Quando a organização do Grammy divulgou a lista de indicados à premiação de 2021, o que chamou atenção não foram os selecionados, mas sim uma ausência. Com 31 anos completados em fevereiro, o canadense de família etíope Abel Makkonen Tesfaye vive seu apogeu desde seu quarto disco de estúdio, After Hours, lançado em março de 2020. O cantor é mais conhecido pelo seu nome artístico, The Weeknd, que só tem crescido de tamanho. A 63ª edição do Grammy, prevista para ser realizada na noite de domingo (14), já é assombrada pelo fantasma de Abel antes mesmo de começar.
Combinando elementos de R&B, hip hop, indie rock e da música eletrônica em sua sonoridade, The Weeknd acumula sucessos nos últimos anos, e não são poucos: I Feel It Coming, Can't Feel My Face, The Hills, Starboy, Blinding Lights, entre outros exemplos. Às vezes, o ouvinte pode não reconhecer a música por nome, mas há a possibilidade de ter escutado alguma dessas faixas por aí: rádio, playlist de bar ou loja de roupa, festas, TV etc.
O cantor serve desde um pop dançante a faixas românticas, encontrando espaço também para aquelas canções mais introspectivas, às vezes para um clima mais íntimo, ou também para os momentos de fossa. Circula desde os consumidores mais alternativos ao público geral. O comunicador Rafinha Menegazzo, programador musical da Rádio Atlântida e da 103.3, destaca que The Weeknd é um artista diferenciado:
— Consegue circular com algo muito moderno e também viajar um pouquinho naquela sonoridade antiga, com aquela influência de Michael Jackson e Prince. Mesmo assim, o som dele é sempre muito atual. É um artista dessa nova geração que circula muito bem no meio de todo mundo. É um cara que vai estar sempre nas paradas.
Para o produtor musical Charles Di Pinto, diretor da Sigmund Records e docente do curso de Produção Fonográfica da Unisinos, Abel oferece uma nova e valiosa perspectiva para a indústria musical.
— O artista é muito valioso pela qualidade como curador de estilos atuais e passados, desde o pop eletrônico dos anos 1990 até o trap de Atlanta. Seu R&B é pop pela forma de misturar esses elementos, objetivamente voltado para o mainstream. Isso tem muito valor e mostra uma compreensão admirável das qualidades presentes na música fonográfica de diferentes períodos históricos — explica o produtor.
Além da música, The Weeknd também entrega conceito. Com After Hours, Abel trabalhou com uma estética de filmes como Cassino (1995), Medo e Delírio (1998) e Coringa (2019) em seu material de divulgação e clipes. Em apresentações e eventos, o cantor sempre aparecia com curativos, bandagens e machucados — o que já se via na capa do disco, em que aparece bem vestido com nariz sangrando. Conforme explicou em entrevista à Variety, trata-se de uma crítica social às crescentes cirurgias estéticas das celebridades e às "pessoas que se manipulam por motivos superficiais para agradar e serem validadas".
Trazendo singles como Save Your Tears e In Your Eyes, The Weeknd explora no álbum um personagem perdido e autodestrutivo. Embora o disco seja denso e melancólico, o cantor trabalha também com o pop dançante oitentista, recheado de sintetizadores, que pode ser encontrado em seu maior hit: Blinding Lights. Com After Hours, Abel entrou em outro patamar.
Recordes e recordes
Na última segunda-feira (8), a música Blinding Lights completou um ano no Top 10 da Billboard Hot 100. É um feito que nunca havia acontecido desde o surgimento dessa parada musical, que lista as músicas mais tocadas nos Estados Unidos. Em fevereiro, a canção foi apontada como maior hit deste século, de acordo com o Chart Data, que compila dados das paradas mundiais. Em setembro de 2020, a faixa conquistou a 28ª semana consecutiva no top 5 e com isso se tornou a música que mais ficou neste patamar em toda a história.
De acordo com a Associação Americana da Indústria de Gravação, a RIAA, The Weeknd também aparece hoje na lista dos 10 artistas com os singles mais ouvidos de todos os tempos. Ele também é o artista mais ouvido do mundo no Spotify, com mais de 75 milhões de ouvintes mensais na plataforma.
Em fevereiro, ele se apresentou no intervalo do Super Bowl, o evento mais assistido do ano nos Estados Unidos, que também é transmitido mundialmente. Com um show cinematográfico e bastante elogiado nas redes sociais, Abel obteve outro boom: só nos Estados Unidos, as vendas de suas músicas subiram 385% nos dois dias seguintes à apresentação, de acordo com a MRC Data.
Vale frisar que 2020 foi um ano paralisado pela pandemia, com a indústria musical puxando o freio de mão e sem a possibilidade de turnês. É fácil imaginar que Blinding Lights seria aquela música para ser tocada repetidamente em festas.
Esnobado
Apesar de todo o sucesso de After Hours, The Weeknd surpreendentemente não foi selecionado para a principal premiação da indústria fonográfica americana, que será realizada neste domingo (14). Após a divulgação da lista, o cantor escreveu nas redes sociais: "O Grammy continua corrupto. Vocês devem transparência a mim, aos meus fãs e à indústria".
O presidente interino da Academia de Gravação, Harvey Mason Jr., justificou a ausência à Variety alegando que a indicação "depende do corpo de votação que decide". Segundo o TMZ, fontes próximas do cantor afirmam que a exclusão poderia ter a ver com sua apresentação no Super Bowl. A ideia era que ele se apresentasse nos dois eventos, mas as negociações foram complicadas. Mason negou a história.
De qualquer maneira, The Weeknd atingiu um patamar estrondoso na história da música pop, independente das premiações. O tipo de artista cuja ausência pode ser ensurdecedora.