O ex-astro do R&B R. Kelly foi condenado nesta quarta-feira (29) a 30 anos de prisão pela Justiça americana por chefiar durante décadas uma rede de exploração sexual de mulheres e adolescentes.
Nove meses depois de ter sido declarado culpado das seis acusações que pesavam sobre ele, o autor de I Believe I Can Fly ouviu a sentença de cabeça baixa, a mesma atitude que manteve praticamente ao longo das quatro horas de audiência.
— Estou agradecida que Robert Sylvester Kelly (nome de batismo do cantor) esteja longe e ficará longe e não poderá ferir mais ninguém — disse Lizzette Martínez, uma das vítimas do condenado de 55 anos, à imprensa que aguardava do lado de fora da Corte federal no Brooklyn.
A sentença é superior à pena de 25 anos de prisão pedidos pela promotoria, que alegava que o ganhador de três prêmios Grammy, com mais de 75 milhões de discos vendidos, ainda "representa um sério perigo público".
— A população deve ser protegida de comportamentos como este — disse a juíza Ann Donnelly.
A advogada do artista, Jennifer Bonjean, argumentou à juíza que seu cliente era "produto de uma infância caótica", vítima de abusos sexuais, com problemas de aprendizagem e assédio.
— O senhor Kelly nega ser o monstro — disse Bonjean, ao pedir uma pena mais branda tendo este contexto em mente.
Além da prisão, o cantor será submetido a um tratamento para distúrbios sexuais e psicológicos. Outra audiência, em 28 de setembro, deverá definir ainda uma multa que ele terá de pagar às vítimas.
Após anos de rumores de abusos sexuais contra mulheres e menores, em 27 de setembro passado, um júri de Nova York o declarou culpado de 11 acusações, entre elas a de crime organizado.
"Predador sexual"
De acordo com a tese da acusação, Kelly "era um predador sexual". Segundo a promotora Elisabeth Geddes, ele criou um círculo próximo "que fez as vítimas acreditarem que eram sua propriedade" e controlava todos os seus movimentos, inclusive com quem tinham de falar. Ele as obrigava a fazer sexo com outras mulheres e outros homens e, se tentassem abandoná-lo, adotava represálias ou as assediava nas redes sociais.
Vestindo roupa de presidiário e acompanhado de duas advogadas, o condenado teve de escutar mais uma vez as experiências de várias vítimas, algumas aos prantos e com a voz embargada, que o descreveram como um "manipulador", "controlador" e "abusador", que destruiu suas vidas.
As histórias das vítimas demonstraram um padrão de conduta: muitas disseram ter conhecido o cantor em shows ou apresentações em centros comerciais e que a equipe do artista entregou a elas papéis com o contato de Kelly. Em troca, recebiam a promessa de que ele as ajudaria em sua carreira musical.
A prova principal da acusação é o relacionamento que Kelly manteve com a cantora Aaliyah — que morreu em 2001, em um acidente aéreo. O cantor compôs e produziu seu primeiro álbum, Age Ain't Nothin' But A Number, antes de se casar ilegalmente com a artista quando ela tinha apenas 15 anos, temendo tê-la engravidado. Na época, ele tinha 27 anos.
Um ex-representante admitiu em juízo que subornou um funcionário para obter documentos falsos que permitissem a Aaliyah se casar. Posteriormente, o casamento foi anulado.
O marco do #MeToo
O caso é considerado um marco para o movimento #MeToo por ser o primeiro julgamento importante por abuso sexual no qual a maioria das acusadoras são mulheres negras.
Ainda está previsto, para 15 de agosto, o início de outro julgamento em um tribunal de Chicago, onde Kelly e dois colaboradores são acusados de manipular um julgamento de 2008 por pornografia e ocultar anos de abusos de menores. O cantor também tem contas pendentes com a Justiça em outros dois Estados americanos.