A história do prisioneiro 2.460, encarcerado por 19 anos por ter roubado um pão, comove o público desde que foi publicada em 1862 pelo escritor francês Victor Hugo. Mais de 150 anos depois, o encanto permanece: a adaptação para o cinema do musical Os Miseráveis faz jus à grandiosidade do melodrama épico vivido pelo herói Jean Valjean.
O filme que estreia nesta sexta levou os Globos de Ouro de melhor comédia ou musical, ator (Hugh Jackman) e atriz coadjuvante (Anne Hathaway), além de concorrer ao Oscar em oito categorias.
Desde que debutou em Paris, em 1980, o musical Les Misérables já foi visto por cerca de 60 milhões de pessoas, encenado em 42 países e em 21 línguas. Coube ao cineasta inglês Tom Hooper - vencedor do Oscar por O Discurso do Rei (2010) - levar para as telas a versão em inglês da peça original de Claude-Michel Schönberg, Alain Boublil e Jean-Marc Natel. A transposição para o cinema desse musical de sucesso colhe agora os frutos do desafio: Os Miseráveis (2012) está na disputa de oito estatuetas do Oscar - incluindo melhor filme, ator, atriz coadjuvante e canção original.
A sequência de abertura já revela a escala operística ambicionada pela produção: em meio a um grupo de presos que puxam um navio em um estaleiro sob a chuva, surge a figura de Jean Valjean (Hugh Jackman, quase irreconhecível devido à barba e à magreza), fazendo coro aos companheiros na canção Work Song - sob o olhar duro do inspetor Javert (Russell Crowe). A cena impressionante, passada em 1815, é um prólogo do que se desenrola nos 152 minutos de filme: mesmo depois de cumprir pena por ter roubado um pedaço de pão para alimentar a família da irmã, Valjean jamais vai livrar-se da perseguição do obstinado Javert - que empreende uma caçada implacável ao ex-condenado, cujo ato final tem por pano de fundo as barricadas dos protestos populares de 1832 em Paris.
Cantado do começo ao fim, Os Miseráveis acrescenta ao libreto teatral uma série de qualidades cinematográficas: cenários e figurinos requintados e realísticos, fotografia sofisticada mas não artificiosa, montagem ágil, enquadramentos primorosos - especialmente nos primeiros planos que destacam os solistas cantando. Mas a força do filme está mesmo no carisma do elenco e na beleza da partitura composta por Schönberg, com letras adaptadas para o inglês por Herbert Kretzmer. Jackman está excelente na pele do protagonista, emocionando tanto por sua atuação quanto pela interpretação de temas como What Have I Done? e Who Am I?. Anne Hathaway também brilha no papel da pobre Fantine - obrigada a se prostituir para sustentar a filha Cosette, posteriormente adotada por Valjean -, em especial quando canta a conhecida I Dreamed a Dream.
Merecem destaque ainda os momentos cômicos com o casal de escroques Thénardier (Sacha Baron Cohen e Helena Bonham Carter, esbanjando ironia e cinismo no número Master of the House) e os virtuosísticos solos de Éponine (Samantha Banks, que encarnou o mesmo personagem na montagem inglesa do musical, arrebata em On My Own) e Marius (Eddie Redmayne, bravo em Empty Chairs at Empty Tables). No cinema, Les Mis adquire uma potência dramática capaz de convencer até aqueles que torcem o nariz para os musicais.
Os Miseráveis (Les Misérables)
De Tom Hooper. Com Hugh Jackman, Anne Hathaway, Russell Crowe, Amanda Seyfried, Sacha Baron Cohen e Helena Bonham Carter.
Musical, Grã-Bretanha, 2012. Duração: 157 minutos. Classificação: 10 anos.
Estreia nesta sexta no circuito.
Cotação: 4/5