— Um dos motivos para o nome da banda ser Os Replicantes é porque os replicantes, os personagens do filme Blade Runner (1982), viviam só quatro anos. Achávamos que o grupo ia durar muito menos do que quatro anos. No final, acabou sendo muito mais — recorda Carlos Gerbase, baterista da primeira formação da banda gaúcha.
Na verdade, foi 10 vezes mais. O grupo punk está completando, em 2024, nada menos que 40 anos de história, sem nunca ter parado — apesar de ter mudado a sua formação algumas vezes. E, para celebrar, será aberta nesta quarta-feira (27), às 19h, a exposição Os Replicantes 1984/2024 no Museu do Trabalho (Rua dos Andradas, 230), em Porto Alegre. A entrada é gratuita.
Com curadoria da produtora da banda, Paola Oliveira, a mostra ocupa duas salas no espaço cultural, transformando o local em um templo de contemplação à lendária banda punk gaúcha. Pelas paredes, estão itens que ajudam a contar a história d'Os Replicantes, indo desde os álbuns que inspiraram o grupo e fotografias, passando por matérias de jornal, até os documentos de um episódio de censura.
Mais do que isso, estão presentes no Museu do Trabalho, é claro, os resultados do trabalho da banda. Ao encontrar peças que são verdadeiros tesouros, com décadas de existência, muito bem conservadas, desde fitas originais de quatro décadas atrás, passando por flyers, pôsteres e roupas, percebe-se que o grupo é muito bem-organizado e preserva a sua própria história — e também do rock como um todo.
— Está todo mundo envolvido na exposição, assim como no show de 40 anos — conta Paola. — É uma banda que amadurece e ninguém nunca ficou de mal um com o outro. O Wander (Wildner) saiu porque foi fazer carreira solo. O Gerbase tinha a PUCRS, cheio de coisas, os filmes. Não tinha mais tempo. Mas a gente sempre comemorou essas datas. Os 30 anos foram com todos juntos. Agora, os 40 anos também. É importante estarmos juntos.
A questão de estarem juntos é, realmente, perseguida pelos membros. Estarão todos reunidos na inauguração da mostra, nesta quarta, para receber o público em clima de comemoração e iniciar esta grande festa punk que culminará no show de reencontro dos 40 anos. A apresentação será no dia 16 de maio, no Opinião, exatamente quatro décadas após o debute da banda, em 1984, no Bar Ocidente — inclusive, está presente na mostra um recorte original de Zero Hora anunciando esta estreia.
Liberdade
Uma das inspirações dos Replicantes é a banda estadunidense Dead Kennedys, liderada, em seus primeiros anos, por Jello Biafra — inclusive, na parte das referências dos gaúchos no museu, está o presente o álbum Fresh Fruit for Rotting Vegetables (1980), da coleção de Gerbase. O mais interessante é entender, na mostra, uma certa proximidade entre os dois grupos, que chegaram a tocar juntos em mais de uma ocasião.
Mas o primeiro contato entre os dois universos se deu por um caso de repressão. Em 1987, a música Adúltera, do álbum Histórias de Sexo e Violência, teve seus versos censurados pela ditadura militar, o que desencadeou uma revolta por parte dos membros da banda, que enviou a história para Biafra. O artista californiano respondeu em uma carta que está exposta na mostra, contando um episódio semelhante que viveu, e confirmando que tinha ouvido o disco O Futuro É Vortex (1986), dos gaúchos.
Esta e outras histórias estão presentes no Museu do Trabalho, que ficará com a exposição montada até 19 de maio, três dias após o show dos 40 anos — na data da apresentação, para abraçar os fãs que viajarão para Porto Alegre, a mostra poderá ser visitada até as 21h. Quem for até o local fará uma viagem no tempo, recordando todas as formações clássicas do grupo, mas também relembrando locais que não existem mais e que fizeram parte da história do rock — aliás, estão muito bem documentadas na exposição as três turnês europeias feitas pelos gaúchos.
— A gente não tem patrocínio nenhum. O Hugo (Gusmão, coordenador do Museu do Trabalho) disse: "Vamos fazer do jeito que dá". Aí todo mundo se envolveu. Virou um coletivo, com todos ajudando um pouquinho. Depois de 40 anos, a banda continua sendo "faça você mesmo" — aponta Paola.
A formação atual dos Replicantes tem quase 17 anos e conta com Julia Barth, Cleber Andrade, Heron Heinz e Claudio Heinz — estes dois últimos presentes desde a primeira formação. Além dos já citados Gerbase e Wildner, Luciana Tomasi também foi uma das integrantes do conjunto punk. Nestas quatro décadas de estrada, a banda produziu 13 álbuns, mais de cem canções autorais e dezenas de videoclipes, como os clássicos Nicotina e Surfista Calhorda.
— Tu não podes falar em grande qualidade técnica ou musical, mas Os Replicantes foi uma banda muito relevante, no sentido de que ela tinha uma postura política clara. Também trouxe um tipo de sonoridade que, no Brasil, só se fazia em São Paulo, que tinha uma cena punk bem legal, mas distante de nós. Então, quando veio o nosso som, foi algo diferente. As pessoas se surpreenderam, e algumas até se assustaram (risos) — recorda Gerbase.
Exposição "Os Replicantes 1984/2024"
- Abertura nesta quarta-feira (27), às 19h, no Museu do Trabalho (Rua dos Andradas, 230), em Porto Alegre.
- Visitação a partir desta quinta (28), de terça-feira a sábado, das 13h30min às 17h30min, e domingos e feriados, das 15h às 18h. Temporada até 19 de maio.
- Entrada gratuita.