Com grande esforço, às vezes cabeceando de sono, às vezes controlando um aborrecimento crescente, cheguei à página 30 de Busca Minha Face, de John Updike. A última frase lida foi: "Com o protesto vinha um contentamento, a alegria de pequenas e provocadoras vitórias contra o tempo, criando coisas para guardar". Parece bom, não é? Mas minha paciência tinha acabado. Fechei o livro e não vou mais abrir, pelo menos por enquanto. Updike é meu ídolo, é autor da fantástica série Coelho, mas esse romance sobre uma pintora que fala sobre seu marido também pintor (personagem inspirado em Jackson Pollock) para uma jornalista chata estava muito chato.
Segui os sábios conselhos de três escritores a quem também admiro. Jorge Luis Borges: "Se um livro os aborrece, larguem-no; não o leiam porque é famoso, não leiam um livro porque é moderno, não leiam um livro porque é antigo. Se um livro for maçante para vocês, larguem-no". Philip Roth, através de seu alter ego Nathan Zuckerman, que por sua vez citava Kafka: "Penso que devemos ler apenas os livros que nos mordem e aferroam. Se o livro que estamos lendo não nos desperta com uma pancada na cabeça, por que nos dedicar a sua leitura?". Nick Hornby: "Se você estiver lendo um livro simplesmente sacal, coloque-o de lado e vá ler outra coisa, da mesma forma com que pegaria o controle remoto caso não estivesse gostando de um programa de TV".
É simples assim. Existem milhares de livros para serem lidos com prazer, e a vida é curta demais para gastá-la com livros que não nos conquistam até a página 30. Busca Minha Face foi para a estante, onde ficará ao lado de seus maravilhosos irmãos Coelho Corre e Cidadezinhas. Não significa que é um mau romance. Significa apenas que para mim, neste momento, sua leitura tornou-se uma obrigação, em vez de um prazer. Quem sabe daqui a um tempo, alguns meses, talvez alguns anos, eu tenha me transformado e possa voltar à página 30, encontrando ali uma emoção perdida.
Além disso, pensar assim cria uma boa resposta para minhas filhas quando elas entram no meu quarto, veem as estantes cada vez mais abarrotadas de livros e perguntam:
- Pai, tu já leu isso tudo?
- Li uma parte. O resto tá esperando uma segunda chance.