– Eles são muitos alegres e falantes. Mas têm pressa em aprender o português. Só assim conseguem um emprego.
A fala é da professora Thaís Ney, graduanda de Letras, que dá aulas para um grupo de 42 haitianos em Porto Alegre. O curso gratuito, com três encontros semanais, foi criado há dois meses graças a uma parceria entre CIEE, a Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social (FGTAS), o Centro Humanístico Vida e o Clube de Mães Jardim da Colina. A aula de ontem foi na Feira do Livro. Na turma que reúne imigrantes de 25 a 45 anos, há profissionais graduados: enfermeiros, técnicos em informática, professores, jornalistas, entre outros.
Além de curtir as bancas, eles participaram de uma contação de história no Memorial do Rio Grande do Sul (MARGS), realizada pela Câmara do Livro. Na fila da frente, um quarteto prestava muita atenção. Eram o mestre de obra Robenson Louis Jeiune, 35 anos, a esposa, a doméstica Madialie, e as filhas Bensnaylie, nove anos, e Leyda, três. Ele é um dos que melhor fala o português _ saiu do Haiti rumo ao Brasil em 2014. Em Porto Alegre, trabalhou como camareiro e na limpeza de dois hospitais. Há quatro meses, conseguiu buscar a família. Mas perdeu o emprego.
– Faço as aulas porque preciso falar cada vez melhor e voltar a trabalhar. Preciso sustentar minhas meninas – conta Robenson, que mora no bairro Rubem Berta e paga R$ 600 de aluguel.
Em casa, ele conta que o português já é mais falado do que o francês, língua oficial do Haiti. Sua filha maior, matriculada em uma escola regular, é a mais empolgada diante das bancas. Pega um livro bem colorido e chama por Madialie, misturando as línguas.
– Olha, olha, maman (mãe, em francês).
Robenson diz que saiu de seu país diante da miséria e da falta de perspectivas para as filhas. Quer reescrever sua história no Brasil, buscar um final feliz. Tanto é que, conseguindo um emprego para ele e a mulher, juntando um dinheiro, sonha em trazer mais familiares:
– Somos em oito irmãos, mais minha mãe. Adoro Porto Alegre, fui bem recebido. Minha família ia gostar muito daqui.
A filha ficou com a tia
De toda a turma, talvez a quem mais tem pressa de aprender o português e se estabilizar em Porto Alegre é Maudelie Commandant Pierre-Saint, 37 anos. No Haiti, ela era professora de ensino fundamental. Com a ajuda da profe Thaís, ela diz que adora as aulas, e que não vê a hora de poder trabalhar. Objetivo igual ao do marido. Apesar das dificuldades, ela sorri entre uma tradução e outra. Mas o rosto troca de feição quando perguntada sobre quem deixou no Haiti:
– Minha filha de quatro anos. Ficou com minha irmã. Sinto muita falta dela, muita saudade.
Normalmente, quem se aventura sem a criança é por temer as condições da viagem, cheias de complicações nas fronteiras para imigrantes. Maudelie conta que conversa com a filha por telefone. E fica sem resposta ao ouvir a menina perguntar sobre o reencontro:
– Não tenho ideia de quando será.
E a turma foi crescendo
As aulas gratuitas para os haitianos ocorrem no Centro Vida, na Zona Norte da Capital. São duas profes ao mesmo tempo: Jarina Menezes, além da Thaís. Supervisora de programais sociais do Ciee, Melânia Lisiak conta que a turma começou com 20 e foi crescendo. Inclusive com crianças pequenas que não conseguiram vaga em creches ainda:
– Eles se conversam e a sala encheu. São pessoas muito simpáticas, alegre e que precisam de apoio.
A intenção é que o curso gratuito dure oito meses. Durante as aulas (duas horas e meia cada), os temas são variados, com dicas para ajudá-los na rotina diária, como ir ao supermercado ou pegar ônibus. Mas uma lição é campeã de audiência:
– Dedicamos um bom tempo para instruir como fazer um currículo.
Como participar
Você é haitiano e ficou interessado nas aulas?
/// Telefone para o Ciee, no 3284-7099 ou vá até a sede do Centro (Avenida Borges de Medeiros, 328, oitavo andar, sala 84)
/// Atendimento presencial é das 9h às 12h e das 14h às 18h.