Uma das maiores entidades do rock gaúcho, Frank Jorge agora habla: desde o ano passado, tem aflorado um lado porteño. Vivendo entre Buenos Aires, onde fixou residência, e Porto Alegre, o músico apresenta essa faceta hermana em um disco cantado inteiramente em espanhol.
Intitulado Un Tipo Muy Raro, o álbum chegou às plataformas digitais em 8 de março. Uma versão em português do trabalho deve ser lançada nos próximos meses.
Hoje com 57 anos, Frank conta que seu interesse pela música em espanhol vem desde a infância, quando ouvia tangos e boleros por meio de sua mãe, Marlene. Ele admite que cresceu mais voltado à música brasileira e ao pop anglo-saxão, sem se aprofundar no rock feito na América Latina. "Só passava de raspão", como define.
Gradativamente, após ter iniciado sua relação com a professora e escritora Dani Espíndola — que é filha de equatoriano — nos anos 1990, o interesse pela língua foi aumentando. Começou a comprar discos de artistas uruguaios e argentinos sempre que visitava Rivera — cita nomes como Andrés Calamaro, Alfredo Zitarrosa, El Cuarteto de Nos, entre outros. Até que, entre 2012 e 2013, Frank gravou sua primeira música em espanhol, Nuestros Gritos. Porém, o resultado não o agradou, especialmente sua pronúncia — a música só foi divulgada em 2020.
Nos últimos anos, o músico divulgou alguns singles cantando no idioma, mas a ideia do álbum só foi se concretizar após a mudança para Buenos Aires, em 2023. Em janeiro, surgiu uma janela para Frank gravar, em Porto Alegre, com o produtor Thomas Dreher, por quem tem muita empatia e identificação.
— Pensei: "É agora, vou grudar o tal do disco em espanhol". Comecei a compor meio na marra (risos). Foi vindo ao natural — relata.
Apesar de Frank cantar em outra língua, Un Tipo Muy Raro ainda carrega aquele DNA que ele classifica como "robertiano" (referenciando Roberto Carlos). São oito faixas que, segundo o cantor, trazem influências de Los Auténticos Decadentes, Andrés Calamaro, Charly García, Fito Páez, Ramones, Tim Maia, Johnny Cash.
Para exemplificar, a animada Inseguridad traz clara inspiração em Los Auténticos Decadentes, que Frank diz admirar pelo lado festeiro e brincalhão. A balada Alguién para Amar tem uma pegada Tim Maia. A ramoneira Místicos Paraguas reflete sobre os períodos do autor em Porto Alegre, enquanto sua esposa e a filha, Glória, estão em Buenos Aires.
A chacarera La Falta, que conta com participação do violonista Hilton Vaccari, versa sobre a falta de energia que atingiu Porto Alegre em janeiro ("Sin luz y también sin água/ Solamente con la esperanza / Que todo vuelva a la normalidad"), além do descaso político ("Porque el alcalde no sabe de nada").
— Não tive tanto problema onde eu estava, mas via pessoas com oito ou 10 dias sem luz e sem água — explica Frank. — Foi muito impactante aquilo em Porto Alegre, a pessoa que tem um mercadinho no bairro ou que trabalha em casa, sem condições mínimas. Tentei não fazer uma crítica pontual, mas falar sobre algo que acontece de tempos em tempos.
Novos ares
Ativo na cena roqueira do Rio Grande do Sul desde os anos 1980, Frank participou de bandas como Os Cascavelletes, Cowboys Espirituais e Graforreia Xilarmônica. Além da carreira solo, ele segue se apresentando com a Tenente Cascavel.
Entre as próximas novidades relacionadas a Frank, está o relançamento em vinil de Coisa de Louco II, álbum da Graforreia Xilarmônica que saiu originalmente em 1995. A edição em LP sairá pela Monstro Discos no dia 19 de abril, mas já está na pré-venda. O músico acrescenta, ainda, que seu segundo álbum solo, Vida de Verdade (2004), deve ser relançado pelo selo Maleta Discos no final do semestre.
Enquanto isso, ele segue lá e cá. Pai de Rafael, 32; Érico, 24; e Glória, 19 — os dois mais novos do relacionamento com Dani —, Frank conta que a mudança para Buenos Aires foi uma decisão tomada em família.
— Houve um encanto com a cidade, com o povo, com a gastronomia. Culturalmente, é um lugar sedutor — destaca.
Porém, desde outubro, Frank acompanha a luta da filha contra um câncer do tipo Linfoma de Hodgkin, diagnosticado naquele mês. No momento, ela faz tratamento com quimioterapia. Ele assegura que Glória tem "tocado o barco com muita fé na ciência e na recuperação".
Por enquanto, em Buenos Aires, Frank realizou apresentações esporádicas de violão e voz, em locais que define como "underground do underground".
— Não estou tão apressado e ansioso para sair tocando. Vou pisando aos poucos no terreno — pontua.