Há hits que tomam conta das paradas de rádio ou streaming, ficam na boca do povo, se tornam trilhas de vídeos nas redes sociais, mas ligeiramente se esvaem. Dificilmente alguém lembra depois de um mês. É como se a música tivesse prazo de validade. Só resta ser recordada nostalgicamente em uma festa ou em uma conversa cansada.
Mas há músicas que permanecem. Atravessam séculos. Que o diga o compositor veneziano Antonio Lucio Vivaldi, que viveu entre 1678 e 1741. Ele deixou um legado de cerca de 770 obras, o que inclui 477 concertos e 46 óperas. Foi o autor da célebre As Quatro Estações — série de quatro concertos para violino e orquestra, dividida entre Primavera, Verão, Outono e Inverno.
Neste fim de semana, o espetáculo Vivaldi Elétrico será realizado no Theatro São Pedro, em Porto Alegre, propondo-se a dar uma nova vida à obra do compositor barroco. Uma roupagem mais rock, com bateria e guitarra. Com concertos no sábado (13), às 20h, e domingo (14), às 17h, o evento reunirá a Orquestra de Câmara da Ulbra com o guitarrista Frank Solari e o baterista Kiko Freitas, além da participação de Eduardo Knob no cravo.
Com regência de Tiago Flores, o programa de Vivaldi Elétrico abrangerá o Concerto Grosso em Ré Menor, op 3 , nº 11; o Concerto Grosso em Ré Maior, RV 121 e o ciclo completo de As Quatro Estações. A orquestra começa, inicialmente, sozinha; Kiko entra na segunda peça, já trazendo uma pegada mais roqueira. Por fim, Solari entra em As Quatro Estações.
Flores conta que a ideia para o concerto surgiu a partir do espetáculo Clássicos do Rock, realizado pela Orquestra de Câmara da Ulbra com participações de roqueiros do Estado. No projeto, o rock ganhava contornos de música clássica. Então, o maestro pensou em fazer o movimento contrário: trazer o repertório barroco para o pop.
Em um espetáculo, a orquestra já havia executado o terceiro movimento do Verão com a participação de Frank Solari. A partir daí, ficou uma semente: o maestro ambicionou fazer a peça inteira explorando a sonoridade elétrica. O guitarrista foi convidado no ano passado, e logo Kiko entrou no projeto.
— Frank é um cara muito preciso e super virtuoso. Ele já tocou muitas vezes conosco, e para tocar com orquestra é preciso ter uma precisão rítmica tremenda — destaca Flores. — E com o Kiko é a mesma coisa, ele é reconhecido no Brasil inteiro. São dois virtuoses em seus instrumentos que vieram somar com a gente.
Para o baterista, aliás, a experiência tem sido desafiadora. A obra de Vivaldi não prevê bateria ou percussão.
— É como descer a serra com uma Scania sem freio, sem deixar a carga cair — brinca. — Tive que criar mais ou menos um desenho de bateria que se encaixasse a partir da partitura do violino solo. É muito empírico.
A experiência também tem sido incitante para Solari. Embora possa atuar em diferentes estilos, ele é um guitarrista com maior afinidade com o rock. O instrumentista atesta que seu timbre é com distorção.
— Fazer a parte do violino numa peça dessa importância é um desafio forte, talvez uma das peças mais difíceis de toda a minha vida — afirma Solari.
Fazendo renascer Vivaldi
Com uma obra extensa e revolucionária, Vivaldi é descrito por Flores como um compositor que foi muito além em seu tempo, tendo uma pegada muito forte e elétrica. Por isso, ele trouxe essa eletricidade para o nome do espetáculo. Segundo o maestro, não é difícil acrescentar uma guitarra ou bateria por essas características de Vivaldi.
Para quem possa pensar que a proposição do espetáculo possa deturpar a música do compositor, Flores justifica que a partitura de Vivaldi é respeitada, sem mudar uma nota. O maestro ressalta que o concerto, na verdade, tem a intenção de apresentar o compositor de uma maneira diferente.
— Do jeito que o Vivaldi era, tenho certeza que se ele tivesse uma guitarra disponível, aproveitaria na música. Colocaria bateria e o que mais tivesse ao dispor — cogita Flores.
Solari acrescenta que definições não devem guiar a experiência musical:
— Quando a gente tem um Vivaldi sendo interpretado com bateria e guitarra distorcida, pensamos em rock ou heavy metal, mas tanto faz o rótulo. O arranjo e a ideia do compositor estão ali, vivos.
Kiko corrobora:
— É a prova de que a música é imortal. Pode ser revisitada em outras linguagens e movimentos, ganhando vida nova. Ela renasce.
Vivaldi Elétrico
- Neste sábado (13), às 20h, e domingo (14) às 17h, no Theatro São Pedro (Praça Mal. Deodoro, s/nº), em Porto Alegre.
- Ingressos a partir de R$ 40 pelo site do teatro e na bilheteria do local.
- Duração: cerca de 1h30min.