Para o terror dos doutores, passados mais de 20 anos desde a separação, em 2001, o Planet Hemp está de volta na praça — como eles cantam no hit Ex-quadrilha da Fumaça. O retorno da banda carioca se deu em 2022, com o lançamento do álbum de inéditas Jardineiros. Aclamado, o disco venceu duas categorias do Grammy Latino 2023, provando que o grupo "continua queimando tudo até a última ponta" (para citar outro clássico deles).
Mas apesar da lista grande de sucessos que sobreviveram ao tempo, será ancorados nas novas canções que Marcelo D2, BNegão, Formigão, Pedro Garcia e Nobru, a formação atual do Planet Hemp, subirão ao palco do Auditório Araújo Vianna na noite desta quinta-feira (18), a partir das 21h (informações sobre ingressos ao final do texto). O show fará alusão ao repertório de Jardineiros e de sua versão estendida, Jardineiros - A Colheita, que no ano passado trouxe sete novas faixas para o universo do disco.
Ao melhor estilo Planet Hemp, as canções colocam o dedo na ferida dos problemas sociais e políticos enfrentados pelo Brasil nos últimos anos. A defesa da legalização da maconha, pauta antiga do Planet Hemp, também segue presente nas letras. Mas os saudosistas podem ficar tranquilos: o show, apesar de focar o repertório atual, não deixará de fora os clássicos.
Quem garante é ninguém menos que Marcelo D2. Em entrevista a GZH, o músico reflete sobre passado, presente e futuro do Planet Hemp, opina sobre o cenário atual do país e revela as altas expectativas pelo reencontro da banda com o público gaúcho. Confira.
Por quê o Planet Hemp voltou?
Cada um da banda teve a sua motivação, mas acho que, em um contexto geral, todos nós precisávamos do Planet Hemp. Sempre foi uma válvula de escape para a gente botar para fora as coisas. A banda tem uma energia muito única, então, falar dos assuntos que a gente fala, no Planet Hemp, é diferente. O Bernardo (BNegão) sempre comenta que o público pedia muito um disco do Planet Hemp, mas, cara, eu acredito que quem mais precisava do disco era a gente mesmo.
Mesmo sem lançar novos trabalhos, a banda seguia muito aclamada. Lançar um disco novo, sair dessa zona de conforto, poderia ser um risco, não?
Cara, a gente podia ficar assim para o resto da vida, estava muito confortável. Mas tem uma inquietude artística em todos nós que foi muito decisiva. A gente quis fazer esse disco um pouco pela vontade de nos testar de novo, tá ligado? Essa formação nunca tinha gravado disco junto. O Nobru é guitarrista do Planet há 10 anos, mas nunca tinha gravado um disco, entende? E, sei lá, o momento político do Brasil pedia muito também. Aquele final de 2022, com eleições, com tudo o que passamos... A gente queria muito falar sobre isso.
Agora, mais velho, mais experiente, quando olha para a trajetória do Planet Hemp, acha que foi correto que a banda se separasse naquele momento? Tem algum arrependimento?
Muito boa essa pergunta, porque vejo que hoje, com a idade, faria diferente várias coisas, mas o mais importante é que tenho muito orgulho de fazer parte dessa banda e dividir essa história com caras que são muito fod*. Eu não me arrependo de terminar a banda, acho que isso foi um grande acerto. Se não tivesse terminado naquela época, ia virar um caos e acabar acontecendo uma merda maior, então foi melhor ter parado.
O que, então, faria diferente?
Principalmente a parte de relação pessoal. Quando a gente é moleque, leva tudo aos extremos, né? Há 20 anos atrás, eu tinha umas certezas absolutas que, hoje em dia, não levaria em conta. Talvez o meu maior arrependimento seja por ter ficado sem falar com o Bernardo (BNegão). Isso é uma coisa que me dói até hoje. Como é que fiquei sem falar com o cara que era o meu melhor amigo, sabe? Graças a Deus a gente está junto, felizão, amarradão, recuperamos a confiança um no outro, mas isso deixou uma mágoa em mim, porque deveria ter tratado melhor essa situação.
As experiências que vocês tiveram fora da banda fazem diferença no trabalho que vocês entregam hoje? O que mudou, por exemplo, na hora de entrar no estúdio?
Somos músicos muito mais experientes hoje em dia, tá ligado? Todo mundo trouxe uma bagagem maior para dentro do estúdio. Não só para dentro do estúdio, mas para o palco também. Os shows têm sido diferentes porque temos mais cancha de palco mesmo. A gente conseguiu fazer um disco totalmente novo do Planet Hemp, mas que ainda é Planet Hemp. Tinha uma responsabilidade com a nossa história, tá ligado? A gente não podia cagar a porr* toda, então, nos preocupamos muito. A nossa sonoridade é única, somos muita coisa, e acho que conseguimos explorar bem isso.
