Nicole Laporte
Em 1999, Michael Paolini, um inventor da IBM em Austin, Texas, almoçava num Ruby Tuesday's com colegas engenheiros quando o grupo decidiu que os hambúrgueres e fritas vinham aumentando demais a medida de suas cinturas. Estava na hora de perder peso.
Sendo engenheiros, porém, eles não iriam simplesmente subir na esteira. E decidiram criar um programa de computador para tornar a perda de peso tão divertida quanto jogar Xbox, mas com um incentivo adicional: a oportunidade de ganhar dinheiro.
A ideia do programa, cuja patente foi aprovada recentemente, era simples: os participantes poderiam ser recompensados por comer bem e desestimulados a comer mal. Assim, uma salada no almoço podia render 50 centavos. Torta de chocolate? Esqueça.
A invenção é um exemplo de como a "gameficação" - a aplicação das técnicas e psicologia dos games para influenciar comportamentos no mundo real - está afetando o campo da saúde. Futuramente, a IBM espera licenciar o sistema para empresas ou seguradoras que desejem aprimorar o bem-estar de seus funcionários.
Atualmente, uma infinidade de aplicativos móveis no mercado - como Lose It e Weight Watchers Mobile - tentam inserir um pouco de diversão no árduo processo de perder peso. O aplicativo dos Weight Watchers (Vigilantes do Peso) oferece um número específico de pontos diários para que a pessoa possa permanecer dentro de um limite calórico, e permite visualizar quantos pontos seriam acrescidos ao usar um molho de queijo no lugar do vinagre balsâmico.
O programa da IBM - que, como esses aplicativos, precisa que os usuários relatem seu consumo fielmente - é um modelo mais personalizável. Ele pode ser usado por qualquer um, de vegetarianos a mães tentando fazer os filhos comerem ervilhas.
A natureza das recompensas também é flexível. Paolini apontou que "todos entendem o dinheiro", e é por isso que a versão inicial emprega esse método, mas que os usuários também poderiam ganhar ingressos para o cinema ou até mesmo animais do FarmVille para usar no game online.
Paolini e seus colegas se inspiraram no Honda Insight, carro híbrido que oferece aos motoristas um feedback imediato sobre como sua maneira de dirigir afeta o consumo de combustível. Ver essa informação imediatamente, argumentam eles, motiva as pessoas a alterar seu estilo de direção.
O painel "exibe o consumo em letras enormes", explicou Paolini. "Ele mostra a média atual e a média geral. Todos podem visualizar esses dados. Assim, se você entra no carro e ele mostra 15 quilômetros por litro, você dirige num trânsito anda e para e acaba com 7 quilômetros por litro, o que isso diz sobre seu estilo de direção?"
"É esse mecanismo que possibilita ao motorista fazer escolhas. Ele ainda pode pisar fundo no acelerador, mas pode também alterar sua técnica", digamos, pisando mais levemente nos freios e desacelerando quando vê um carro. "Isso é o mesmo tipo de coisa que estamos fazendo aqui."
É possível imaginar companhias de seguro apoiando o programa da IBM como uma forma de reduzir as contas médicas dos usuários - e, eventualmente, suas mensalidades. Mas isso pode levantar questões de privacidade do tipo que o Facebook vem enfrentando. Será que uma companhia de seguros ou empregador deveria ficar sabendo daquela barra de chocolate noturna?
"A patente estimula o bom comportamento mas, como qualquer coisa, traz a possibilidade de abusos", disse Paul Hebert, diretor da I2I, empresa de marketing que trabalha com programas corporativos de incentivo e recompensas. "Em teoria, as seguradoras poderiam começar a usar o programa como fator de negociação" com empresas clientes, explicou ele. "Em outras palavras: use o programa com seus funcionários ou pague uma taxa maior."
Segundo ele, em organizações há também um potencial problema de percepção. "Se metade dos meus funcionários escolhe participar e a outra metade fica de fora", questionou ele, as pessoas que preferiram não participar poderiam ser julgadas negativamente.
Respondendo à ideia de que o programa poderia ser usado de forma a manipular o comportamento dos usuários, Paolini afirmou que a quantidade de informação coletada - e como esses dados serão usados - depende daqueles que aplicarão o programa.
Ele acrescentou que o uso de ferramentas de mídias sociais na perda de peso vem se tornando cada vez mais popular.
"As pessoas postam seu peso diário ou hábitos de consumo em grupos online", explicou ele. "Com isso, elas podem receber incentivos, sugestões e, algumas vezes, um pontapé no traseiro para colocá-las de volta no caminho certo."
Paolini concorda que não há garantia de que as pessoas serão honestas sobre o que comem ao usar o programa da IBM.
"Poderíamos prender uma tornozeleira de monitoramento nos usuários, mas não acho que as pessoas fariam isso voluntariamente", brincou ele.
Fundamentalmente, ele reconhece, o programa é baseado na confiança - de que o "supervisor" não está explorando os dados, e de que os participantes não estão trapaceando, por exemplo, ao deixar de registrar aquela barra de chocolate.
Discussões éticas à parte, o programa funciona? Paolini diz que sim. Após usá-lo, ele conseguiu perder oito quilos.