feito. Posso fazer, mas tem que ser encarada como show, passar pelo Marcão.