O que não muda é o caráter político da banda. Como você analisa as lutas de ontem e as lutas de hoje?
Eu fico muito triste de estar lutando contra fascismo em 2024, tá ligado? É muito louco. É muito louco ver o fascismo dos anos 1920 e 1930 reacender em um país como o Brasil cem anos depois. É muito louco ver que as pessoas não têm noção de história. Confesso que, quando o disco do Planet saiu, não fiquei feliz, fiquei triste por causa do momento, sabe? Eu me sinto muito honrado por poder fazer um disco nesse momento, por estar contribuindo com a sociedade, com arte, mas é um pouco triste.
A legalização da maconha sempre foi uma pauta para o Planet Hemp. Falar de legalização, hoje, tem algo de diferente?
Acho que, hoje em dia, a questão não é mais "se" vai legalizar, mas "quando" vai legalizar. Grandes cidades do mundo todo já estão legalizadas, tá ligado? A gente tem dados, tem estudos, a discussão já está em outro patamar. Espero que o Brasil não repita erros do passado, não seja "o último" mais uma vez.
O Planet Hemp tem músicas que enaltecem o uso recreativo da maconha, mas nunca falou sobre isso de forma leviana. Vocês sempre alertaram, por exemplo, sobre as consequências que a chamada "guerra às drogas" poderia trazer.
Porque o contexto é muito difícil, saca? Eu gostaria de olhar para a questão e ver ali só um entretenimento, mas na porr* de uma cidade como o Rio de Janeiro, não tem como. Você vê o quanto que as pessoas se aproveitam disso. Porr*, a milícia tomou o país de assalto, tá ligado? Meu Deus, isso isso não é brincadeira, é sério para um caralh*. A gente caiu na mão da milícia, por resultado de algo sobre o que o Planet Hemp já falava lá atrás. Essa dita guerra às drogas é uma falácia, ela não é tratada com honestidade. Isso é só para controlar território, só para manipular, tá ligado?
Como é perceber que o Planet Hemp, de fato, fez a cabeça de muita gente? Pois a banda moldou o pensamento de uma galera daquela geração.
A gente nunca pensou muito nisso, mas encontro as pessoas na rua e realmente escuto: "Porr*, caralh*, tu fez a minha cabeça". E isso não só politicamente, mas musicalmente também, tá ligado? A galera fala que o Planet Hemp fez parte da sua formação musical, muito por conta dessa nossa mistura. Bom, estaria mentindo se falasse que não gosto de ouvir isso (risos). É uma parada muito interessante. Quando a gente ganhou esses dois grammys, fiquei muito honrado. Faz parte de um rolê de pensar que eu não vim à toa nessa terra.
Nesse cenário tão positivo, imagino que os shows estejam uma loucura. Dá para perceber alguma uma renovação de público também?
Cara, a gente nunca teve um show do Planet Hemp tão fod*. Isso do público tem sido incrível, porque achei que iria só a galera mais velha, mas tem muita gente nova mesmo. Sei lá, o show do Planet Hemp é um show muito único. Você não tem hoje em dia uma banda de rock que nem o Plantet Hemp por aí, com essa energia toda, sabe? Não tem uma banda porrada, que faz um show desse, com toda a história do Planet Hemp. Acho que a galera curte isso. E a gente está curtindo demais também. Tá sinistro.
A banda tem uma relação muito próxima com Porto Alegre. Rola uma expectativa diferente pelo show aqui?
Porto Alegre é a nossa casa, tá ligado? O Pedrinho, nosso baterista, é filho do Bebeco dos Garotos da Rua. E nós temos uma influência direta, muito grande, do DeFalla. Eu mesmo fui muito influenciado pelo rock gaúcho dos anos 1980. Então, nossa relação com Porto Alegre é muito forte. Tenho certeza de que vai ser "o show". Estive aí recentemente com o Iboru, meu solo, e foi um dos melhores shows que tive na turnê, foi incrível. Esse lugar, o Araújo Vianna, é muito fod*. Uma galera ficou perguntando: "Pô, como é que a gente vai pogar?". A gente vai dar um jeito, meu irmão. Vamos fazer uma roda punk, vamos de um lado para o outro, não sei, mas esse lugar é muito especial. Eu não levava fé até ver de perto. Então, vai ser um show em um lugar muito especial, em uma cidade muito especial e em um momento muito especial do Planet Hemp. Tenho certeza de que será uma parada histórica. Eu convoco toda a malandragem de Porto Alegre para comparecer.
Planet Hemp em Porto Alegre
- Quinta-feira (18), às 21h, no Auditório Araújo Vianna (Av. Osvaldo Aranha, 685)
- Ingressos inteiros a partir de R$ 150, disponíveis na plataforma Sympla
- Sócios do Clube do Assinante RBS têm 50% de desconto sobre o valor do ingresso inteiro