Adolescente viciado em sexo, guitarrista insano e elétrico, frontman sexy e provocante, bardo folk obcecado por Bob Dylan, guru hindu com pegada George Harrison, compositor de épicos psicodélicos, maior representante do rock gaúcho: descreva como quiser, mas poucas vezes a música gaúcha viu um artista tão multifacetado quanto Flávio Basso (1968-2015). Do início, em bandas seminais para a Porto Alegre dos anos 1980, como TNT e Os Cascavelletes, ao histórico A Sétima Efervescência, já sob o nome artístico Júpiter Maçã, Basso sempre esteve na linha de frente da música feita no Rio Grande do Sul.
Todas essas facetas estão retratadas nas 420 páginas de Júpiter Maçã: A Efervescente Vida & Obra, biografia escrita pelos jornalistas Cristiano Bastos e Pedro Brandt. Em 27 capítulos – que vão desde a infância no bairro Bom Fim, ao lado do futuro colega de banda Charles Master, até o último show, em 2015 (descrito em detalhes por quem assistiu in loco) – a obra debruça-se sobre reportagens, vídeos, arquivos, textos e em cerca de cem entrevistas, feitas no Rio Grande do Sul e em São Paulo, para tentar explicar o que se passava na mente prolífica e agitada de Basso.
– Parte desse caráter multifacetado do Flávio era planejado, parte se dá de forma ocasional, até acidentada, por conta do alcoolismo. Ele tinha uma empolgação por compor, e há vários relatos de que ele se enchia facilmente das músicas e queria fazer coisas novas – conta Cristiano Bastos, jornalista que também é um dos autores de Gauleses Irredutíveis: Causos e Atitudes do Rock Gaúcho, livro de onde são tirados os depoimentos de Júpiter usados na biografia, já que o músico morreu pouco antes do início da pesquisa para o livro, que durou mais de dois anos.
Para celebrar o lançamento de A Efervescente Vida & Obra, dois eventos serão realizados nesta semana na Capital. Na quarta, um show da Império da Lã, acompanhada de ex-parceiros do músico, no Ocidente (Av. Osvaldo Aranha, 960), a partir das 22h, marca o lançamento oficial do livro. No domingo, às 18h30min, uma sessão gratuita na Cinemateca Capitólio (Rua Demétrio Ribeiro, 1.085) vai exibir registros raros das diversas fases da carreira de Júpiter.
Os dois eventos, que terão o livro à venda e sessão de autógrafos, devem servir como complemento – musical e visual – ao que Bastos e Brandt apresentam na biografia, em meio a histórias inéditas e curiosas: o início no TNT, banda que abandonou às vésperas de uma oportunidade de contrato; as ideias por trás da criação dos Cascavelletes, e os bastidores de momentos como a performance de Eu Quis Comer Você em um programa infantil; as brigas (constantes em sua carreira) com colegas de banda, seja por ciúme ou perfeccionismo; e os detalhes da produção de A Sétima Efervescência.
É claro que são esmiuçados também os problemas de Basso com as drogas, a dificuldade em lidar com a morte do filho de 11 anos, as relações amorosas (por vezes turbulentas, por vezes maternais) e a decadência no fim da vida – para esta faceta, de dramas pessoais, Bastos usa uma frase do livro:
– Há um depoimento do (baterista Alexandre) Barea em que ele diz que o Flávio queria apenas ser um músico 24 horas por dia.